Folha de S. Paulo


China manda moradores de região muçulmana entregarem passaportes

A China ordenou a todos os habitantes da região de Xinjiang, em sua fronteira ocidental, que entreguem seus passaportes. É a mais recente medida draconiana imposta à província insubmissa onde vive uma minoria muçulmana de 11 milhões de pessoas.

Os cidadãos de Xinjiang, região rica em petróleo mas etnicamente dividida, terão que entregar seus passaportes à polícia e solicitar sua devolução se quiserem viajar, informou o jornal "Global Times", controlado pelo Estado. A finalidade da medida seria "a manutenção da ordem social".

Nos últimos anos, os 11 milhões de uigures da região –um povo muçulmano, com vínculos linguísticos e culturais com a Turquia e que forma aproximadamente metade da população de Xinjiang, de 23 milhões de habitantes– vêm enfrentado restrições crescentes a seus deslocamentos, religião e vestimenta. As autoridades reprimiram símbolos religiosos do islã, como barbas e véus. Os 800 mil funcionários públicos de Xinjiang são proibidos de participar de atividades religiosas.

O anúncio sobre os passaportes foi recebido com raiva e consternação por internautas chineses, que se queixaram que terão que apresentar uma quantidade incomum de informações pessoais e documentos de viagem para conseguir seus passaportes de volta. Alguns moradores de Xinjiang que estão trabalhando em outras regiões da China receberam telefonemas instruindo-os a voltar para casa e entregar seus passaportes.

"O que está acontecendo em Xinjiang? O povo daqui tem direitos humanos ou não tem? O governo não poderia simplesmente facilitar nossa vida?", escreveu uma pessoa no Weibo, o equivalente ao Twitter. "Estou furioso."

Muitos uigures de Xinjiang são contra o governo chinês e o que veem como as políticas colonialistas adotadas na região. Uma insurgência violenta vem irrompendo esporadicamente nos últimos anos, e centenas de uigures apareceram na Turquia e em campos de tráfico humano no sudeste asiático.

Pequim atribui uma série de ataques fatais lançados nos últimos anos à atração crescente exercida pelo radicalismo islâmico sobre os uigures. As forças de segurança pública do Quirguistão disseram que militantes uigures baseados na Síria foram responsáveis por um ataque suicida contra a embaixada chinesa em Bishkek em setembro.

Fora de Xinjiang, a campanha anticorrupção na China já estendeu a milhões de cidadãos comuns as limitações às viagens frequentemente impostas a dissidentes políticos e "arruaceiros". Muitos funcionários públicos foram obrigados a entregar seus passaportes no último ano.

As restrições às viagens ao exterior exercem efeito negativo sobre os intercâmbios culturais, com acadêmicos chineses cancelando participações em conferências internacionais.

Tradução de Clara Allain


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