Folha de S. Paulo


ANÁLISE

A maioria absoluta do presidente imperial francês

Christophe Archambault/AFP
Emmanuel Macron, presidente da França, vota nas legislativas deste domingo
Emmanuel Macron, presidente da França, vota nas legislativas deste domingo

"Os bastidores de uma vitória", de Yann L'Hénoret, documentário lançado no dia seguinte à vitoria de Emmanuel Macron contra Marine Le Pen, desvenda o universo do novo presidente da França.

Durante a campanha, a equipe composta por jovens moderninhos que transformaram as reuniões de delegados em incubadoras de empresas servia apenas para aprovar as decisões de um líder controlador. O candidato Macron escolhia as fotografias dos panfletos, redigia os comunicados de imprensa, decidia até o protocolo dos eventos.

O presidente Macron segue na mesma linha. Ele ocupa os escritórios reservados a assessores do palácio presidencial, confina o seu premiê, Edouard Phillippe, a um papel coadjuvante, e evoca os símbolos da monarquia francesa por meio de imagens fortes, como a caminhada solitária na esplanada do Louvre no dia da sua eleição e o encontro de cúpula com Putin no Palácio de Versalhes.

Macron se autoproclama o presidente start-up. Mas tem a atitude de um Luís 14 (1638-1715), o Rei Sol.

A maioria absoluta obtida pelo seu partido, o República em Marcha!, nas eleições legislativas deste domingo (18) sacramenta a Presidência imperial imaginada por Macron.

A Assembleia assistirá a uma inédita troca de comando. Centenas de macacos velhos da política francesa cederão os seus lugares a deputados de primeira viagem escolhidos a dedo por Macron e seus assessores.

A essa legião de jovens inexperientes, se junta algumas dezenas de aliados da última hora. Esse grupo heterogêneo formará um bloco parlamentar de cerca de 360 deputados, largamente além da maioria absoluta.

Os cerca de duzentos assentos parlamentares restantes serão ocupados pelas duas esquerdas –os sobreviventes da social democracia e os recém-chegados da esquerda populista–, e pelas duas direitas, a mais importante, que reivindica o papel de herdeira do ex-presidente Charles De Gaulle (1890-1970), e a minoritária, de Le Pen.

Esses quatro grupos padecem de fortes divisões internas e se odeiam. É fato que a oposição não conseguirá fazer bloco único contra o partido de Macron em nenhuma questão fundamental. Resta saber como será o embate entre Macron e as forças sociais francesas.

Com a liquidação dos partidos e sindicatos tradicionais, Macron vai ter de emplacar as suas reformas sem o apoio dos corpos intermediários, cujo papel indispensável na política francesa foi ressaltado pelo sociólogo Dominique Wolton, em entrevista à Folha.

Esse confronto sem intermediação com os diferentes grupos de interesse pode se revelar de grande intensidade e de difícil controle, porque não será personalizado na Assembleia.

Desconhecemos o desfecho do quinquênio de Macron, mas ele certamente continuará do jeito que começou: cheio de surpresas.

2º turno eleições legislativas francesas

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