Folha de S. Paulo


Ao indicar nome para Suprema Corte, Trump deve criar batalha política

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na terça-feira (24) que tomaria uma decisão esta semana sobre seu indicado para preencher o assento vago há quase um ano na Suprema Corte, uma escolha que arremessará a Washington ao que promete ser uma batalha política de alta intensidade, já nas primeiras semanas de sua presidência.

No ano passado, os republicanos se recusaram até mesmo debater a indicação do juiz Merrick Garland, apontado pelo então presidente, Barack Obama, para preencher a vaga criada com a morte do juiz Antonin Scalia em fevereiro do ano passado, e isso continua a ser motivo de profundo amargor entre os democratas. Eles prometeram adotar as mesmas táticas contra Trump.

Trump declarou na manhã da terça-feira que faria sua escolha até sexta, e que anunciaria na semana que vem a indicação de um juiz "realmente ótimo". Os três principais candidatos –os juízes William Pryor Jr., do tribunal federal de recursos em Atlanta; Neil Gorsuch, do tribunal federal de recursos em Denver; e Thomas Hardiman, do tribunal federal de recursos em Filadélfia– são parte de uma lista de 21 possíveis indicados conservadores que Trump divulgou durante a campanha.

"Estamos preparados para oposição a todos os nomes da lista de Trump", disse Nan Aron, presidente da Aliança pela Justiça, um dos grupos simpáticos ao Partido Democrata que estão se preparando para a batalha quanto à Suprema Corte desde a eleição de Trump. "A comunidade progressista e defensora dos direitos civis estará unida na oposição a qualquer dos favoritos e a todas as demais pessoas da lista".

Um componente essencial de sua estratégia será uma campanha de propaganda milionária para garantir que os senadores democratas conservadores em Estados como Dakota do Norte, Carolina do Norte e Virgínia Ocidental, não aprovem o indicado de Trump ou se alinhem aos republicanos caso estes decidam mudar o regimento do Senado para impedir os democratas de bloquear a votação quanto ao indicado por meio de manobras regimentais. Se o regimento não for mudado, os republicanos, que contam com 52 senadores, precisarão de 60 votos para impedir um bloqueio democrata.

"Esse assento na Suprema Corte foi roubado do presidente anterior", disse Brad Woodhouse, operador democrata e veterano de passadas campanhas quanto a indicações para a Suprema Corte. Ele disse, em mensagem dirigida aos republicanos, que "não vamos nos fazer de bonzinhos e permitir que vocês colham os frutos desse roubo".

Mas Trump e a bancada de seu partido no Congresso estão determinados a forçar a aprovação de seu indicado e restaurar a vantagem de cinco a quatro juízes de que os conservadores desfrutavam quanto a muitas questões julgadas pela corte, quando Scalia era vivo. Hoje, o tribunal está dividido em linhas ideológicas, o que ocasionalmente resulta em empates por quatro a quatro votos e em casos que ficam sem decisão.

Depois de uma reunião com Trump na Casa Branca, na tarde de terça-feira, o senador Chuck Grassley, republicano do Iowa e presidente do Comitê de Justiça do Senado, elogiou a lista de "juízes ortodoxos e muito respeitados" proposta por Trump, e prometeu que a votação da indicação avançaria rapidamente.

É possível que Trump escolha outro nome em sua lista de 21 possibilidades, além de Pryor, Gorsuch ou Hardiman –ou que aponte alguém inesperado. Entre os juízes que foram seriamente considerados para a vaga está Diane Sykes, 59, do tribunal federal de recursos de Chicago. Mas as chances de Sykes parecem estar em baixa, talvez por causa de sua idade, que está acima da média entre os indicados recentes. Todos os nomes da lista de Trump têm históricos conservadores que certamente se tornarão alvo de atenção e debate.

A história pessoal de Hardiman, 51, é atraente, já que ele tem origens humildes e foi a primeira pessoa de sua família a fazer curso superior, na Universidade Notre Dame. Mais tarde, quando estudava Direito na Universidade de Georgetown, ele trabalhou como taxista para pagar pelo curso.

Mas Gorsuch e Pryor parecem escolhas mais prováveis, e os dois têm históricos conservadores que certamente serão causa de intensas investigações e debates.

Pryor, 54, é um protegido do senador Jeff Sessions, indicado por Trump para o posto de secretário da Justiça. Quando Sessions era secretário da Justiça do Estado do Alabama, Pryor foi seu vice, e o sucedeu quando Sessions foi eleito para o Senado.

Em sua audiência de confirmação, em 2003, ele reiterou uma declaração anterior de que a decisão do caso Roe vs. Wade, de 1973, pela qual a Suprema Corte estabeleceu o direito constitucional ao aborto, representava "a pior abominação de nossa história, em termos de lei constitucional".

"Acredito que não só que a decisão não se sustenta com base no texto e estrutura da constituição como que ela tenha conduzido a um resultado moralmente errado", disse Pryor ao Comitê Judiciário do Senado. "A decisão levou ao morticínio de milhões de crianças não nascidas e inocentes."

As credenciais, erudição e posturas mais discretas de Gorsuch poderiam facilitar sua confirmação, ao menos em comparação com Pryor.

Indicado para o tribunal de recursos pelo presidente George W. Bush, em 2006, Gorsuch, 49, adota uma abordagem judicial semelhante à de Scalia. Ele é parte da escola "originalista", o que significa que tenta interpretar a constituição de modo compatível com o entendimento daqueles que a redigiram e aprovaram. E ele também é textualista, ou seja, se concentra na terminologia dos estatutos em si, e não naquilo que os legisladores tenham a dizer sobre eles.

Suas votações mais conhecidas aconteceram em decisões sobre a regulamentação da Lei de Acesso à Saúde do presidente Obama, que requeria que empregadores oferecessem cobertura gratuita para anticoncepcionais. Ele votou em favor de acatar objeções religiosas a essa regulamentação, e sua posição foi em geral sustentada pela Suprema Corte.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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