Folha de S. Paulo


Bandeira do 11/9, por muito tempo desaparecida, será exibida em museu

O momento foi capturado em uma fotografia, uma imagem que ficou gravada na memória coletiva do planeta como símbolo de resistência: três bombeiros desfraldando a bandeira dos EUA nas ruínas do World Trade Center em 11 de setembro de 2001.

Pouco depois, aquela bandeira desapareceu. A prefeitura de Nova York tentou localizá-la, sem sucesso. Agora ela foi recuperada, ainda que o mistério não tenha sido totalmente resolvido.

Peter Morgan - 11.set.2001/Reuters
A bandeira americana que aparece nos escombros do World Trade Center ficou desaparecida por anos
A bandeira americana que aparece nos escombros do World Trade Center ficou desaparecida por anos

Na quinta (8), quase 15 anos depois da data em que foi inicialmente desfraldada, a bandeira uma vez mais ocupará posição proeminente no sul de Manhattan, ao ser exibida pelo Museu e Memorial Nacional do 11 de Setembro.

O retorno da bandeira exigiu uma viagem através do continente: ela foi recuperada no Estado de Washington, no noroeste do país.

Em 11 de setembro de 2001, três bombeiros —Billy Eisengrein, George Johnson e Dan McWilliams— retiraram a bandeira e o mastro que a sustentava do Star of America, um iate que estava ancorado na marina North Cove, no rio Hudson.

Thomas Franklin, fotógrafo do "Record", um jornal do norte de Nova Jersey, capturou o momento quando ela foi hasteada no local do ataque.

Depois de passar algum tempo hasteada no local, a bandeira foi desfraldada no Yankee Stadium e em navios de guerra da marinha no Oriente Médio, antes de voltar à prefeitura de Nova York em 2002 —ou era isso que se acreditava.

Mas na verdade a bandeira —autografada pelo governador George Pataki, o prefeito Rudy Giuliani e Michael Bloomberg, entre outros— não era a certa. A bandeira do iate media 1,5 metro por 90 centímetros; a bandeira autografada media 2,4 por 1,5 metros.

O paradeiro da bandeira era desconhecido até o final de 2014, quando o mistério foi tema do primeiro episódio do programa "Brad Meltzer's Lost History", no canal de TV a cabo H2, um canal auxiliar do History Channel.

"Tudo que fizemos foi veicular uma versão moderna de um cartaz de procura-se", disse Meltzer, autor de livros de suspense e histórias infantis, bem como roteirista de televisão. "Colocamos aquela bandeira na TV".

O episódio, que recorreu a um vídeo de baixa qualidade de imagem para mostrar que a bandeira havia desaparecido na noite do ataque terrorista, foi ao ar em 31 de outubro.

Quatro dias depois, um homem com um saco plástico foi a um batalhão de bombeiros em Everett, Washington, e disse que havia assistido ao programa e que acreditava estar de posse da bandeira.

"Ele se apresentou como Brian", disse Mark St. Clair, vice-chefe de operações do Departamento de Polícia de Everett. "Pelo menos é esse o nome que os bombeiros recordam que ele usou".

Brian disse que era fuzileiro naval reformado e que havia combatido no Oriente Médio. Ele ganhou a bandeira, de acordo com o relato que os bombeiros fizeram a St. Clair, de um funcionário da Administração Nacional da Atmosfera e Oceano (NOAA), que por sua vez a havia ganhado da viúva de uma pessoa morta no ataque de 11 de setembro em Nova York.

St. Clair não estava seguro de que os bombeiros estivessem informados sobre a história da bandeira do 11 de setembro, ou soubessem que ela desapareceu.

Mas por respeito à bandeira que lhes foi entregue, eles a removeram de sua adriça, a dobraram e informaram seus superiores. A polícia começou a investigar.

"No começo era só uma bandeira restituída", disse Kim Gilmore, historiador sênior do History Channel. "Foi preciso muito trabalho para determinar se era mesmo a bandeira do 11 de setembro".

St. Clair recolheu imagens de câmeras de segurança nos arredores da estação de bombeiros e divulgou desenhos de Brian preparados pela polícia, em um jornal local, mas o esforço não rendeu resultados. O desenho também não foi reconhecido na NOAA.

DOCUMENTÁRIO

No domingo, que marcará o 15º aniversário dos ataques, o History Channel transmitirá um programa sobre a recuperação da bandeira.

No documentário, John Cutter, que era membro da seção de inteligência da polícia de Nova York e se aposentou como vice-chefe em 2004, expressa dúvidas de que a bandeira tivesse sido dada a alguém por uma viúva.

As bandeiras usadas em sepultamentos tipicamente não portam adriças ou peças metálicas de fixação. "Isso me levou a acreditar que a pessoa tivesse obtido a bandeira de algum outro modo, e estivesse relutante em revelar como", disse Cutter, falando sobre o fuzileiro naval.

Outra figura central no esforço para verificar a autenticidade da bandeira foi Bill Schneck, cientista forense de materiais no Laboratório Criminal da polícia estadual de Washington, antigo funcionário do McCrone Group, uma empresa de testes em Westmont, Illinois, cuja especialidade é a identificação de partículas.

"No caso, comparei a poeira da bandeira a partículas de poeira recolhidas nos dias posteriores ao 11 de setembro e identificadas", disse Schneck.

A poeira era uma mistura de concreto, fibras de vidro, plástico, pedaços derretidos de metal e amianto. "Era o que se poderia definir como uma impressão digital", disse Schneck.

A análise dele sobre as partículas extraídas da bandeira mostrou as mesmas características, em termos de tipo de partículas, que a poeira obtida no local do ataque depois da queda das torres.

Schneck também conduziu uma extensa comparação fotográfica da bandeira obtida em Washington com imagens da bandeira do 11 de setembro capturadas por Franklin e fornecidas pelo "Record".

As duas bandeiras tinham o mesmo tamanho e eram feitas do mesmo material, e as duas tinham uma fivela de latão e aço inoxidável e adriças com nós característicos, envoltos em fita isolante preta.

Entre as pessoas informadas de que a bandeira havia sido localizada estava Shirley Dreifus, que, com o marido Spiros Kopelakis, era dona do Star of America.

"É realmente maravilhoso", disser Dreifus, que vendeu o iate em 2008. "Na verdade, eu uso a palavra 'espantoso'".

Dreifus disse que o fato de que seu marido, morto dois anos atrás, não tenha podido compartilhar da notícia a entristece. "Ele chamava a bandeira de ícone do século", conta Dreifus. "Foi o único símbolo de esperança naquele dia".

Ela e a Chubb, seguradora que pagou indenização pela perda da bandeira, a doaram ao museu do 11 de setembro.

Joseph Daniels, o presidente do museu, disse que "não ter aquela bandeira como parte do museu deixava a sensação de que algo estava faltando. Era um símbolo não só de esperança mas de força. Duas coisas de que precisávamos naquele momento".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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