Folha de S. Paulo


Catalunha tem greve e protestos em resposta à violência policial de Madri

Barcelona, capital turística da Espanha, foi tomada por uma greve parcial nesta terça-feira (3) em protesto à violência policial do fim de semana, quando catalães votaram em seu plebiscito separatista.

Os embates com as forças de segurança no domingo deixaram quase 900 feridos e alimentaram a indignação.

Apenas 25% do transporte público funcionava nos horários de pico, mas a infraestrutura nacional -linhas de trem e os aeroportos- operava quase em normalidade. Servidores públicos da prefeitura não foram trabalhar e 75% dos trabalhadores da saúde tampouco. O porto de Barcelona foi paralisado.

Atrações populares, como o recinto modernista de San Pau e La Pedrera, de Antoni Gaudí estão fechadas. Ao menos 47 estradas foram interditadas, algumas delas, caso de Tarragona, com pneus em chamas.

Na central Gran Vía de Barcelona, dezenas de milhares de manifestantes se envolviam em bandeiras catalãs —faixas vermelhas e amarelas— com gritos de "as ruas sempre serão nossas", que se tornaram uma espécie de hino deste movimento.

Um cartaz dizia que "eles não nos deixam dizer nem um 'piu'", em referência ao personagem infantil Piu-Piu, que se tornou símbolo da repressão policial, depois que agentes enviados por Madri foram alojados em um barco com ilustrações do pássaro.

A Catalunha é uma região espanhola já com alguma autonomia, contando com um Parlamento próprio e uma polícia a seu mando, os chamados Mossos. Mas uma série de vitórias eleitorais deu força para que partidos separatistas pedissem a independência completa.

O movimento tem crescido desde 2012, data de imensas manifestações populares, mas chegou a seu ápice no dia 1° com o plebiscito separatista. Mais de 90% votaram no "sim" —apesar de a consulta ter contado com apenas 2,2 milhões de eleitores, ou 42% do total.

O governo central em Madri não reconheceu o plebiscito e tampouco vai aceitar uma eventual, prevista para os próximos dias. Ainda não há uma data para que o Parlamento discuta o gesto.

O atrito entre os governos de Madri e de Barcelona, escalado nas últimos semanas, é um dos principais desafios da democracia espanhola desde sua transição em 1975, que encerrou uma ditadura de quase quatro décadas.

"Sempre acreditei que a independência catalã daria continuidade à nossa história", diz à Folha Ferrán Sabate, 64, na manifestação —falando alto para ser ouvido entre o tilintar das chaves balançadas no protesto.

"Fomos independentes por séculos, até sermos tomados por armas em 1714", afirma. Naquela data, o rei espanhol Felipe 5° tomou Barcelona e suspendeu a autonomia parcial da Catalunha.

Um dos argumentos dos separatistas é sua economia pujante, que corresponde a 20% do PIB espanhol, hoje estimado em US$ 1,2 trilhão.

"A Catalunha é um povo explorado, e ainda por cima nos odeiam", afirma Josep María Calbete, 82. "Uma Catalunha independente é viável, mas uma Espanha sem a Catalunha, não. Por isso não vão nos oferecer diálogo."

Além do governo espanhol e da polícia nacional, que esteve à frente dos embates de domingo, outro alvo dos protestos era a mídia espanhola, vista como demasiado parcial. Manifestantes cercavam repórteres de veículos de Madri gritando "imprensa espanhola manipuladora!".

"Os jornais nos chamaram de manifestantes no domingo, mas não era um protesto. Estávamos votando. Agora sim estamos protestando", diz Gemma Canarda, 45.


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