Folha de S. Paulo


Legislativo dominado por republicanos gera dúvida sobre limites de Trump

Construção de um muro na fronteira com o México, revogação do Obamacare, deportação de 11 milhões de imigrantes, revisão do acordo nuclear com o Irã. Quais dessas propostas polêmicas Donald Trump conseguirá levar adiante em seu governo?

A dúvida movimenta o debate nos EUA diante da incerteza sobre a real eficácia do sistema de freios e contrapesos para Trump, com um Congresso de maioria republicana –52 a 48 no Senado, 239 a 193 na Câmara (com três ainda indefinidos).

Para alguns especialistas, é o tradicional sistema do país, que garante que Legislativo, Executivo ou Judiciário evitem abusos do outro poder, que traz certa tranquilidade sobre o futuro dos EUA a partir de janeiro. Outros consideram que, com os republicanos no controle da Câmara e do Senado, é difícil prever se o novo presidente poderá mesmo ser "contido".

A situação está longe de ser uma exceção –os três antecessores de Trump tiveram, em algum momento de seus dois mandatos, a maioria nas duas Casas no Congresso–, mas é suficiente para elevar ainda mais a tensão.

Trump poderá tomar algumas decisões assim que assumir, sem o aval do Capitólio, como cancelar ordens executivas (espécie de medida provisória) assinadas por Obama. Entre elas, o decreto de 2014 que protege quase 5 milhões de imigrantes ilegais da deportação.

Ele poderia ainda, por ordem executiva, restaurar sanções contra Teerã, colocando em xeque o acordo sobre o programa nuclear iraniano alcançado em 2015.

Muitas de suas propostas, no entanto, precisam da aprovação do Legislativo, como a construção do muro na fronteira, a taxação de empresas que levarem suas operações para outro país e o fim do Obamacare (reforma do sistema de saúde).

Dessas, a que especialistas acreditam ter mais possibilidade de avançar é a revogação do Obamacare, já tentada antes pelos parlamentares, mas vetada por Obama.

"Mesmo que muitos republicanos no Congresso tenham se distanciado de Trump, eles devem apoiar muitos de seus esforços que vão ao encontro de suas visões", diz a especialista Susan Rose-Ackerman, da Universidade Yale.

Para as demais propostas, o próximo presidente lidará com uma maioria republicana menos numerosa que a atual e que, em parte, tem resistência a ele, como o presidente da Câmara, Paul Ryan.

"Com a maioria republicana, espera-se uma relação mais produtiva entre os dois poderes. No entanto, muitos republicanos certamente vão tentar atrasar ou parar propostas suas", afirma Paul Manuel, professor da American University e autor do livro "Checks and Balances" (freios e contrapesos).

Robert Kagan, do Instituto Brookings, entretanto, acredita que o sistema de freios e contrapesos não funcionará com Trump porque não é interessante para o partido, no longo prazo, ir contra seu presidente eleito.

"Os republicanos se alinharão com democratas contra Trump? Fazer isso só contribuiria para uma vitória da oposição, preparando o terreno para ganhos democratas no Congresso em 2018", escreveu ao jornal "The Washington Post".

JUDICIÁRIO

Outro poder fundamental no monitoramento de eventuais abusos de Trump é o Judiciário. A proposta do republicano de barrar a entrada de muçulmanos no país, por exemplo, poderia ser contestada na Justiça como inconstitucional.

Há especialistas, contudo, que temem pela Suprema Corte –já que Trump deverá indicar o substituto do juiz Antonin Scalia, ícone do conservadorismo. Hoje, a Corte está dividida.

Para Paul Manuel, porém, independentemente de sua composição, a Corte evitará que Trump desrespeite "limites constitucionais".

Uma decisão, contudo, não pode ser parada pelos outros dois Poderes: a de os EUA lançarem um ataque nuclear (leia mais abaixo).

Neste caso, o único "freio" possível de Trump viria de assessores ou do alto comando das Forças Armadas ""não para bloqueá-lo, mas para aconselhá-lo sobre uma possível melhor escolha.


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