Folha de S. Paulo


Turquia promete ajuda aos rohingyas, minoria islâmica que foge de Mianmar

Mohammad Ponir Hossain/Reuters
Mulher rohingya enxuga as lágrimas após conseguir cruzar a fronteira de Mianmar com Bangladesh
Mulher rohingya enxuga as lágrimas após conseguir cruzar a fronteira de Mianmar com Bangladesh

A Turquia anunciou nesta quarta (6) que a primeira-dama Emine Erdogan irá a Bangladesh para acompanhar a distribuição de ajuda humanitária à minoria étnica rohingya, que é muçulmana.

O comunicado do governo turco ocorreu um dia após um telefonema entre o presidente Recep Tayyip Erdogan e Aung San Suu Kyi, líder de fato de Mianmar e vencedora do prêmio Nobel da Paz.

A autorização à ajuda turca é uma exceção. Desde o início da escalada de violência, o acesso de grupos humanitários à região foi restringido pelo governo.

Emine Erdogan será acompanhada por seu filho, Bilal Erdogan, e pelo ministro de relações exteriores, Mevlut Cavusoglu. Na quarta (6), ele afirmou que a Turquia quer uma solução duradoura para a fuga dos rohingyas.

O presidente Recep Tayyip Erdogan, alvo de críticas da comunidade internacional desde que passou a concentrar poderes em resposta a uma tentativa de golpe em 2016, tem buscado ocupar uma posição de liderança na comunidade muçulmana.

Na última sexta (1º), ele afirmou a Turquia tinha a "responsabilidade moral" de se posicionar sobre os acontecimentos em Mianmar.

O atual episódio de violência começou no dia 25 de agosto, quando 150 rebeldes rohingyas atacaram 20 delegacias de polícia. O grupo rebelde Exército de Salvação Arakan Rohingya assumiu a autoria dos ataques.

Danish Siddiqui/Reuters
Rohingyas chegam a Bangladesh, que já recebeu 400 mil pessoas da minoria islâmica de Mianmar
Rohingyas chegam a Bangladesh, que já recebeu 400 mil pessoas da minoria islâmica de Mianmar

146 MIL

A crise é considerada a mais grave registrada até o momento. Segundo a ONU, mais de 146 mil pessoas já atravessaram a fronteira de Mianmar para Bangladesh desde o início dos ataques. A maioria é de mulheres e crianças rohingyas.

O fluxo de pessoas aumenta o temor de um desastre humanitário em Bangladesh, onde os acampamentos de refugiados já abrigavam cerca de 400 mil rohingyas.

"Não víamos nada nessa escala por aqui há muitos anos", disse Pavlo Kolovos, coordenador-geral da ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Bangladesh.

"Muitas pessoas que chegaram tinham necessidades médicas graves, como lesões causadas por violência, ferimentos infeccionados e complicações obstétricas avançadas. Sem ampliar o suporte humanitário, os potenciais riscos de saúde são extremamente preocupantes."

Em entrevistas realizadas em Bangladesh pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), rohingyas contaram que casas queimadas, estupros, torturas, assassinatos, detenções ilegais e desaparições forçadas são práticas recorrentes.

Na ligação de terça (5) com Erdogan, Suu Kyi reclamou que o primeiro-ministro Mehmet Simsek tinha sido uma vítima de notícias falsas ao postar fotos que mostravam rohingyas mortos. Ela afirmou que as vítimas não tinham relação com a crise.

Seu gabinete declarou que a desinformação ajudava a promover os interesses dos "terroristas", adotando o discurso da Junta Militar que governou o país por décadas.

OS MAIS PERSEGUIDOS

Os rohingyas são uma minoria de fé muçulmana que se concentra no Estado de Rakhine, no noroeste de Mianmar. Já foram considerados pela ONU como a "minoria mais perseguida do mundo".

De maioria budista, Mianmar é marcado pela influência de monges radicais que denunciam rohingyas como ameaça. Muitos birmaneses alegam que eles são uma etnia implantada durante a colonização britânica, que trouxe milhares de trabalhadores muçulmanos de Bangladesh.

Uma lei de 1982 retirou a cidadania do rohingyas.

Como apátridas, eles não têm acesso a serviços básicos, como educação e saúde, e são proibidos de votar. Em Rakhine, a lei os proíbe de ter mais que dois filhos e os obriga a fazer trabalhos forçados.

Desde o aumento da violência no Estado de Rakhine, em outubro de 2016, Aung San Suu Kyi tem sido criticada pela comunidade internacional por não denunciar a perseguição aos rohingya.

No ano passado, vários laureados com o Nobel —Malala Yousafzai, Desmond Tutu e 11 outros— assinaram carta aberta "alertando para um potencial genocídio".

Em entrevista à BBC em abril deste ano, Suu Kyi afirmou que o termo "limpeza étnica" era "muito forte" para descrever a situação. Em outras ocasiões, repetiu o argumento da junta de que os rohingya estariam vivendo ilegalmente em Mianmar.


Endereço da página:

Links no texto: