Folha de S. Paulo


Reação ao 11/9 deflagrou movimento terrorista global, diz especialista

Quinze anos após o 11/9, a ameaça do terrorismo se diversificou, tornou-se mais imprevisível e difícil de ser contida.

A invasão do Iraque, ordenada em 2003 por George W. Bush, permitiu o surgimento da facção terrorista Estado Islâmico (EI), beneficiada depois pela ressaca da Primavera Árabe, em 2011, que mergulhou a Síria e a Líbia no caos.

"A chamada guerra contra o terror deflagrou um movimento extremista global. Não digo que pessoas devam parar de sair de casa, mas a probabilidade de um atentado é bem maior", afirma à Folha Loretta Napoleoni.

Patrick Baz - 9.abr.2003/AFP
Fuzileiro naval americano coloca bandeira em estátua do ditador iraquiano, Saddam Hussein, em Bagdá
Fuzileiro naval americano coloca bandeira em estátua do ditador iraquiano, Saddam Hussein, em Bagdá

Economista, Napoleoni se especializou em rastrear as finanças dos grupos terroristas. Ela estima que a "economia do terrorismo" seja equivalente a 8% do PIB mundial, ou mais de US$ 1,7 trilhão.

Um terço tem origem em negócios legítimos, mas terrorismo e crime estão muito mais "interconectados" hoje que 15 anos atrás, diz ela.

Para Fred Burton, vice-presidente de inteligência da consultoria Stratfor, a coalizão liderada pelos Estados Unidos contra o EI tem conseguido enfraquecer a milícia, e o trabalho de inteligência, diminuído a possibilidade de um ataque estratégico no país.

Consequências do 11 de setembro

O problema, observa, é que a ameaça se pulverizou em pequenos grupos, não necessariamente ligados ao EI ou a outro movimento, mas inspirados por sua ideologia. "Sua rede de apoio e os simpatizantes no mundo todo, principalmente na Europa, são muito difíceis de caçar", diz Burton, que foi agente de contraterrorismo do Departamento de Estado por 14 anos.

Nos EUA e na Europa, a principal preocupação passou a ser terroristas locais, que se falam em pequenos grupos e usam criptografia.

"Nosso trabalho está ficando mais difícil", afirma, durante um evento, Nick Rasmussen, diretor do Centro Nacional de Contraterrorismo.

A explosão de formas de comunicação que terroristas podem usar, com acesso fácil a criptografia, dá a eles "uma vantagem" contra a inteligência dos EUA, reconhece ele.

Menos centralizado em líderes e mais na mensagem, o terrorismo de hoje não depende mais de uma figura como Osama bin Laden, fundador da Al Qaeda, facção responsável pelo 11 de Setembro.

"É um modelo de resistência sem liderança, age globalmente e minimiza o círculo de comunicação, o que diminui a possibilidade de ser detectado", diz Burton.

RESPONSABILIDADE

Voltando às origens do problema, Loretta Napoleoni acha espantoso que não se fale mais na responsabilidade de Bush ao invadir o Iraque.

Uma das decisões fatais foi o desmonte do Exército do ditador iraquiano Saddam Hussein, que colocou milhares de soldados na rua e insuflou o sentimento de ostracismo dos sunitas, aumentando o apoio ao Estado Islâmico.

Para ela, Bush e membros de seu governo deveriam ser julgados "por mentirem ao mundo" ao afirmarem que Saddam tinha ligações com Bin Laden e armas químicas.

Napoleoni diz ainda que Obama, que votou contra a guerra no Iraque, "não foi muito melhor que Bush". Ela cita promessas não cumpridas pelo presidente, como o fechamento de Guantánamo, a volta das tropas ao Iraque e a não intervenção na Síria.

A autora considera que há mais chances de o Oriente Médio ser "pacificado" se Donald Trump vencer a eleição.

Segundo ela, o candidato republicano buscará um acordo com o presidente russo, Vladimir Putin. "Se a [democrata] Hillary [Clinton] vencer, ela vai partir para uma guerra no Oriente Médio", afirma. "Ela é uma belicista."


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