Folha de S. Paulo


Análise

Estratégia de Trump diz algumas verdades e inspira desconfiança

A primeira Estratégia de Segurança Nacional sob Donald Trump marca uma ruptura com o estilo "paz e amor" adotado por seu antecessor, Barack Obama, no documento anterior, de 2015.

Se fala algumas verdades inconvenientes, inspira desconfiança em seus rivais.

Joshua Roberts/Reuters
Trump aplaude após discursar sobre a nova estratégia de segurança nacional dos EUA
Trump aplaude após discursar sobre a nova estratégia de segurança nacional dos EUA

Um exemplo claro é o tratamento dispensado à China. Em 2015, Obama dizia que os EUA consideravam "bem-vinda a ascensão de uma China estável e próspera", fazendo juras de cooperação.

Diz Trump sobre o "regime autoritário" de Xi Jinping: "A política americana era baseada na crença de que apoiar a ascensão da China iria liberalizá-la. Ao contrário de nossas esperanças, a China expandiu seu poder às custas da soberania alheia".

A abordagem franca tem suas desvantagens. O tom assertivo que Xi assumiu neste ano, proclamando uma nova projeção de poderio chinês, foi em parte uma reação às ameaças de guerra comercial do Trump candidato –no poder, ele foi mais manso.

É um jeito de lidar com a coisa e, em alguns casos, pode até funcionar para ajudar a resolver impasses.

O mesmo vale para a Rússia, país que Trump diz ser "o maior risco existencial para os EUA", dado seu poderio nuclear. Moscou é, como Pequim, "rival" de americanos.

Em 2015, à luz da então recente reabsorção da Crimeia por Vladimir Putin, Obama gastou tinta para acusar a "agressão russa" na Europa.

Mas não chamava o país de rival, até porque isso é música para a orquestra de Vladimir Putin tocar para a plateia.

Trump também deixa claro estar aberto para cooperação com os rivais, e no discurso desta segunda (18) foi além e usou a colaboração anunciada pelo Kremlin com a CIA para evitar um atentado como exemplo de diálogo.

Mas o tom sombrio do documento não soaria fora do tempo na década de 1980.

As diferenças entre Trump e Obama refletem ainda o fato de que eles representam visões díspares de mundo, baseadas muito em ideologia.

Por isso, o democrata dava prioridade a temas inexistentes para Trump como ameaça à segurança, como a Aids na África, enquanto o republicano toca sua fanfarra dos "EUA em primeiro lugar" e ignora a ciência ao lidar com a questão do aquecimento global. Nenhuma novidade.

Contra Obama há a apreciação de que, salvo uma ou outra iniciativa, sua política externa foi frouxa e criou problemas novos como piorar a situação na Síria e na Líbia.

Já contra Trump, ainda que ele tenha menos de um ano na cadeira, há a incoerência.

A Otan (aliança militar ocidental), que ele chamou de obsoleta no começo do ano, passa a ser fundamental.

E sua política de incendiar a disputa com a Coreia do Norte, que louvou no discurso, até aqui só trouxe maior risco de um erro acabar em guerra —nuclear, talvez.


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