Folha de S. Paulo


Franceses escolhem candidato de direita entre ex-premiês; veja perfis

O partido francês de centro-direita Os Republicanos escolhe, neste domingo (27), seu candidato para as eleições de 2017. O voto nas primárias é aberto ao público, e o nome escolhido é quem terá mais chances de derrotar a líder da Frente Nacional, Marine Le Pen, na eleição de 23 de abril de 2017.

Disputam o posto os veteranos da política francesa François Fillon e Alain Juppé, que têm visões conflitantes sobre temas como integração de imigrantes e muçulmanos, mas compartilham visão conservadora da economia.

Os dois deixaram para trás o ex-presidente Nicolas Sakozy, que viu sua carreira política ser sepultada após ficar em terceiro lugar no primeiro turno, no último domingo (20).

AFP
A combination of pictures created on November 19, 2016 shows three candidates for the right-wing Les Republicains (LR) party primaries ahead of the 2017 presidential election (LtoR) former Prime minister and Bordeaux's mayor Alain Juppe, former Prime minister and member of the parliament Francois Fillon, and former French president Nicolas Sarkozy. Seven candidates were confirmed on September 21, 2016 to contest the rightwing primary to pick a nominee for France's presidential election next year, officials said. / AFP PHOTO
Montagem com Alain Juppe, Francois Fillon e o candidato que saiu da corrida, Nicolas Sarkozy

FILLON QUER CORTE DE GASTOS

Quando François Fillon foi premiê da França, entre 2007 e 2012, o então presidente Nicolas Sarkozy referiu-se a ele como um "empregado", um "caso triste". Rivais lhe chamavam "Senhor Ninguém".

Mas ele recebeu o maior número de votos durante o primeiro turno das primárias da centro-direita, na semana passada, e agora é o favorito à nomeação. Sarkozy não chegou ao segundo turno.

Fillon teve 44,1% dos votos no dia 20. O segundo colocado, Alain Juppé, recebeu 28,5%. Sarkozy teve só 20,6%.

Aos 62 anos, metade dos quais na política, Fillon é descrito por sua calma e maneiras discretas —devido às quais ele foi escanteado por Sarkozy durante sua aliança.

O então presidente passava por cima do primeiro-ministro naqueles anos para falar diretamente com o gabinete.

Um dos únicos premiês a durar todo o mandato no país, Fillon deixou o posto com problemas nas costas e dificuldades para caminhar.

Havia pouca expectativa de que ele pudesse chegar ao protagonismo. Sua vitória surpreendeu mesmo os aliados, a quem ele vinha assegurando ter de fato chances de estar no primeiro lugar.

Fillon nasceu em Le Mans, no oeste francês, em um ambiente tradicional católico.

Advogado por formação, ele conquistou seu espaço na política a partir da região de Sarthe, 200 km ao oeste de Paris, onde criou seus cinco filhos numa mansão do século 12 chamada Manoir de Beaucé.

Antes de ser premiê de Sarkozy, Fillon foi ministro de Assuntos Sociais e também de Educação Nacional.

Seu programa político é marcado pelo conservadorismo econômico e social. Admirador da premiê britânica Margaret Thatcher, ele defende a redução de gastos e o amolecimento das leis trabalhistas, facilitando cortes.
Sua plataforma inclui suprimir 500 mil postos no setor público, elevar a idade de aposentadoria e reduzir os impostos pagos por firmas.

Ele também é contrário ao casamento gay —contra o qual votou em 2013— e à adoção por pais do mesmo sexo.

Fillon publicou recentemente um ensaio sobre o radicalismo no Islã, aproximando-se da polêmica tese de um "embate entre civilizações", popularizada por Samuel Huntington nos anos 1990. Ele diz que a invasão do islamismo no cotidiano francês pode levar à guerra mundial.

Ao promover o livro "Vaincre le totalitarisme islamique" (Vencer o totalitarismo islâmico, e, tradução livre), disse ao "Figaro": "Não há um problema de religião na França. Há um problema ligado ao Islã".

Juppé lhe acusa de querer arrastar a França ao passado com uma visão " tradicionalista, para não dizer levemente retrógrada, do papel da mulher, da família e do casamento".

Mas, ao contrário de Juppé e Sarkozy, ele não se envolveu em escândalos de corrupção, o que contará em seu favor neste domingo (27).

APÓS ESCÂNDALO, JUPPÉ APOSTA EM NOVA IMAGEM

Lionel Bonaventure/AFP
O prefeito de Bordeaux e pré-candidato de centro direita à Presidência da França Alain Juppé participa de comício em Chatou
O prefeito de Bordeaux e pré-candidato de centro direita à Presidência da França, Alain Juppé

Alain Juppé, 71, disputa as primárias da centro-direita francesa neste domingo (27) enfrentando não apenas o rival François Fillon mas também o seu próprio histórico de rejeição entre a população francesa.

Em 1995, quando era primeiro-ministro (1995-1997) da França, Juppé foi alvo de protestos —os maiores registrados no país desde 1968— contra reformas na aposentadoria. Ele foi obrigado a abandonar seus planos diante da fúria popular.

Em 2004, ele foi condenado por um escândalo de corrupção na prefeitura de Paris e temporariamente impedido de assumir cargos públicos.

Com tais antecedentes de atritos, somados à fama de frio e robótico, surpreende que ele tenha chegado ao segundo turno das primárias e possa, caso vença, representar o partido Os Republicanos nas eleições de 2017.
Juppé se beneficia pela passagem do tempo, que apaziguou os ânimos, e pelo redesenho de sua imagem.

Mas, como o rival Fillon, ele ainda defende algumas propostas que podem desagradar o público: por exemplo, as reformas nas leis trabalhistas e o aumento da idade de aposentadoria.

Juppé é veterano da política francesa, a exemplo de Nicolas Sarkozy.

Ele foi premiê entre 1995 e 1997 e prefeito de Bordeaux, no sudoeste, além de ter sido ministro em pastas como Defesa e Assuntos Externos.

Ele foi também porta-voz do governo entre 1986 e 1988.

Como candidato, ele se distingue de Fillon e de Marine Le Pen —do partido de extrema-direita Frente Nacional— pela defesa da diversidade social. Juppé critica as políticas populistas contra migrantes e muçulmanos.

Em outubro, porém, ele foi duro ao defender que a decisão pela entrada ou não dos imigrantes no Reino Unido fosse feita em território britânico e não em Calais.

Juppé chama sua política de "identidade feliz", termo que cunhou em contraposição ao livro "Identidade Infeliz" (Alain Finkielkraut, 2014), sobre os riscos de uma identidade francesa multicultural.

Essas posições não convencem parte do eleitorado, após anos especialmente duros nesse país. Mais de 230 pessoas foram mortas em 18 meses, incluindo as 130 vítimas dos atentados de novembro de 2015 em Paris, assumido pelo Estado Islâmico.

Sarkozy, que vinha radicalizando suas posições, chegou a criticar Juppé como demasiado ingênuo e como um "profeta da felicidade".

Ao contrário de Fillon, Juppé não ameaça reverter os ganhos sociais da população homossexual e nem é contrário ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. Ele chegou a defender, no entanto, que essa união fosse chamada por "outro nome".

Juppé, pai de três filhos e casado pela segunda vez, era o favorito à indicação do partido Os Republicanos para disputar as eleições de 2017, no que foi chamado nesse país de "Juppémania".

Mas, em um resultado inesperado, seu rival Fillon venceu a rodada e passou a liderar a corrida pela candidatura.


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