Folha de S. Paulo


Líder do Irã é pressionado por aliados a promover direitos humanos no país

Na semana que antecedeu a eleição presidencial de 19 de maio no Irã, o vencedor eventual, Hasan Rowhani, criticou o Judiciário e a poderosa Guarda Revolucionária, usando palavras raramente ouvidas em público na república islâmica.

Agora, seus partidários consideram que é hora de ele mostrar a que veio. Milhões de seus seguidores esperam que ele continue a fazer pressão por avanços em questões de direitos humanos.

Stringer/Reuters
O presidente do Irã, Hassan Rowhani, durante cerimônia que marca o aniversário da Revolução Islâmica de 1979, em Teerã
O presidente do Irã, Hassan Rowhani

"A maioria dos iranianos deixou claro que quer melhorias nos direitos humanos", disse Hadi Ghaemi, diretor da ONG Center for Human Rights in Iran (CHRI), sediada em Nova York. "As expectativas são altas."

Essa mensagem foi transmitida claramente pouco depois de Rowhani, reeleito com mais de 57% dos votos, subir ao palco em Teerã na semana passada em evento com apoiadores.

"Ya Hussein, Mirhossein", repetiam as pessoas, aludindo a Mirhossein Mousavi, candidato presidencial na eleição de 2009. Ele e o também candidato Mehdi Karroubi contestaram o resultado da eleição, desencadeando protestos amplos.

Dezenas de manifestantes foram mortos e centenas detidos na repressão que se seguiu, segundo grupos de defesa dos direitos humanos.

Em 2011, depois de pedir por protestos no Irã em solidariedade com os levantes pró-democracia em outras partes do Oriente Médio, Mousavi, sua mulher, Zahra, e Karroubi foram colocados em prisão domiciliar.

Os três continuam detidos, e sua prisão é uma questão política que provoca divisões no Irã e que Rowhani prometeu resolver.

Mas, se ele continuar fazendo pressão, dizem analistas, vai enfrentar uma reação contrária de seus adversários da linha-dura, algo que pode dificultar seu segundo mandato presidencial.

MENSAGEM CLARA

Um apresentador no evento levou vários minutos para acalmar a multidão, até que outro grito começou a ser repetido: "Nossa mensagem é clara, a prisão domiciliar tem que acabar".

Além dessas prisões, mais de 20 jornalistas e ativistas foram detidos antes das eleições, segundo o CHRI, uma questão que também foi levantada por seguidores de Rowhani.

Muitos presos políticos são mantidos em solitária e impedidos de receber a visita de seus familiares por longos períodos de tempo, segundo grupos de defesa dos direitos humanos.

O Irã tem um dos maiores índices mundiais de pena de morte. Pelo menos 530 pessoas foram executadas no país em 2016, segundo a Organização das Nações Unidas.

Os partidários de Rowhani também esperam que ele lute pelos direitos básicos que afetam a vida diária dos cidadãos, como impedir as forças de segurança de perseguir mulheres devido a seus trajes ou não deixar que o Judiciário cancele concertos.

A primeira prioridade de Rowhani em seu primeiro mandato foi a assinatura de um acordo com potências ocidentais, pelo qual muitas sanções foram levantadas em troca de restrições ao programa nuclear iraniano.

Analistas dizem que, com isso, as questões de direitos humanos ficaram em segundo plano. Mas, agora que o acordo nuclear está sendo implementado, a base de Rowhani espera por mudanças.

A vitória decisiva do presidente pode finalmente lhe ter dado a oportunidade de tratar de algumas das questões de direitos humanos.

"Como chefe do Executivo, Rowhani precisa aproveitar esta oportunidade ao máximo", disse o parlamentar Gholamreza Tajgardoon na semana passada, segundo a agência de notícias iraniana Ilna.

Mas há sinais de que a linha-dura está preparada para resistir.

O chefe do Judiciário iraniano criticou Rowhani na segunda-feira (29) por falar da prisão domiciliar de oposicionistas durante sua campanha eleitoral.

"Quem é você para acabar com as prisões domiciliares?", perguntou Larijani, sem tratar Rowhani pelo nome, segundo o site de notícias do Judiciário Mizan.

Larijani disse que o Conselho Supremo de Segurança Nacional precisa tomar a decisão inicial de encerrar as prisões domiciliares, e em seguida o Judiciário entrará em ação.

Qualquer tentativa de resolver a questão sem ser por meio desse procedimento legal será visto como tentativa de fomentar agitação popular, como a de 2009, ele teria dito, segundo o Mizan.

"Estamos emitindo um aviso: eles devem encerrar este assunto, senão o Judiciário, a autoridade, o encerrará", disse Larijani.

Enquanto isso, as restrições continuam em vigor.

Karroubi, 79, foi presidente do Parlamento antes de se candidatar à Presidência, em 2005 e 2009. Hoje ele passa maior parte do tempo no piso superior de sua casa em Teerã. Para se exercitar, caminha dentro de casa, segundo seu filho, Mohammad Taghi. Suas únicas fontes de informação são os jornais locais e a TV estatal.

Agentes de segurança ficam presentes na residência 24 horas por dia e não lhe permitem acesso ao telefone ou à internet.

Entrevistado pelo telefone, Taghi disse que a prisão domiciliar não teve o efeito desejado, já que elevou o perfil e a importância de seu pai e outros detidos.

"Se o objetivo era cortar os laços políticos deles, o que pudemos ver é que a passagem destes seis ou sete anos não teve efeito algum", ele disse. "Na realidade, as limitações e os problemas aumentaram o impacto deles sobre a sociedade."

Não pode haver grandes avanços em qualquer questão envolvendo direitos humanos sem o aval do aiatolá Ali Khamenei, autoridade máxima no país.

"Desde que se tornou o líder supremo, em 1989, Khamenei tem procurado enfraquecer cada presidente iraniano em seu segundo mandato", comentou Karim Sadjadpour, membro sênior do Carnegie Endowment.

"Considerando que Rowhani desafiou Khamenei diretamente durante a campanha, é provável que esta tradição se mantenha."

Eleições Irã

Tradução de CLARA ALLAIN


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