Folha de S. Paulo


Região carvoeira reavivada por Trump promete reeleger presidente

No dia seguinte à eleição de Donald Trump, em 8 de novembro de 2016, Aimee Stutzman, 60, fez uma grande festa na loja onde vende "artigos de feitiçaria" —pedras, velas e incensos— em Somerset, Pensilvânia.

"Tinha bolo, as pessoas entravam para celebrar. Acho que, em toda a cidade, eu só vi cartazes da Hillary em frente a duas casas. Estávamos em festa", lembra Stutzman.

Hoje, passado quase um ano, a euforia continua na cidade que dá nome ao condado com 76 mil habitantes, onde o republicano venceu com 76,5% dos votos e onde foi aberta, em junho, a primeira mina de carvão da era Trump.

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Em todo o país, o presidente mantém um índice de 78% de aprovação entre os republicanos e de 82% entre os republicanos que se declaram conservadores, segundo aferição do instituto Gallup.

Entre a população adulta do país como um todo, sua popularidade é de 35% —baixa para o padrão americano— e a desaprovação vai a 60%.

Os eleitores de Trump em Somerset, onde 96% são brancos e as pessoas acima de 65 anos são mais numerosas do que as que têm entre 18 e 34 anos, parecem se encaixar em um grupo ainda mais fiel. A grande maioria dos consultados pela reportagem afirmou que ajudaria a eleger Trump novamente.

Aprovação de Trump nos EUA - Segundo o Gallup, em %

Segundo levantamento do site FiveThirtyEight com o SurveyMonkey, entre os eleitores que dizem ter votado empolgados em Trump, sua aprovação ainda era de 95% em agosto. Entre os que dizem ter votado menos convictos, o apoio era de 63%.

"Estou satisfeita com o que Trump tem feito, ele não vai ser sempre politicamente correto, mas é realista em relação ao que as pessoas querem ouvir", disse Stutzman. "Ele fala a nossa língua, não fica no blablablá político."

O marido da comerciante trabalhava na mina e, em 2016, passou um mês em casa porque a mineradora estava quebrando com as restrições ao carvão impostas no governo de Barack Obama.

NA PENSILVÂNIA - Votos em 2016

NO CONDADO DE SOMERSET - Resultados das eleições

Na mina de Acosta, inaugurada há quatro meses pela Corsa Coal com um discurso gravado por Trump, a satisfação com a política energética do presidente, que resgatou o combustível fóssil apesar do alto índice de poluição, se explica em números: até o fim do ano, a expectativa é dobrar os mineiros trabalhando de 44 para até 90.

A empresa também se prepara para retomar as atividades em outra mina, que havia sido fechada há dois anos.

"Estamos em constante processo de contratação", diz Sean Petree, 43, o superintendente. Segundo ele, a maioria dos empregados estava desocupada com o fechamento de outras minas locais. "A retomada da mineração está tendo impacto positivo no comércio local e nos fornecedores, criando empregos", afirma.

Dados oficiais comprovam uma queda maior no desemprego no condado em comparação com o país: de 7,8% em janeiro para 5,8% em setembro, contra uma redução de 4,8% para 4,2% nos EUA.

Stutzman diz que o movimento em setembro em sua loja foi o melhor desde 2014. Seu vizinho, Dave Sherman, 63, dono de uma sapataria, também festeja a alta de 30% nas vendas. "Antes de o Obama tomar posse, eu ia contratar um funcionário. Depois, não apenas não consegui como tive uma queda de 80% no negócio", conta. Na rua da sapataria ainda há muitas lojas fechadas. "Vai melhorar, mas não da noite para o dia."

SISTEMA

Os dois comerciantes dizem acreditar nas boas intenções do presidente e culpam o sistema político e o Congresso por todos os problemas de Trump, como não ter conseguido fazer avançar seu plano para substituir o Obamacare, a reforma no sistema de saúde implementada pelo antecessor democrata.

RENDA PER CAPITA/ANO - (2015, em US$)

POPULAÇÃO - 76,6 mil (2015)

"Se ele diz às pessoas que ele vai fazer, é porque ele quer fazer", afirma Sherman, para quem o Congresso "cheira mal". "Se a Câmara e o Senado não começarem a trabalhar, nada vai acontecer."

O mineiro Matt Owens, 43, da Acosta, se diz otimista com Trump, embora admita ter votado nele apenas para frear Hillary Clinton, a oponente democrata. "Ele está tentando, e está limpando o pântano [de Washington]", diz, repetindo uma frase de campanha do republicano. "Mas às vezes ele fala demais."

Para Stutzman, o país não entende o apoio a Trump em regiões pobres como a Appalachia, a vasta cadeia montanhosa onde Somerset fica, porque não está interessado em debater "o que importa".

"Um turista perguntou se eu achava OK Trump dizer 'xoxota'. Sério? Eu também falo 'xoxota'", ri ela. "As pessoas só querem discutir isso, e não falar da economia."

DESEMPREGO (%) -

FAIXA ETÁRIA -

CRÍTICAS PRECIPITADAS

Jeff Smith, 48, bartender em um restaurante de Somerset, não se enquadra no perfil do eleitor típico de Trump. Com a TV sintonizada na rede CNN —algo incomum na região—, ele diz que votou no republicano, mas que não sabe se faria isso de novo se a eleição fosse hoje. "Ainda é muito cedo para dizer", diz, desconfiado.

Smith afirma ter optado por Trump por ver no empresário alguém que poderia "mudar as coisas" em Washington. O mesmo sentimento tinha feito com que ele votasse em Obama em 2008.

Eleitores como ele têm cada vez menos expressado seu apoio a Trump, segundo levantamento feito pelo site FiveThirtyEight com o SurveyMonkey, empresa de sondagens on-line.

ELEITORES RELUTANTES - Aprovação de Trump cai entre os que dizem ter votado nele com menos convicção

Segundo a pesquisa com 3.227 pessoas, dos eleitores que afirmam ter votado em Trump "sem empolgação" —15% do total de eleitores seus entrevistados— sua aprovação caiu de 77% em abril para 63% em agosto, data da pesquisa mais recente. Entre os 85% que votaram convictos, o percentual caiu de 99% para 95%.

"Não é de se esperar que pessoas que votaram em Trump como último recurso estivessem especialmente felizes com o estado do país", disse o estatístico Nate Silver, do FiveThirtyEight.

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Na Pensilvânia, Trump foi o primeiro republicano a conquistar maioria desde George Bush pai, em 1988.

Segundo Leon Moyer, 60, dono de uma gráfica em Ruffs Dale, a 60 km de Somerset, as eleições de 2016 foram bem diferentes: apesar de o condado de Westmoreland ser um pouco mais democrata nas urnas que o vizinho, ele não recebeu nenhuma encomenda para imprimir cartazes de apoio a Hillary Clinton.

Já pró-Trump, ele calcula ter vendido mais de 500.

"Parte da população já estava cansada de ser deixada para trás. Então o que houve é que essa região da Pensilvânia se levantou e foi votar", disse Moyer.

Hoje imprime cartazes com frases como "blue lives matter" ("vidas de policiais importam", resposta ao movimento negro Black Lives Matter) e críticas à CNN. Para ele, críticas a Trump são precipitadas. "As pessoas querem que ele faça tudo de uma hora para outra, mas isso é impossível."


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