Folha de S. Paulo


Hillary Clinton e Donald Trump se unem contra Parceria Transpacífico

Mandel Ngan/AFP
Participantes da Convenção Democrata levantam cartazes contra a Parceria Transpacífico na Filadélfia
Participantes da Convenção Democrata levantam cartazes contra a Parceria Transpacífico na Filadélfia

Ele tem 30 capítulos, mais de 2.000 páginas e pouca gente o leu. Mesmo assim, tornou-se um dos maiores vilões da campanha presidencial dos Estados Unidos, e sua rejeição é um dos únicos pontos comuns entre os dois principais candidatos, Hillary Clinton e Donald Trump.

Assinada em outubro de 2015 por EUA, Japão e outros dez países, a Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês) é o maior acordo comercial da história, abrangendo 40% do PIB (Produto Interno Bruto) mundial.

O governo do atual presidente, Barack Obama, o considera peça central de sua estratégia geopolítica na Ásia, mas os opositores ao acordo apontam perigos para a soberania e afirmam que ele custará empregos nos EUA.

O repúdio ao TPP segue a onda protecionista observada em vários países, em meio a um retorno do sentimento contra o livre comércio e a globalização como não se via desde a virada do século.

Com suas críticas, os principais concorrentes à Presidência inflamaram esse espírito, diz o economista Bryan Caplan, autor do bestseller "O Mito do Eleitor Racional".

Sua tese, em resumo, é que frequentemente os eleitores votam contra seus próprios interesses não apenas por ignorância, mas por sentimentos irracionais, como preconceitos. Sobrou para o TPP.

"A retórica protecionista é muito comum em anos eleitorais, porque os eleitores dos EUA, como em todos os países, são protecionistas no coração", disse Caplan à Folha.

Editoria de Arte/Folhapress

Nos protestos na Filadélfia, cartazes contra o TPP estavam entre os mais numerosos, inclusive na Convenção Democrata. Foi neste cenário que discursou Obama, que tenta aprovar o pacto antes de deixar o cargo, em janeiro.

Para entrar em vigor, o TPP precisa ser ratificado por países que representam ao menos 85% do PIB total dos signatários. Sem os EUA, que tem 60%, a conta não fecha.

Diante da gritaria geral, porém, o acordo "está morto" no Congresso até o fim do governo Obama, reconheceu o senador democrata Chris Coons. E corre risco de não ressuscitar, já que seus dois possíveis sucessores não nutrem simpatia pelo pacto.

Mais do que uma derrota econômica para Obama, o enterro do TPP no Congresso é um golpe no coração do "pivô para a Ásia", sua política de foco no continente para conter o avanço da China."A segurança nacional é o principal argumento de Obama em defesa do TPP", diz Coons.

Hillary foi uma das artífices do foco asiático quando estava no governo Obama e apoiava o TPP, mas mudou de ideia já na campanha, alegando que "não atendia aos padrões" que esperava para proteger empregos nos EUA.

Foi uma das posições em que ela se aproximou de seu adversário nas prévias, o senador Bernie Sanders.

Um dos críticos mais ferrenhos, ele considera que, além da fuga de empregos, o acordo atingiria a soberania do país, por permitir que empresas processem governos em cortes internacionais.

DEFESA

Membros do governo afirmam que os inimigos do acordo fazem dele um bode expiatório e usam exemplos para espalhar um medo irracional.

Acrescentam que este tipo de cláusula está em mais de 3.000 tratados comerciais ao redor do mundo, dos quais os EUA são signatários de 51.

Justificado ou não, o medo contagiou boa parte dos eleitores, principalmente seguidores de Sanders como o aposentado Bill Safford, 67, que usava um bottom anti-TPP.

"É mais uma jogada das empresas para ferrar com os trabalhadores", disse ele, que admitiu não ter lido o acordo.

O alegado risco de eliminar milhares de empregos é também um tema fixo do republicano Donald Trump, que passou os últimos meses demonizando o TPP.

O medo não tem fundamento, aponta um estudo do Instituto Peterson de Economia Internacional, em Washington. Não haveria nem perda nem ganho de empregos, diz, mas as exportações cresceriam 9,1%, e o PIB teria acréscimo de 0,5% por ano.


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