Folha de S. Paulo


Trump gera dúvidas para a relação entre as duas maiores potências

"A China e os EUA não podem resolver, juntos, todos os problemas do mundo. Mas, sem a China e os EUA, duvido que qualquer um dos nossos problemas globais possam ser resolvidos", disse a então secretária de Estado Hillary Clinton, em 2012, em celebração dos 40 anos da histórica viagem do presidente Richard Nixon (1913-1994) à China.

Desde o discurso da democrata, a China escolheu Xi Jinping como novo presidente, uma figura que centralizou poderes, deu novo gás à ambiciosa política externa chinesa, mas enfrenta um ritmo menos acelerado de crescimento da economia. E, em 2017, os chineses terão uma ampla renovação das lideranças do Partido Comunista.

A despeito da troca de cadeiras e do novo cenário, a avaliação que Hillary fez em 2012 segue atual —mas envolta por incertezas frente à possibilidade da eleição do republicano Donald Trump, de quem se sabe pouco a respeito de planos e projetos para a política externa do país.

"Com o republicano, tudo é possível", resumiu o ex-embaixador americano na China J. Stapleton Roy, em evento no Wilson Center em setembro para discutir o futuro da política dos EUA na Ásia.

E Roy alertou: erros na região podem ter consequências sérias, mencionou, citando a disputa pelas águas do mar do Sul da China, o programa nuclear norte-coreano e a rivalidade estratégica EUA-China.

AFP
A monkey kisses the cardboard cutout of US Presidential candidate Donald Trump during a selection intended to predict the result of the US election, at a park in Changsha, in China's Hunan province on November 3, 2016. The monkey chose Republican candidate Donald Trump.
Macaco 'elege' o novo presidente americano em parque em Changsha, na China, este mês

Durante a campanha de Trump, a China teve destaque em duas esferas. Uma mais político-econômica, quando ele acusou os chineses de serem campeões em manipular a moeda para levar vantagens sobre os americanos —reclamações seguidas da ameaça de aplicar elevada tarifa sobre os produtos da China.

E ao provocar polêmica ao chamar o massacre da Praça da Paz Celestial, pelas forças do governo contra protesto envolvendo estudantes, em 1989, de "um motim" controlado por "um governo forte".

Ainda no tema da Ásia, Trump disse que estaria aberto a que os aliados Japão e Coreia do Sul se armassem nuclearmente para garantir a própria segurança —sem depender da proteção dos Estados Unidos.

"O que ele fala sobre China, Japão e Coreia do Sul não surpreende, integra sua estratégia de insurgência. Ele não tem políticas, mas usa impulsos, atitudes e humores. Se for eleito, seria impossível saber que políticas iria perseguir", afirma Richard C. Bush, pesquisador sênior do Brookings Institution.

Com ele eleito, diz o pesquisador, "existiriam perguntas sobre a confiabilidade dos Estados Unidos como aliado na Coreia do Sul e no Japão".

Andrew Shearer, do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, em inglês) e ex-assessor de primeiros-ministros australianos, diz que Hillary, como secretária de Estado, teve papel relevante na defesa da política do reequilíbrio na Ásia e do fortalecimento das alianças do país na região. A expectativa é que, se eleita, diz ele, ela reafirme esse engajamento.

"Isso inclui não apenas a presença militar futura —vital para a manutenção da estabilidade e prosperidade— mas também o engajamento diplomático e econômico. Acredito que ela vai reagir com mais firmeza quando o comportamento da China se afastar das regras internacionais."

Em palestra promovida pelo Chicago Council on Foreign Affairs, em outubro, Cheng Li, pesquisador sênior do Brookings Intitution, afirmou que via a China dividida em relação ao apoio aos dois candidatos. "Depende da visão de mundo que o chinês tem", disse.

Richard C. Bush fala em "mistura de percepções".

"Mas, no fim das contas, as pessoas responsáveis pela relação entre Estados Unidos e China e pela política externa chinesa querem previsibilidade. E só há um candidato de quem podem tirar isso. Podem não gostar dela totalmente, mas em termos de continuidade há um valor. E Hillary oferece isso."


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