Folha de S. Paulo


Palestra de Hillary a Itaú BBA se transforma em peça de campanha

As declarações da candidata democrata Hillary Clinton a favor do livre comércio numa palestra para o banco Itaú BBA, que se tornaram um tema da campanha presidencial americana, aconteceram em maio de 2013 diante de uma plateia de 500 pessoas no luxuoso Lotte New York Palace Hotel, em Nova York.

O evento, organizado anualmente pelo Itaú BBA, braço de compra de participações em empresas do Itaú, reúne donos e principais executivos das maiores companhias latino-americanas, além de representantes de grandes investidores de Wall Street.

Fechada à imprensa, a conferência de CEOs latino-americanos apresenta um "keynote speaker", uma personalidade do mundo político capaz de atrair um público exigente. Neste ano, por exemplo, os palestrantes foram Jeb Bush, ex-governador da Flórida, e Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central do Brasil.

Segundo e-mails hackeados do chefe de campanha de Hillary, John Podesta, e divulgados pelo site WikiLeaks, a democrata afirmou aos empresários e banqueiros presentes ao encontro que "meu sonho é um mercado comum hemisférico, com comércio aberto e fronteiras abertas, em algum momento no futuro com energia que seja tão verde e sustentável quanto possamos conseguir".

A declaração foi mencionada no terceiro e último debate da campanha americana, na última quarta-feira (19). Questionada pelo mediador Chris Wallace, se de fato sonhava com fronteiras abertas, como disse "a um banco brasileiro", Hillary disse que na ocasião falava apenas de energia sustentável –Trump aproveitou para criticá-la pelo teor da palestra.

Segundo a Folha apurou, a apresentação de Hillary no evento do Itaú foi uma defesa do livre comércio, da desregulamentação dos mercados e da integração das Américas. De acordo com uma pessoa presente, que pediu anonimato, a democrata não disse "nada demais num discurso para aquele público".

Em nota, o Itaú BBA confirmou a contratação de Hillary, mas não fez comentários sobre seu discurso nem sobre o contrato. Segundo a agência Associated Press, ela recebeu pela palestra US$ 225 mil (R$ 711 mil, pela cotação atual).

Para se defender dos ataques de Trump e não perder votos, a candidata democrata vem dizendo que não trabalhará pela aprovação da Parceria Transpacífico no Congresso, um acordo de livre comércio entre os países banhados pelo Pacífico negociado por Barack Obama.

CONTRASTE

A promessa destoa do passado liberal de Hillary, que foi secretária de Estado de Obama. Seu marido, o ex-presidente Bill Clinton, aprovou o Nafta, mercado comum entre EUA, México e Canadá, e lançou as negociações da Alca, que criaria uma área de livre comércio nas Américas, mas não prosperou.

Segundo os e-mails vazados pelo WikiLeaks, Hillary também teve três encontros com executivos do Goldman Sachs. É comum os bancos e grandes empresas contratarem ex-políticos e outros palestrantes importantes para conversar com seus executivos e clientes.

Em uma das reuniões com o Goldman Sachs, Hillary teria dito que tem "ótimas relações" com Wall Street e que culpar os grandes bancos pela crise de 2008 foi uma "simplificação excessiva".

Thomas Friedman, colunista do "New York Times", elogiou o "pragmatismo" de Hillary no discurso ao Itaú e disse que a candidata que aparecia nos e-mails do WikiLeaks era mais preparada para a Presidência dos EUA do que parecia na campanha. Resta saber qual Hillary prevalecerá após as eleições: a protecionista ou a liberal?


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