Folha de S. Paulo


UE cobra dívida do Reino Unido, e chanceler britânico reclama

Michel Barnier, o principal negociador da União Europeia para o "brexit", disse ao Reino Unido que as negociações não avançarão enquanto os britânicos não aceitarem o princípio de que um acordo de saída envolve um pagamento substancial ao bloco.

Em uma entrevista coletiva em Bruxelas antes da segunda rodada de negociações Bruxelas-Londres, na próxima segunda-feira (17), Barnier disse que as tratativas dependem de o Reino Unido reconhecer "a existência de obrigações financeiras que derivam simplesmente do período em que ele foi membro da UE".

Bruxelas avalia que essas obrigações poderão levar a um acordo de saída inicial de 86,4 bilhões de euros (cerca de R$ 316 bilhões), em que o Reino Unido também assumiria a responsabilidade por 11,5 bilhões de euros (R$ 42 bilhões) em obrigações contingentes e 1,7 bilhão de euros (R$ 6,2 bilhões) em promessas de financiamento ao desenvolvimento.

Quando perguntado se se recusaria a discutir qualquer outra questão caso o Reino Unido não aceite que tem obrigações financeiras, Barnier respondeu em inglês: "Sim".

Em um indício das tensões que cercam o assunto, Boris Johnson, o secretário das Relações Exteriores britânico, sugeriu na terça-feira (11) que o Reino Unido rejeitará essas demandas.

"Acho que as somas que vi (...) me parecem extorsivas e acho que 'vão assobiar' é uma expressão totalmente adequada", disse ele aos deputados.

Em resposta, Barnier comentou que o tempo está correndo para um acordo antes da data marcada para a saída do Reino Unido, em março de 2019. "Não estou ouvindo assobios, só o relógio batendo", disse.

Ele acrescentou que chegou a hora de "envolver-se substancialmente em todas as questões" referentes ao divórcio entre Reino Unido e UE, que vão de direitos civis a cooperação em energia nuclear e o tratamento de bens que estão no mercado no dia em que o Reino Unido sair.

Enquanto o governo britânico apresentou propostas detalhadas sobre os futuros direitos dos 3,2 milhões de europeus que vivem no Reino Unido, foi muito menos cooperativo sobre o problema politicamente tóxico da lei de saída.

David Davis, secretário do "brexit", concordou em criar um "grupo de trabalho" sobre questões financeiras como parte das negociações de saída, mas também afirmou que em termos legais as obrigações do Reino Unido com a UE terminarão junto com a afiliação.

Até hoje, o Reino Unido só produziu um documento de posições sobre os direitos dos cidadãos, enquanto a UE emitiu posições que cobrem vários aspectos do divórcio.

Barnier disse que a questão do acordo financeiro é fundamental para o futuro das negociações.

"Como você constrói um relacionamento, sobre comércio, segurança, defesa, outros assuntos (...) como você constrói um relacionamento em longo prazo se não houver confiança? Como se faz isso?", questionou ele.

"Podemos discutir esta ou aquela linha do orçamento, é o que eu quero fazer. Quero discutir com os britânicos linha por linha", disse ele. "Mas o pré-requisito é que eles reconheçam que fizeram compromissos conosco."

Bruxelas afirma que discussões difíceis também aguardam os direitos dos cidadãos, área em que uma oferta feita pelo Reino Unido no mês passado foi criticada pelos líderes europeus como abaixo do padrão.

Barnier disse que houve "diferenças substanciais" entre os dois lados, e reiterou a demanda da UE de que o Tribunal de Justiça Europeu seja o "garantidor máximo" de qualquer acordo sobre direitos.

Mas ele minimizou a importância de uma recente decisão do governo britânico de sair da Convenção de Pesca de Londres, de 1964, que concedeu acesso a navios de cinco países europeus, em uma tentativa de exercer maior controle das águas territoriais britânicas antes do "brexit".

Barnier disse que a medida "não muda nada", comentando que a convenção foi "superada" pela Política Comum de Pesca da UE, e que esta incluirá o Reino Unido até sua saída do bloco.


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