Folha de S. Paulo


Impeachment de Dilma acirra divisão dos governos do continente

Reuters
O presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, critica o impeachment de Dilma Rousseff, em Caracas
O presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, critica o impeachment de Dilma Rousseff, em Caracas

O processo de impeachment que destituiu nesta quarta (31) Dilma Rousseff acirrou uma esperada divisão dos governos do continente.

Enquanto os EUA afirmaram que o afastamento definitivo da agora ex-presidente seguiu o ordenamento constitucional, os chamados governos bolivarianos –Venezuela, Equador e Bolívia– reagiram convocando seus embaixadores no país.

A resposta a Caracas veio em poucas horas. Em nota, o Itamaraty disse que a atitude venezuelana "nega os princípios e objetivos da integração latino-americana" e convocou o embaixador do Brasil em Caracas, Ruy Pereira, para consultas. Sem alarde, os representantes em Quito e La Paz também foram chamados, apurou a Folha.

CASA BRANCA

A aguardada posição de Washington foi divulgada pelo Departamento de Estado pouco após a votação no Senado. Em comunicado, o governo dos EUA chama de "essencial" a relação bilateral com o Brasil, que diz esperar manter "forte" e avançar em temas de interesse mútuo.

"O Senado brasileiro, de acordo com o ordenamento constitucional do Brasil, votou para remover a presidente Dilma Rousseff do cargo. Estamos confiantes que continuaremos a forte relação bilateral", disse John Kirby, porta-voz do departamento.

Washington elogiou a solidez das instituições brasileiras e reiterou o respeito às regras democráticas. "Como as duas maiores democracias do hemisfério, Brasil e EUA são parceiros comprometidos. Os EUA cooperam com o Brasil para enfrentar temas de interesse mútuo e os desafios urgentes do século."

Em tom similar, o governo da Argentina afirmou em nota que respeita o processo de impeachment e continuará trabalhando pela integração com o "país irmão", respeitando direitos humanos, instituições democráticas e o direito internacional, além de buscar fortalecer o Mercosul.

Desde o início do processo, o presidente Mauricio Macri se mostrou simpático ao governo Temer. Em maio, a Argentina foi o primeiro país a receber José Serra como ministro de Relações Exteriores. Temer deverá visitar Buenos Aires no início de outubro.

A Argentina se tornou aliado crucial na reconfiguração regional que inclui o afastamento dos antigos aliados dos governos Lula e Dilma.

O governo do Chile, por sua vez, se declarou "respeitoso" em relação à decisão do Senado brasileiro.

O presidente do Equador, Rafael Correa, afirmou após a aprovação do impeachment que convocaria seu embaixador no Brasil e chamou o processo de "apologia à traição".

Mais tarde, o governo de Nicolás Maduro repetiu o movimento e foi além, congelando as relações entre Caracas e Brasília e evocando o que chamou de "golpe parlamentar". Maduro expressou "toda a solidariedade" a Dilma.

Pela manhã, o boliviano Evo Morales anunciara que convocaria seu embaixador em Brasília se a petista fosse destituída –promessa cumprida à tarde, após a votação.

As posições são delicadas, pois o Brasil é parceiro-chave dos países bolivarianos, com investimentos nas áreas de construção civil e energia.

Do outro lado do Atlântico, os governos europeus não haviam se manifestado até a publicação desta reportagem.

O embaixador britânico no Brasil, Alex Ellis, apelava a seguidores on-line: "Socorro. Alguém pode me ajudar a explicar a Londres as decisões do Senado sobre não cassação e as consequências?"

Colaboraram MARCELO NINIO, em Washington, e CLÓVIS ROSSI, em São Paulo


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