Folha de S. Paulo


Mercosul definirá 'medidas jurídicas' contra Caracas por descumprir normas

Carlos Lebrato - 3.fev.2016/Anadolu Agency/Getty Images
MONTEVIDO, URUGUAY - FEBRUARY 3: A general view of the building where the meeting of Ministers of Health of the Southern Common Market (Mercosur) and Community of Latin American and Caribbean States took place in order to discuss the advance of the Zika virus in the Latin America, in Montevideo, Uruguay, on February 3, 2016. The ministers met to exchange scientific findings and coordinate countermeasures. (Photo by Carlos Lebrato/Anadolu Agency/Getty Images) ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Entrada do prédio que abriga a sede do Mercosul, em Montevidéu, no Uruguai

O governo brasileiro afirmou, em nota do Itamaraty divulgada neste sábado (13), que os "membros-fundadores do Mercosul [Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai] terão diante de si a complexa tarefa de definir as medidas jurídicas aplicáveis" contra a Venezuela, pelo fato de não ter cumprido todas as exigências necessárias para se incorporar ao bloco como membro pleno.

O prazo para o país se adequar às regras venceu às 23h59 de sexta.

O Paraguai adotou a mesma postura e enviou uma carta a seus parceiros do bloco em que pede, pela falta de respeito às normas, uma revisão jurídica da situação.

Por não cumprir as exigências, a Venezuela poderá ser "rebaixada" no grupo. "O país pode deixar [de ser um membro pleno], mas isso será analisado nos próximos dias", disse à Folha o ministro de Relações Exteriores do Paraguai, Eladio Loizaga.

Segundo o comunicado do Itamaraty, "nos próximos dias o governo brasileiro avaliará a situação detidamente, à luz do direito internacional, e manterá a devida coordenação com os demais Estados".

Entre os tratados que não foram incorporados no sistema de leis da Venezuela, o Brasil cita o Protocolo de Assunção, que estabelece o compromisso com direitos humanos, e o Acordo de Complementação Econômica 18, que estabelece as normas de integração dos mercados do bloco.

A não adequação venezuelana às exigências é um dos argumentos utilizados por Brasília, Assunção e Buenos Aires para que o governo de Nicolás Maduro não assuma a Presidência rotativa do bloco. O comando do grupo caberia à Venezuela neste semestre, já que a liderança muda a cada seis meses por ordem alfabética.

Os outros países do Cone Sul também não respeitam todas as regras, mas o chanceler Loizaga afirmou que elas "estão em processo de incorporação".

O Mercosul está sem um líder há 15 dias, desde que o Uruguai (único país que defende a Venezuela) deu por encerrado seu período na Presidência.

RETALIAÇÃO
Na carta do Paraguai, Loizaga diz que seu país já foi submetido a episódios "injustose ilegais", em referência ao fato de ter sido suspenso do Mercosul em 2012 após o presidente Fernando Lugo sofrer impeachment em menos de 48 horas, em um processo considerado ilegítimo.

"A República do Paraguai, apesar dos acontecimentos a que foi submetida (...) por exercer dispositivos constitucionais, sempre conservou sua vocação de integração, baseada em um profundo compromisso com os postulados de fundação do Mercosul."

Loizaga disse à Folha que a posição de seu país não é de vingança pelo ocorrido em 2012. "Se fosse revanche, o Paraguai não teria aprovado posteriormente a participação da Venezuela no bloco."

Foi no período em que o Paraguai esteve suspenso que a Venezuela integrou ao grupo.

Questionado sobre possíveis influências ideológicas na decisão de rever a situação venezuelana, o chanceler afirmou que elas são inexistentes.

"Houve [ideologia] por muito tempo. Nos últimos dez anos, o Mercosul havia se tornado um grupo político e deixado de lado a questão comercial. Agora o que interessa é o cumprimento do direito."

O ministro acrescentou que seu país tem uma política soberana, em resposta ao governo venezuelano, que afirma sofrer um golpe de Brasília, Buenos Aires e Assunção, mas articulado pelos Estados Unidos.

A crise no grupo se arrasta há alguns meses porque Paraguai, Brasil e Argentina se opõem a Maduro com a justificativa de que seu governo não respeita direitos humanos, mantendo presos políticos de oposição.

Enquanto não tiver um líder, o Mercosul poderá ter suas negociações internacionais com terceiros atrasadas, a implementação de acordos firmados com outros países congeladas e não fechar novas parcerias.

Decisões operacionais de comércio exterior, como reduções de tarifas, com impactos no setor privado, também poderão ser adiadas.


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