Folha de S. Paulo


Governo e Farc assinarão acordo na 5ª; texto será validado pelo Congresso

Apesar de não ter a aprovação por parte dos que lideraram a campanha do "não" ao acordo de paz -opção vencedora do plebiscito no último dia 2 de outubro-, o governo colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) anunciaram nesta terça (22) que assinarão o novo tratado na próxima quinta (24).

Em comunicado conjunto, ambas as partes disseram também que a aprovação do acordo, desta vez, não se dará por meio de um novo plebiscito, e sim através do Congresso.

Os detalhes de como será a votação não foram revelados -o governo tem a opção de usar um mecanismo de "fast track", uma aprovação mais rápida, com menos legisladores, já aprovada pela Justiça- ou promover uma votação geral.

Atualmente, o governo possui maioria nas duas casas. Das 102 cadeiras do Senado, tem 52, contra 25 da oposição (composta principalmente pelo Centro Democrático, partido liderado pelo ex-presidente Álvaro Uribe) e 25 de partidos independentes. E, na Câmara de Deputados, de 166 cadeiras, o partido do presidente Juan Manuel Santos possui 98, contra 22 da oposição e 46 independentes.

Em discurso na noite de terça, Santos disse que o novo acordo acolhe a maioria dos pedidos dos setores que defenderam o "não" e tem o apoio da comunidade internacional. "Praticamente o mundo inteiro expressou apoio", resumiu Santos, antes de ressaltar que "lamentava" que setores do "não" ainda se mostrassem insatisfeitos.

O presidente também chamou a atenção para a necessidade de dar rapidez ao processo devido a episódios recentes de enfrentamentos e violência que poderiam se tornar mais frequentes caso as Farc permanecessem no limbo jurídico em que estão, em acampamentos temporários e sem vigilância ou proteção.

GRUPO DO "NÃO"
Depois de deixar o governo esperando por oito dias, o Centro Democrático, partido do ex-presidente Álvaro Uribe, finalmente se pronunciou nesta terça (22) sobre a nova versão do tratado, e de maneira negativa.

Os uribistas disseram, depois de uma reunião com representantes do governo, não estarem satisfeitos com a nova versão do texto.

O novo documento acolhe algumas de suas sugestões, mas não tocou em pontos por eles considerados essenciais, como o impedimento da elegibilidade política dos ex-guerrilheiros -que permaneceu praticamente intacta- e o requisito de que os condenados cumprissem suas penas em algum tipo de prisão -se não numa comum, ao menos em colônias agrícolas.

Também permaneceram as divergências em relação ao modo de enquadrar o crime do narcotráfico. Governo e Farc consideram que os crimes dessa natureza poderiam ser tratados caso a caso, enquanto os do "não" querem que seja considerado crime de lesa humanidade, portanto não passível de anistia.

Durante o período de renegociação após a rejeição do acordo no plebiscito de 2 de outubro, as Farc aceitaram algumas das mudanças propostas pelo grupo do "não" em relação à Justiça, colocando limites na atuação dos tribunais especiais, e em relação a oferecer um completo inventário de seus bens.

A guerrilha, porém, disse não abrir mão da possibilidade de concorrer a eleições mesmo cumprindo pena e reafirmou que seus membros não devem ir para a cadeia. Esses dois pontos não foram renegociados.

"Esse novo acordo é apenas um retoque ao acordo que foi recusado pelos cidadãos", declarou o Centro Democrático em um comunicado.

O ex-presidente Uribe insiste em dialogar diretamente com a guerrilha, algo que é descartado tanto pelo governo como pelas Farc.

Por meio de seu porta-voz, Ricardo Téllez, as Farc disseram que "nosso interlocutor com o Estado colombiano continua sendo a equipe de negociadores", disse Téllez. "Consideramos a ideia de uma reunião com os uribistas apenas uma manobra para dilatar ainda mais a implementação do acordo, que se encontra num Estado muito frágil."

O governo também teme essa situação irregular. O líder da equipe de negociadores, Humberto de la Calle, disse que, de agora em diante, o texto "não está mais aberto a negociações".

Para os uribistas, a atitude do governo é, além de um desafio à vontade popular, anti-institucional.

O senador e pré-candidato à Presidência em 2018 pelo Centro Democrático, Iván Duque, disse à imprensa local: "Se o governo pretende impor esse acordo sem um consenso nacional, ignorando o resultado de 2 de outubro e tentando usar manobras legislativas, estará desafiando a vontade popular expressa [no referendo]."


Endereço da página: