Folha de S. Paulo


Juíza da Suprema Corte dos EUA ataca Trump e é criticada dos dois lados

Na mesma semana, a mais velha juíza da Suprema Corte dos EUA, Ruth Bader Ginsburg, 83, deu três entrevistas em que fulminou o virtual presidenciável republicano, Donald Trump.

Em declarações para Associated Press, "New York Times" e CNN, ela o chamou de "farsa" e sorriu ao especular a reação do marido, já morto, ao "presidente Trump": "Agora é hora de nos mudarmos para a Nova Zelândia".

Ginsburg recebeu críticas, da direita à esquerda, ao quebrar o tradicional distanciamento que os juízes do equivalente americano ao Supremo Tribunal Federal mantêm das eleições.

Trump sugeriu na quarta (13) que ela renunciasse após "constranger a todos com comentários bem imbecis".

Até o senador Ted Cruz (Texas), com quem o magnata ainda não se reconciliou após um virulento embate nas prévias republicanas, considerou "perigoso" que "juízes não eleitos tentem impor suas visões políticas".

Partidários de Hillary Clinton temem que a posição de Ginsburg amoleça eleitores reticentes a Trump, que prefeririam engoli-lo para evitar um Judiciário à esquerda.

Democratas se esquivaram de comentar o episódio; o porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, limitou-se a dizer que Ginsburg "não ganhou o apelido de 'A Notória RBG' [suas iniciais] à toa".

O "New York Times", que apoia abertamente a democrata Hillary Clinton, publicou na quarta um editorial intitulado "Trump está certo sobre Ginsburg".

O jornal lembra que George W. Bush só venceu após a Suprema Corte ordenar que a Flórida parasse de recontar seus votos ""a vantagem do republicano sobre o democrata Al Gore no Estado era de 537 votos. "Imagine se fosse 2000. Alguém poderia argumentar, a sério, que o único guia de Ginsburg seria a lei?"

DESEQUILÍBRIO

Ginsburg tocou num nervo deste pleito: o próximo presidente tem "validade" de oito anos, se reeleito, mas poderá redefinir por décadas a corte ""de onde saem decisões que impactam gerações, como a queda de restrições ao aborto neste ano e a liberação do casamento gay, em 2015.

Cabe ao presidente nomear um novo juiz, e o Congresso deve ratificá-lo.

Três dos oito atuais membros beiram a idade média de aposentadoria na Corte: 78,7 anos, segundo estudo de Harvard. Ginsburg, que já superou cânceres no pâncreas e no útero, é a mais velha.

Há uma vaga vazia, a de Antonin Scalia, morto em fevereiro, aos 79. Republicanos no Senado se recusam a chancelar o nome de Merrick Garland, proposto pelo presidente Barack Obama.

O partido torce por um triunfo de Trump, que então apontaria alguém mais conservador para o cargo vitalício. Em maio, ele teve raro consenso na legenda ao divulgar 11 potenciais nomes.

As posições progressistas da juíza nunca foram segredo. Antes de ser escolhida por Bill Clinton, em 1993, ela ganhou várias causas feministas na Suprema Corte, como advogada.

Scalia era um contraponto conservador: indicado por Ronald Reagan nos anos 1980, escreveu em 1996 que a homossexualidade pode ser tão repreensível quanto "assassinato, poligamia ou crueldade a animais".

O decano da Corte, Anthony Kennedy, 79, também da era Reagan, é o fiel da balança, sem inclinação ideológica preponderante.

"Essa liberdade não mais será negada", escreveu ao autorizar o matrimônio gay. No entanto, foi a favor de expulsar homossexuais de grupos escoteiros 15 anos antes.

Se Trump vencer, o tribunal ficará refém do conservadorismo, diz Ginsburg. "Para o país, podem ser quatro anos. Para a Corte"¦ não quero nem imaginar."


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