Folha de S. Paulo


Governo britânico publica proposta de lei que revoga relação com a UE

O governo britânico divulgou na manhã desta quinta-feira (13) a proposta da chamada "Repeal Bill", a lei de revogação (da relação com a União Europeia, UE), que marca o início da discussão da legislação necessária para o "brexit". Ela prevê que nos próximos dois anos cerca de 19 mil leis europeias sejam "copiadas e coladas" no aparato jurídico britânico, para que não existam áreas descobertas de legislação no dia em que a saída da Europa se completar, em março de 2019.

Embora seja fundamental para o perfeito funcionamento das instituições britânicas, a tramitação da lei tem tudo para se tornar um pesadelo para o governo conservador nos próximos dois anos. O ministro para o "brexit", David Davis, pediu a ajuda de todos os partidos para aprovar a medida em nome do interesse nacional.

Stefan Wermuth/Reuters
A primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, após sair de uma igreja em Sonning
A primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, após sair de uma igreja em Sonning

A oposição liderada por Jeremy Corbyn, imediatamente reagiu dizendo que tal como foi proposta, a lei não será aprovada. Os trabalhistas exigem seis mudanças importantes. O líder dos liberais-democratas disse que a tramitação vai ser "um inferno". Os chefes dos governos locais da Escócia e do País de Gales protestaram contra a deliberação em Londres de leis que, entendem, deveriam ser aprovadas no Parlamento de cada país do Reino.

Vai ser realmente um inferno: bastam sete dissidentes do partido Conservador para derrotar o governo. E o governo vem dando mostras de estar realmente muito dividido sobre a questão europeia. Diante de tantas medidas a serem discutidas, é fácil imaginar derrotas ou obstruções.

O governo conta com uma possibilidade formal de administrar por uma espécie de medida provisória, um recurso que dá poderes presidencialistas aos ministros parlamentaristas, criado pelo rei Henrique 8º (1491-1547), famoso por ter-se casado seis vezes e por ter criado a Igreja Anglicana. Theresa May conseguiria governar por essa forma de decreto, sem precisar submeter todas as leis ao Parlamento, se tivesse obtido na eleição de 8 de junho a maioria parlamentar que sonhava. Mas agora tem um governo de minoria, com apoio do nanico DUP (Partido Unionista Democrático), da Irlanda do Norte, que é contrário à sua visão mais radical do "brexit". Hoje, a ideia de um governo com poderes especiais não tem apoio nem mesmo de seu partido.

Um exemplo do clima tenso no Parlamento em relação ao "brexit" foi a medida, anunciada no início da semana, de revogação da participação inglesa na agência atômica europeia. O governo rescindiu o vínculo por uma decisão interna. Mas material radiativo tem uso medicinal, é questão de saúde pública. Até mesmo deputados conservadores vieram a público para protestar contra a falta de transparência, dando munição à oposição trabalhista para exigir a publicação das consultas feitas à área de saúde do governo.

A principal mudança que os trabalhistas exigem no texto da "Repeal Bill" é a garantia de que a lei de direitos dos cidadãos europeus, que contém leis trabalhistas, seja copiada para a legislação britânica (na Inglaterra, as regras sobre trabalho são fruto de negociação entre patrões e empregados). O governo não incluiu essa legislação na previsão de incorporação. Os conservadores alegam que os direitos consagrados dos britânicos contemplam tudo que está na regra europeia. Não é o que acha a oposição.

A tramitação da lei será um teste permanente para a primeira-ministra Theresa May ao longo dos próximos dois anos. O jornal "Financial Times" publicou quarta-feira que ela já se prepara a eventualidade de ser derrotada. Para os seus adversários, a chance é exatamente derrubar no Parlamento algum aspecto mais polêmico da lei publicada nesta quinta-feira.


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