Folha de S. Paulo


Condição de jornalistas nos EUA está depauperada, mostra estudo

No fim de maio, o candidato republicano a deputado Greg Gianforte, de Montana, se irritou com uma pergunta do repórter Ben Jacobs, do jornal britânico "The Guardian", e partiu para cima dele, batendo no jornalista quando ele já estava no chão.

O repórter teve o cotovelo ferido e os óculos quebrados.

Dias depois, Gianforte —que acabou eleito— fechou acordo com Jacobs para doar US$ 50 mil ao Comitê de Proteção dos Jornalistas. O dinheiro foi usado para criar o U.S. Press Freedom Tracker, projeto que monitora ações contra a imprensa nos EUA.

Jonathan Ernst/Reuters
Jornalistas acompanham entrevista de Donald Trump e seu vice, Mike Pence, no resort de Bedminster
Jornalistas acompanham entrevista de Donald Trump e seu vice, Mike Pence, no resort de Bedminster

Lançado na última semana, o site indica que, desde 1º de janeiro, 19 jornalistas foram presos e 11 sofreram agressões físicas. Também contabiliza 12 operações de busca e apreensão de equipamentos e quatro jornalistas parados na fronteira.

A motivação para criar a contagem agora vem do momento que os jornalistas enfrentam nos EUA hoje, segundo Peter Sterne, editor-chefe do site. "A hostilidade de Trump contra jornalistas durante a eleição mostrou a muitos americanos que a liberdade de imprensa estava sob ameaça nos EUA", disse Sterne à Folha.

"Queríamos estabelecer uma base de referência para, em um ano ou dois, ver se as coisas pioraram."

Entre os jornalistas presos, nove foram detidos em protestos no dia da posse de Trump, em 20 de janeiro, e seis em manifestações na reserva indígena Standing Rock, nas Dakotas do Sul e do Norte, contra um oleoduto aprovado pelo republicano.

O problema é que não haverá, no site, comparação com governos anteriores: os organizadores optaram por fazer o registro só a partir de 2017, afirmando que a busca de dados retroativa não poderia seguir os mesmos padrões de verificação.

Sterne reconhece que os jornalistas já vêm sendo detidos ao cobrir protestos "há anos" e que o governo Obama "condenou um número recorde de pessoas que compartilharam informação sigilosa com jornalistas".

Na última semana, o secretário de Justiça, Jeff Sessions, anunciou que as investigações sobre vazamentos triplicaram sob Trump.

"O que é novo no governo Trump é o nível de intensidade da hostilidade contra a imprensa. E essa retórica antijornalismo é muito perigosa", afirmou o editor-chefe.

O projeto é liderado pela Fundação para a Liberdade de Imprensa, que tem 20 parceiros, entre eles o Comitê de Proteção dos Jornalistas e os Repórteres sem Fronteiras.

Além da "multa" de Gianforte, doações de indivíduos e fundações privadas, como a Fundação Barr, de Boston, financiam a operação. As acusações feitas por jornalistas ou organizações são "cuidadosamente examinadas".

Para muitos, o comportamento de Trump contra a imprensa é visto como gatilho para a violência contra jornalistas. Aliados do presidente respondem que o descrédito da mídia —uma pesquisa NPR/PBS NewsHour de julho mostra que só 30% confiam na imprensa, índice inferior aos 37% do presidente— é resultado de uma suposta cobertura parcial anti-Trump.

Levantamento da Folha mostrou que, nos seis primeiros meses de governo, Trump usou 1 de cada 10 tuítes que publicou para atacar a mídia.

O presidente declarou várias vezes que a imprensa é "inimiga" do povo e, na campanha, costumava apontar para jornalistas ao criticar "fake news" (notícias falsas). As vaias que se seguiam confirmavam o repúdio que o republicano incita.


Endereço da página:

Links no texto: