Folha de S. Paulo


Maconha, cassinos e sacolas serão temas de voto nos EUA em novembro

Maconha recreativa pode? E novos cassinos no Estado? Sacolinha plástica é legal? O salário mínimo deve subir (para adultos) ou diminuir (menores aprendizes)? Atores pornô têm de usar camisinha no set de filmagem?

No dia 8 de novembro, quando americanos forem às urnas, haverá mais em jogo do que decidir entre Hillary Clinton ou Donald Trump para a Presidência do país e qual será a cara do próximo Congresso americano.

As medidas acima norteiam alguns dos 135 plebiscitos que aparecerão dispersos nas cédulas de 34 Estados e do Distrito de Colúmbia (onde fica Washington), junto com as opções para presidente, governador, senador e deputados.

A legalização da maconha lidera o número de consultas populares –é tema no pleito de nove Estados. O mais populoso do país, a Califórnia, vota o uso recreativo da erva 44 anos depois de ouvir sua população pela primeira vez sobre o assunto.

Em 1972, dois terços dos californianos rejeitaram o movimento "legalize já". Em 1996, o Estado aprovou a Lei do Uso Piedoso, liberando a maconha para tratamento de doenças como o câncer.

Californianos rejeitaram tentativas de permitir o consumo também para diversão, o que hoje só é legal em quatro Estados (Colorado, Washington, Alasca e Oregon).

A última campanha derrotada, de seis anos atrás, teve apoio do bilionário George Soros. Associações como Narcóticos Anônimos e o governador na época, Arnold Schwarzenegger, eram contra. O "não" ganhou por 53,5%.

Diretor da Organização Nacional pela Reforma das Leis de Maconha (Norml), Paul Armentano diz à Folha que a legalização em massa nos EUA daria "barato" tributário.

"A taxação sobre o comércio da erva e de produtos feitos com ela, de algodão doce a gel para gatos, renderia US$ 28 bilhões [R$ 88 bilhões]." O dado é da Tax Foundation, think-tank que não faz lobby pela causa.

CONSULTAS

A Califórnia também será responsável por dois plebiscitos pioneiros: referendar uma lei para proibir as sacolas plásticas de mercados e farmácias e elevar em US$ 2 o imposto sobre cigarro no Estado, onde um maço custa em média US$ 6 (R$ 19).

Outra consulta propõe a imposição da camisinha na indústria pornô, já aprovada na cidade de Los Angeles.

A coalizão Californianos Contra a Perseguição no Trabalho é contra: a iniciativa criaria uma "cultura do medo" perigosa, com janela para extorquir sobretudo pequenos produtores.

Três Estados (Colorado, Washington e Maine) vão opinar sobre o aumento do salário mínimo, que varia de Estado para Estado –o piso nacional é de US$ 7,25 (R$ 23) a hora, equivalente a cerca de R$ 3.600 por mês.

Os plebiscitos nas eleições dos EUA

Na contramão vem a Dakota do Sul, que decide se diminui de US$ 8,50 para US$ 7,50 a remuneração para menores de 18 anos. O Colorado vai decidir ainda se derruba uma lei estadual que faz uma exceção ao veto à escravidão: hoje, réus condenados à prisão podem trabalhar sem qualquer tipo de ordenado.

Enquanto muitos plebiscitos mobilizam temas nacionais, como maior controle para venda de armas, outros pinçam questões locais. Indiana e Kansas, por exemplo, sondarão sobre incluir na Constituição "o direito de caçar, pescar e aprisionar a vida selvagem", que seria expressão da cultura do lugar.

RUMO DAS ELEIÇÕES

Mais do que deliberar sobre interesses estaduais, plebiscitos podem mudar o rumo de uma eleição, "sobretudo se o tema for de grande relevância para os eleitores", diz Matthew Baum, analista político da Universidade Harvard, à Folha.

Num país onde o voto é facultativo, cada eleitor a mais pode fazer a diferença.

Alguém pode não se animar a sair de casa para votar em Hillary Clinton e Donald Trump, com recordes de rejeição, ou em políticos em geral, dado o cansaço americano com seus representantes.

Já outras causas podem os motivar, afirma Jeff Horwitt, vice-presidente do instituto de pesquisas Hart. E em 2016 entram em jogo temas que eletrizam o eleitorado -a legalização da maconha pode mobilizar principalmente jovens, turma mais propensa a deixar o voto para lá.

Em 2012, ano da reeleição de Barack Obama, foram às urnas 58% do eleitorado apto a votar (maior de idade e com cidadania americana). Na turma de 18 a 24 anos, a participação caiu para 38%, enquanto 70% dos cidadãos acima de 65 votaram, segundo o Censo do país.

Nos últimos 25 anos, Estados que incluíram plebiscitos nas eleições presidenciais registraram cabines de votação até 1% mais visitadas -e qualquer migalha pode fazer a diferença em pleitos disputados como o de 2000, entre o republicano George W. Bush e o democrata Al Gore.

O levantamento foi feito pelo Estudo do Centro de Estratégias para Iniciativas nas Cédulas, que ajuda a inserir plebiscitos nos ciclos eleitorais (só uma parte dos Estados permite o processo).

Segundo Horwitt, a leva de plebiscitos deste ano está mais "progressista e cabeça aberta" e pode forçar a entrada de debates sobre salário mínimo e legalização da maconha na agenda nacional.

Não é sempre assim. Entre as tendências em voga na década passada, estavam iniciativas para proibir o casamento gay -até a Suprema Corte decidir, em 2015, liberar a união.


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