Folha de S. Paulo


Depois do PT, PSOL se divide sobre Assembleia Constituinte na Venezuela

A crise venezuelana reverberou na esquerda brasileira. Depois do PT, nesta semana, foi a vez de o PSOL expor suas divergências sobre o governo do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.

Na segunda-feira (31), o comando nacional do PSOL divulgou nota em apoio à convocação de uma Assembleia Constituinte nos moldes definidos por Maduro. Pelo modelo, os constituintes foram eleitos segundo cotas fixadas pelo governo. A oposição boicotou a votação.

Alan Marques/Folhapress
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) fala no plenário da Câmara, em Brasília
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) fala no plenário da Câmara, em Brasília

Um dia após a eleição, marcada por conflitos violentos, a cúpula do PSOL publicou nota segundo a qual "a convocação de um processo constituinte visa ampliar a legitimidade de um governo que mudou a face do país, sob o comando de Hugo Chávez".

Sob o título "Toda solidariedade à revolução bolivariana", a nota do PSOL afirmava ainda que em um cenário de radicalização das posições "não há meio-termo".

No dia seguinte, o deputado federal Jean Wyllys (RJ) protestou nas redes sociais, chamando de indefensável o apoio da esquerda brasileira a uma ditadura.

"Não sou neutro [...]. Sou contra uma farsa de constituinte com regras eleitorais pelas quais, se a oposição participasse, mesmo vencendo, perderia, porque é um jogo de cartas marcadas", reagiu.

Wyllys acrescentou:

"Sou a favor de uma esquerda do século 21... e o chavismo, além de autoritário, é anacrônico, machista, homofóbico, antissemita, militarista, chauvinista, atrasado".

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CONSTITUINTE VENEZUELANA
Votação convocada por Maduro é questionada pela comunidade internacional

Manobras do governo
- Dividiu as cadeiras da Constituinte por voto territorial e setorial
- No voto territorial, cidades menores (mais chavistas) tiveram mais peso que as grandes cidades
- No voto setorial, a divisão por associações de classe foi definida pelo chavismo

Indícios de fraude
- Empresa responsável pela votação afirma que resultado foi manipulado
- Segundo a companhia, o governo inflou os números em pelo menos 1 milhão
- O CNE não havia detalhado o resultado, como o número de votos nulos
- Tampouco foi divulgado o número de votos de cada membro eleito da Constituinte

A presença dos venezuelanos nas urnas -

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Reconhecendo que o tema divide o partido, Wyllys afirma que a bancada não foi consultada sobre a divulgação da nota, assinada pela secretaria de Relações Internacionais do partido. Procurada, a assessoria da liderança do PSOL afirmou que a nota reproduz a opinião partidária.

Segundo Wyllys, o governo Maduro não é de esquerda "sequer na política econômica, que é um desastre".

"O povo está passando fome, faltam remédios e comida. Esse governo é indefensável e não é agora, há muitos anos que é indefensável."

Estimulado por Wyllys, a direção estadual do PSOL do Rio também protestou nas redes sociais, divulgando uma nota em que chama de absurda a manifestação de apoio sem prévia consulta e traz duras críticas à gestão Maduro.

Há duas semanas, a presidente nacional do PT, a senadora do Paraná Gleisi Hoffmann, provocou constrangimento entre petistas ao defender enfaticamente a convocação da assembleia.

Ela e a secretária de Relações Internacionais do PT, Mônica Valente, redigiram um artigo em defesa de Maduro, publicado na Folha no último dia 30.

Um dos principais interlocutores do ex-presidente Lula, o ex-chanceler Celso Amorim afirma que o diálogo "segue sendo a única saída para o drama venezuelano".

"Não creio que a situação extremamente grave a que a Venezuela chegou se preste a simplismos. Não é possível basear o julgamento em único episódio, por mais importante que seja. O Brasil, durante a época em que fui ministro do presidente Lula, se empenhou em estabelecer as bases para o diálogo, com algum sucesso. Mas não se pode ignorar que a raiz dos males venezuelanos é a história de exploração e abandono do povo, em benefício de uma minoria, situação que o governo Chávez procurou corrigir", disse Amorim.

"É lamentável que, por suas atitudes, além da falta de legitimidade, o governo brasileiro atual seja incapaz de ter qualquer papel em eventual retomada do diálogo."


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