Folha de S. Paulo


'Nossa marca é pior que a de Trump', dizem democratas após derrota

Os democratas ficaram enfurecidos, não se conformaram e buscaram se reunir nesta quarta-feira (21) após uma derrota decepcionante nas eleições especiais no Estado da Geórgia, em que o chefe de campanha do partido traçou os caminhos alternativos para tomar o poder na Câmara e alguns deputados questionaram mais uma vez a estratégia política e a liderança de Nancy Pelosi, a líder democrata na Casa.

Ao participar agressivamente de uma disputa ao Congresso nos subúrbios conservadores de Atlanta, os democratas esperavam fazer uma declaração enfática sobre a fraqueza do Partido Republicano sob o comando do presidente Donald Trump.

Jessica McGowan - 20.jun.2017/AFP
ATLANTA, GA - JUNE 20: Georgia's 6th Congressional district Republican candidate Karen Handel gives a victory speech to supporters gathered at the Hyatt Regency at Villa Christina on June 20, 2017 in Atlanta, Georgia. Republican Karen Handel becomes the 6th Congressional district congress woman to replace Secretary of Health and Human Services Tom Price. Handel defeated Democrat Jon Ossoff in the special election. Jessica McGowan/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
Candidata republicana Karen Handel, que venceu a disputa em distrito na Geórgia

Seu candidato, Jon Ossoff, arrecadou cerca de US$ 25 milhões (mais de R$ 80 milhões), grande parte através de pequenas doações, e, de forma assertiva, atraiu os eleitores de direita com promessas de desenvolvimento econômico e contenção fiscal.

Mas à medida que começaram a ter retorno e Ossoff continuou obstinadamente atrás de Karen Handel, funcionária pública veterana local, as frustrações democratas explodiram para o conhecimento de todos.

Os deputados e estrategistas ficaram preocupados com a mensagem vaga do partido, e alguns consideraram a disputa como um sinal que os democratas não deveriam apostar demais na conversão dos subúrbios já tingidos de vermelho para ganhar uma maioria na Câmara.

O deputado Tim Ryan, de Ohio, que tem sido um crítico bem franco da estratégia política abrangente de seu partido, disse que os democratas precisavam admitir que eram "tóxicos" em várias partes do país.

"Nossa marca é pior que Trump", disse Ryan, que incitou os democratas a tornar prioridade urgente o forjamento de uma agenda econômica. "Não podemos simplesmente enfrentar Trump."

Ryan, que tentou tomar o cargo de Pelosi, da Califórnia, como líder da minoria na Câmara após as eleições de novembro, disse que ela continuou sendo um peso político sobre outros democratas.

Handel e os grupos republicanos externos amarraram Ossoff a Pelosi nos eventos da campanha e anúncios de televisão, fazendo com que ele fosse lançado como uma marionete do que descreveram ser a agenda liberal da deputada e os "valores de San Francisco".

"Eles ainda a estão enfrentando e ganhando disputas, e isso ainda é um problema", disse Ryan.

Em Washington, o deputado Ben Ray Luján, presidente do Comitê de Campanha Congressional Democrata, do Estado do Novo México, tranquilizou o partido da noite para o dia, fazendo circular um memorando que descrevia detalhadamente a maneira como os democratas pretendem conquistar uma maioria em 2018.

No documento, que foi enviado para deputados e departamentos, Luján escreveu que "não havia dúvidas que os democratas poderiam retomar a Câmara no início do próximo semestre" durante as eleições.

Ao reconhecer que o resultado da Geórgia foi um revés, na quarta-feira, Luján escreveu que seria mais fácil para os democratas conquistarem cerca de seis a oito dezenas de cadeiras tomadas pelos deputados republicanos do que o 6º distrito da Geórgia.

Disse ainda que os próximos meses serão uma "blitz de recrutamento" para os democratas à medida que alistam os candidatos para essas eleições.

"Vamos olhar para fora do molde tradicional para continuar recrutando líderes, veteranos, empresários, mulheres, geradores de empregos e profissionais da saúde em escala local", escreveu Luján. "Vamos usar nosso tempo para encontrar pessoas que tenham a ver com seus distritos, que possuam histórias cativantes e que trabalhem muito para ganhar o apoio dos eleitores."

E, ao citar trechos de uma pesquisa privada, Luján afirmou que há cadeiras republicanas no sul do Arizona e da Flórida, no norte de Nova Jersey e em Kansas City, no Kansas, nos subúrbios, onde os desafiantes democratas já estariam à frente dos incumbentes republicanos.

Os democratas precisam conquistar 24 cadeiras dos republicanos se quiserem ter controle da Câmara.

Era esperado que os deputados democratas se reunissem na manhã de quarta-feira em um caucus, o que poderia virar uma reunião para os deputados reativos debaterem suas ansiedades e reclamações políticas.

Mas logo antes da reunião, meia dúzia de funcionários democratas eleitos desabafaram de modo privado através de mensagens de texto e ligações telefônicas sobre uma tendência desanimadora que surgiu nas eleições especiais deste ano: enquanto seus candidatos parecem estar ganhando força nas pesquisas, é muito fácil que os republicanos estraguem tudo ao trazer Pelosi ao jogo.

Um porta-voz de Pelosi percebeu que, em algumas pesquisas, a taxa de aprovação do presidente da Câmara, Paul Ryan, era ainda pior do que a de Pelosi e disse que qualquer líder democrata em destaque seria foco de ataques por parte da direita.

"Os republicanos passaram por cima de milhões para continuar com uma cadeira vermelha como rubi, e em sua corrida desesperada para conter toda essa hemorragia, voltaram a demonizar o mais forte arrecadador e construtor de consenso do partido", disse Drew Hammill, vice-chefe do departamento de Pelosi. "Eles não têm Clinton nem Obama, então é isso o que eles fazem."

Do lado republicano, o júbilo sobre a vitória de Handel se misturou com a inquietação persistente sobre o cenário político geral.

Enquanto Handel derrotava Ossoff por cerca de 10 mil votos e quase quatro pontos percentuais, os grupos republicanos externos tiveram que gastar US$ 18 milhões (cerca de R$ 60 milhões) defendendo um distrito o qual, durante décadas, os candidatos do partido venciam facilmente.

A taxa de aprovação de Trump continuou a cair de maneira contínua durante a disputa, e, algumas vezes, Handel deu passos ativos para se distanciar do presidente.

E, na mesma noite, uma eleição especial pouco assistida no Estado da Carolina do Sul deu mais um susto no Partido Republicano, visto que um democrata desconhecido, Archie Parnell, apareceu com 3.000 votos por conquistar um distrito congressional republicano forte.

A participação na eleição foi morna, e a pequena margem se deu, em ambos os partidos, em função do grande entusiasmo dos democratas por votarem em uma disputa discreta.

Nick Everhart, um estrategista republicano de Ohio, disse que o partido não deve permitir que esse alívio, de ter mantido os democratas protegidos, vire complacência. Até agora, disse ele, os republicanos têm derrotado os democratas somente em solo fértil vermelho.

"Fingir que não há problemas sérios de discrepância de entusiasmo na base do Partido Republicano, e ainda mais importante, independentes fugindo, é a mesma coisa que cabular as aulas que precisam ser aprendidas antes de as cadeiras realmente concorridas serem ocupadas", disse Everhart.

Tradução de LUCIANE CAMARGO


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