Folha de S. Paulo


Decreto de Trump sobre imigração deflagra batalha política e judicial

Apesar dos protestos e ações legais contra o decreto do presidente Donald Trump que barra refugiados e cidadãos de sete países muçulmanos, a Casa Branca afirmou nesta segunda (30) que a aplicação das restrições começou bem e não dá sinal de recuo.

O presidente minimizou o caos em aeroportos e os protestos gerados por seu decreto, afirmando incorretamente que os atrasos e cancelamentos no fim de semana foram causados por uma pane da companhia aérea Delta.

"Só 109 pessoas de 325 mil foram detidas para checagem", escreveu Trump em sua ainda hiperativa conta pessoal numa rede social. "Não há nada agradável em procurar terroristas antes que eles possam entrar em nosso país."

Na onda nacionalista do chefe, Sean Spicer, porta-voz da Casa Branca, afirmou que o incômodo causado pelo decreto é um mal menor no esforço para garantir a segurança do país. "Somos o melhor país do mundo. Vir à América é um privilégio, não é um direito", disse.

Além de uma enxurrada de críticas, o decreto de Trump deflagrou uma contra-ofensiva política e legal. A oposição democrata promete fazer o que puder para derrubar o decreto no Congresso, mas dificilmente terá sucesso em dobrar a maioria republicana. O embate final deve ser na Suprema Corte.

Trump barra imigrantes

Dezesseis procuradores-gerais estaduais declararam guerra ao decreto, assinado na última sexta-feira (27) pelo presidente Trump, que suspendeu a admissão de refugiados por 120 dias e barrou por 90 dias a entrada de cidadãos de sete países de maioria muçulmana. Refugiados da Síria estão vetados por tempo indeterminado.

"Usaremos os instrumentos de nossos cargos para lutar contra essa ordem inconstitucional", diz o comunicado dos 16 procuradores, todos de Estados governados por democratas.

SUPREMA CORTE

Depois que juízes federais suspenderam o decreto no sábado (28), a expectativa é de que a batalha legal se intensifique e chegue à Suprema Corte, disse à Folha Stephen Legomsky, especialista em imigração da Universidade Washington, em St. Louis, que assessorou os últimos três presidentes.

Segundo ele, o decreto parece ter sido redigido de forma a blindá-lo de um recurso constitucional, omitindo por exemplo a palavra "muçulmanos".

Mas a promessa de Trump na campanha de vetar a entrada de islâmicos no país poderá levar a Corte a ver violação de duas cláusulas da Constituição, a que proíbe discriminação por raça e religião e outra que garante liberdade religiosa.

TRUMP BARRA IMIGRANTES - Admissão de refugiados nos EUA por nacionalidade*

É difícil prever a decisão do Supremo, diz Legomsky. Primeiro porque a Corte máxima está desfalcada, com oito juízes (de nove), e o presidente Trump está prestes a nomear seu indicado, o que penderá a balança para o lado dos conservadores. Mas o caráter sem precedente da questão torna o placar imprevisível mesmo entre os juízes conservadores, afirma.

"O que torna mais difícil prever a decisão do Supremo é que nenhum presidente jamais havia feito algo assim. A Corte nunca passou por esse teste", diz ele. "Já houve casos de presidentes que vetaram certos indivíduos ou grupos, mas nenhum havia vetado a imigração de um país específico."

INSURGÊNCIA

A atual secretária de Justiça dos EUA, Sally Q. Yates, ordenou ao Judiciário que não defenda o decreto de Trump.

Em carta aos advogados do Departamento de Justiça, ela diz não estar convencida de que a defesa do decreto é consistente com sua responsabilidade de "buscar a justiça e defender o que é certo".

O gesto mostra o clima de insurgência no novo governo, mas é pouco mais que simbólico, já que Yates, remanescente do governo Obama, deve ser substituída em breve pelo senador Jeff Sessions, um linha-dura em imigração que foi indicado por Trump para o cargo e aguarda a confirmação do Senado. Na noite desta segunda, Trump criticou Yates e a chamou de "procuradora-geral de Obama".

O decreto não menciona explicitamente os países-alvo, mas se refere a eles citando ordem de Obama que endureceu a emissão de vistos para nações consideradas fontes de terrorismo: Irã, Iraque, Síria, Iêmen, Sudão, Líbia e Somália.

O decreto de Obama foi assinado em dezembro de 2015, pouco depois de Trump propor barrar muçulmanos, levando a especulações de que teria sido uma resposta.


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