Folha de S. Paulo


Escassez de reais ameaça comércio na fronteira com a Venezuela

Eduardo Knapp/Folhapress
A caixa de supermercado Iara Siqueira, 21, mostra cesta com 200 mil bolívares (R$ 330) em Pacaraima
A caixa de supermercado Iara Siqueira, 21, mostra cesta com 200 mil bolívares (R$ 330) em Pacaraima

A viagem é longa, com quase 1.400 quilômetros ida e volta, mas foi a solução encontrada pelo geólogo venezuelano Juan Martínez, 28, para pagar as contas de casa.

Ele pega sua caminhonete, deixa Puerto Ordaz a vai a Pacaraima fazer compras de produtos básicos para revender em seu país, especialmente arroz.

Para não correr o risco de ser assaltado –e, também, aproveitar um câmbio melhor– já chega à cidade brasileira com a encomenda paga. Mas, como outros venezuelanos que abandonaram suas profissões para viver como intermediários na venda de alimentos como arroz, feijão e açúcar, teme ter a carga saqueada ao voltar ao seu país.

"Lá não está sendo possível sobreviver, a Venezuela está falida e a única forma é tentar fazer isso", disse ele.

Por um fardo de 30 quilos de arroz de segunda qualidade, paga cerca de R$ 100 e revende a até R$ 130. A viagem longa compensa, pois a gasolina é barata na Venezuela. O medo de ataques faz muitos deles viajarem em comboio.

Eduardo Knapp/Folhapress
Cambista brasileiro troca bolívares por reais em estrada que liga Santa Elena Uairén com Pacaraima
Cambista brasileiro troca bolívares por reais em estrada que liga Santa Elena Uairén com Pacaraima

"A violência cresceu muito em Pacaraima. Até homicídio já teve depois da chegada em massa dos venezuelanos. Outro dia roubaram oito fardos de dinheiro", diz o lojista brasileiro Hélio Dantas.

Na cidade, farmácia, bares e lojas de roupas incluíram alimentos buscados por venezuelanos nas prateleiras.

Há quem atue na Venezuela e abriu negócio no município, como Rabi Barakat, 38. "A avalanche começou há seis meses. Sumiram das lojas lá, apareceram aqui", disse ele.

O estabelecimento, alugado, deve funcionar enquanto o fluxo de venezuelanos for grande como o atual ou até que fique "impossível" converter bolívares por real.

"Acabou o real na cidade, não tem para trocar e, quando a gente acha, está com a cotação muito alta, não compensa." Como seu público é majoritariamente estrangeiro, todos compram com bolívares, o que o obriga a buscar real com cambistas que também passaram a atuar em massa na cidade fronteiriça.

Se, em 2008, segundo comerciantes da cidade, um real valia cinco bolívares, há dois meses a relação passou a ser de um para 350. "E, agora, está acima de 600, até 650, é irreal", disse Barakat.

Num supermercado da cidade, uma caixa estava abarrotada de notas que só fazem volume: representavam pouco mais de R$ 300. No marco da fronteira entre os dois países, a Folha encontrou cerca de dez pessoas trabalhando com câmbio. Todas informais, atuam em média dez horas por dia para amealhar cerca de R$ 2.000 mensais.

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