Folha de S. Paulo


EUA negam vistos a equipe de robótica formada por meninas afegãs

Não é fácil passar equipamento de robótica pela alfândega do Afeganistão, mas isso não dissuadiu um grupo muito combativo.

Por meses, uma equipe formada por seis meninas vem batalhando para construir um robô que separa bolas, para participar de uma competição internacional. Outras equipes receberam o material básico em março.

Reprodução/FIRST Global Challenge
Equipe afegã inscrita no concurso de tecnologia FIRST Global Challenge
Equipe afegã inscrita no concurso de tecnologia FIRST Global Challenge

Mas a caixa enviada dos Estados Unidos parou por meses na alfândega do Afeganistão, devido a preocupações quanto ao terrorismo. Assim, as jovens engenheiras improvisaram, criando máquinas motorizadas com base em suprimentos encontrados em casa.

Elas não tinham tempo a perder se pretendiam participar do FIRST Global Challenge, um desafio internacional de robótica que acontece este mês em Washington. Equipes de jovens de todo o mundo se enfrentam em um esforço para estimular o interesse dos estudantes por ciência, tecnologia, engenharia e matemática.

Para participar, as adolescentes da cidade afegã de Herat, no oeste do país, precisavam de autorização para viajar aos Estados Unidos. Assim, depois de convencer os pais a deixá-las viajar, elas fizeram a jornada de 800 quilômetros até a embaixada dos Estados Unidos em Cabul, para solicitar vistos. Tiveram de fazê-lo duas vezes, mesmo depois que o local foi alvo de um atentado com caminhão-bomba que deixou ao menos 150 mortos em maio.

As coisas pareciam estar se encaixando. Mas a equipe não demorou a receber más notícias: seu pedido de vistos havia sido indeferido. Roya Mahboob, que fundou a Citadel, uma empresa de software, no Afeganistão, e foi a primeira mulher a presidir uma empresa de tecnologia no país, é uma das patrocinadoras da equipe. Quando as meninas foram informadas, ela conta, "choraram o dia inteiro".

"Da primeira vez que foram rejeitadas, foi difícil conversar com elas", disse Mahboob ao site Mashable. "Elas são novas e estavam muito chateadas."

Fatemah, 14, disse à revista "Forbes" que querem "mostrar ao mundo que somos capazes de fazê-lo". "Só precisamos de uma chance."

Na página delas no concurso, as meninas escreveram:

"Queremos fazer diferença, e a maioria dos avanços na ciência, tecnologia e outros setores normalmente começa pelo sonho de uma criança de fazer algo de grande. Queremos ser crianças que seguem os seus sonhos e fazem diferença nas vidas dos outros."

O Departamento de Estado não comenta sobre recusa de vistos específicos. De acordo com registros recentes do departamento, conseguir visto de negócios para os Estados Unidos é especialmente difícil no Afeganistão. Só 112 vistos foram concedidos em maio de 2017, ante 780 para visitantes do Iraque e 4.067 a paquistaneses.

Joe Sestak, antigo deputado federal norte-americano que preside o FIRST Global, ficou decepcionado com a notícia, e frustrado por "essas meninas extraordinariamente corajosas não poderem visitar os Estados Unidos e em lugar disso terem de ver seu robô concorrer via Skype. Equipes do Iraque, Irã e Sudão participarão da competição".

Mahboob está frustrada, mas ainda acredita que as adolescentes possam inspirar outros jovens. "No Afeganistão, como você sabe, o setor é completamente dominado pelos homens", teria dito Mahboob, de acordo com a revista "Newsweek". "As meninas estão mostrando ainda muito novas que são capazes de construir alguma coisa."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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