Folha de S. Paulo


Voto latino nos Estados Unidos não é monolítico, diz analista

A eleição de Donald Trump mostrou que é enganoso crer que os EUA estejam se tornando um país de "minorias majoritárias" –no qual minorias étnicas, como negros e hispânicos, se tornarão politicamente dominantes em relação à maioria branca.

A opinião é de Karlyn Bowman, 68, integrante sênior e coordenadora de pesquisas do AEI (American Enterprise Institute) –"think-tank"conservador sediado em Washington, cujos membros são em geral críticos de Trump e foram, na maioria, contrários à candidatura dele pelo Partido Republicano.

Para Bowman, que é também colunista da revista "Forbes", o voto dos latinos em Trump (29%, segundo as pesquisas de boca de urna, pouco acima dos 27% obtidos por Mitt Romney em 2012) desmente a tese de que uma "minoria majoritária" esteja se constituindo nos EUA.

"Existe aqui um grande debate sobre se o voto hispânico será monolítico como o voto afro-americano ou se os hispânicos se misturarão à população maior, com uma identidade menos distinta", afirma a especialista.

"Sabemos que os pontos de vista dos latinos de primeira, segunda e terceira gerações diferem", prossegue Bowman. "As opiniões de famílias hispânicas que falam só inglês e as daquelas em que o espanhol é a língua dominante diferem. As opiniões de cubano-americanos de terceira geração não são iguais às da primeira geração na Flórida [Estado-pêndulo, a Flórida foi decisiva para Trump vencer no pleito de 8 de novembro]."

"Eu, pessoalmente, acredito que os negros tiveram uma experiência histórica única que os torna um grupo monolítico. Não vejo os latinos dessa maneira. Há alguma evidência de que hispânicos rurais e urbanos também têm atitudes diferentes. Acredito que a conversa incessante sobre um país de 'minorias majoritárias' no futuro é enganosa", conclui ela.

FIASCO DAS PESQUISAS

Bowman acredita que tanto os pesquisadores como os construtores de modelos estatísticos precisem fazer uma espécie de "exame de consciência" depois das eleições – alguns desses modelos apontaram, por larga margem, vitória de Hillary Clinton (no dia da eleição, o do site "Huffington Post", por exemplo, dava a ela 98% de chances).

"Em geral, as pesquisas não erraram tanto, considerando que Hillary venceu no voto popular. Mas é cada vez mais difícil fazê-las nos EUA. Mesmo as mais bem planejadas, feitas durante um período de tempo mais longo do que as sondagens pré-eleitorais, têm taxas de resposta abaixo de 10%", pondera.

Assim como outros analistas, ela acha que eleitores "tímidos" do bilionário tenham optado por não revelar sua preferência nas urnas aos pesquisadores. "A Associação Americana de Pesquisadores de Opinião Pública deve divulgar no ano que vem um relatório para tentar esclarecer os erros."

A colunista da "Forbes" afirma ainda que o pleito de 2016 foi "definitivamente" uma eleição de mudança. "Dos eleitores, 39% disseram que a qualidade mais importante de um candidato era trazer a mudança necessária, e Trump ganhou nesse grupo por 83% a 13%.

Apenas 21% afirmaram que o mais importante era ter a experiência certa, e menos ainda –20%– disseram acreditar que o essencial era 'ter bom senso'. Nesses grupos, Hillary venceu."

E os eleitores do bilionário acreditam mesmo que ele cumprirá promessas como a construção de um muro pago pelo México na fronteira?

"Eles creem que Trump tentará cumpri-las, mas não será bem-sucedido. Pareciam sugerir que tentar era mais importante do que obter sucesso real. O tempo dirá."


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