Folha de S. Paulo


Crise ameaça trabalho de jornalistas indígenas na Venezuela

Falta de energia e de conexão com a internet, ameaças de violência e dificuldade para conseguir patrocínio são rotina para repórter e veículos jornalísticos que cobrem o cotidiano do povo indígena da Venezuela.

A situação é comum especialmente no Estado de Delta Amacuro. Localizado no norte do país, próximo da fronteira com a Guiana, a região é uma das mais pobres da Venezuela e tem grande presença indígena.

De acordo com o CPJ (Comitê para a Proteção a Jornalistas), ONG com sede em Nova York, os repórteres enfrentam pressão de autoridades para não cobrirem casos de corrupção ou de crimes contra os indígenas.

Reprodução
Home do site jornalístico venezuelano Tane Tanae, especializado em questões indígenas
Home do site jornalístico venezuelano Tane Tanae, especializado em questões indígenas

Foi o que aconteceu com o site jornalístico Tane Tanae. A publicação foi criada há dois anos por membros da comunidade indígena warao, a maior da região —o próprio nome do site significa "assim aconteceu" na língua dos warao.

A cobertura do site é toda voltada para a vida dos índios e os problemas que eles enfrentam, incluindo denúncias de corrupção e violência e questões de saúde.

Os sete jornalistas que trabalham no veículo costumam encontrar uma série de dificuldades para realizarem as reportagens. Um dos problemas mais comuns é o corte de energia.

A jornalista Alba Perdomo, da ONG venezuelana Instituto Imprensa e Sociedade, disse ao CPJ que as quedas da energia muitas vezes ocorrem devido a precariedade da infraestrutura venezuelana, mas em outras os cortes são feitos por ordem de autoridades insatisfeitas com a cobertura.

Além disso, a Redação do site costuma receber uma série de ameaças.

Segundo Perdomo, em 2016 dois motoqueiros fizeram ameaças de morte contra um dos fundadores da publicação, Amador Medina, 27, após a publicação de uma reportagem que ligava uma autoridade local a uma construção em um terreno indígena.

O próprio Medina disse ao CPJ que em junho um jornalista do site, que não teve o nome revelado, recebeu uma ligação o instruindo a não escrever sobre os grupos criminosos que atuam na região.

"[Tane Tanae] é a única mídia crítica que restou", disse Perdomo ao CPJ. "Isso deixa algumas pessoas pouco confortáveis e causa problemas, especialmente quando tem a ver com corrupção."

Além do site, a rádio Fe y Alegría (ligada a Igreja Católica) também é alvo de crítica das autoridades.

O Tane Tanae foi criado por jornalistas warao que trabalhavam na Fe y Alegria e o escritório do site fica dentro do prédio da rádio, em Tucupita, capital de Delta Amacuro.

A governadora do Estado, a chavista Lizeta Hernández, já acusou os dois veículos de incitarem a violência na região.

A rádio chegou a ficar fora do ar em julho de 2016 após as acusações. Medina teme que o governo tome uma atitude parecida com o Tane Tanae, bloqueando o acesso ao site em algum momento.

No caso do site, a relação difícil com o governo diminui o número de propagandas oficiais, que é sua principal fonte de financiamento.

Apesar disso, a publicação atualmente tem propaganda tanto de Lizeta quando de sua rival na próxima eleição, a candidata opositora Larissa González.


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