O Mercosul virou uma entidade fantasma: sem presidência, desde que o Uruguai abandonou a que lhe correspondia, no final de julho, sem fazer a transferência formal para a Venezuela, à qual caberia, pela ordem alfabética.
Argentina, Brasil e Paraguai não aceitam a presidência venezuelana, mas, assim mesmo, Caracas faz de conta que a exerce. Tanto é assim que convocou para esta quarta-feira (24), em Montevidéu, uma reunião dos chamados coordenadores nacionais (os negociadores do grupo).
Os três adversários da Venezuela não compareceram, como anteciparam, mas o representante da Venezuela, Héctor Constant, não se acanhou em convocar a mídia para uma declaração (sem aceitar perguntas) diante de um pequeno cartaz com o logotipo do Mercosul e a inscrição "Presidência".
Nem o coordenador uruguaio, que foi à reunião com o venezuelano e o delegado da Bolívia, em processo de adesão, apareceu para o "comunicado da presidência".
Evitou o vexame de aparecer em uma foto em que, em meio à mais séria crise dos 25 anos do grupo, o venezuelano anunciasse o plano de criar o "Mercosul Musical", usando a experiência bem-sucedida das orquestras infantil e juvenil da Venezuela.
Constant anunciou outras prioridades, como aprofundar contatos com Cuba, China e Rússia, sem se preocupar em saber se os demais sócios têm idêntica prioridade.
A "presidência" venezuelana quer também continuar as negociações com a União Europeia, em busca de um acordo de livre comércio. Aí, sim, coincide com todos os outros quatro sócios.
Só esqueceu de dizer que, para negociar com quem quer seja, é necessária uma presidência aceita por todos os cinco membros plenos, até porque o Tratado de Ouro Preto, que define a estrutura do Mercosul, estabelece que as decisões têm que ser tomadas por consenso.
Ou seja, nem a reunião de terça (23), entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, sem a Venezuela, nem a da quarta, com Venezuela e Uruguai, mas sem os outros três, têm validade -o que faz do Mercosul entidade-fantasma.
Para voltar à vida, depende de o Uruguai aceitar a "gambiarra" proposta pelos três outros (a presidência colegiada até o fim do ano), com a Venezuela na geladeira.
Enquanto isso, prevalece a opinião de Heber Arbuet-Vignali, membro do Conselho Uruguaio para as Relações Internacionais, à Deutsche Welle: "Se os sócios criam armadilhas para eles mesmos, como outros Estados vão confiar nesses países?"
Colaborou LUCIANA DYNIEWICZ, de Buenos Aires