Folha de S. Paulo


Obama dividirá ataques a Trump com Hillary na corrida à Casa Branca

Na campanha presidencial, Hillary Clinton gosta de exibir o marido e ex-presidente, Bill Clinton, como sua "arma não tão secreta". Mas é o atual presidente que tem munição para fazer a diferença e ajudar a virtual candidata democrata a derrotar Donald Trump na corrida à Casa Branca.

Barack Obama já manifestou publicamente seu apoio a Hillary e nesta terça-feira (5) fará sua primeira aparição num comício dela, assumindo um papel ativo na campanha que poucos de seus antecessores tiveram.

Com a popularidade em alta (51% segundo o Gallup), principalmente entre eleitores democratas, Obama tem uma coalizão forte o suficiente para exercer influência decisiva na eleição de 8 de novembro, diz o estrategista político Jim Manley, que trabalhou 20 anos como assessor de senadores democratas.

"É muito simples: se o presidente despertar a mesma reação intensa nos eleitores que o fez ser eleito duas vezes —em particular entre mulheres e minorias—, Hillary está garantida como próxima presidente", afirma. "No fim das contas, é só matemática."

A recuperação da economia e a alta nos índices de aprovação deixam Obama mais à vontade para ser ativo na campanha, movido por um óbvio interesse pessoal.

Na reta final de oito anos na Casa Branca, o foco do democrata é defender seu legado. A vitória de Trump, virtual candidato republicano, poria em risco algumas das principais ações de seu governo, como a reforma do sistema de saúde e o acordo nuclear com o Irã.

A julgar por seus comentários até agora, um dos papéis de Obama será dividir com Hillary o "trabalho sujo", ou seja, os ataques a Trump.

Ele já mostrou "que gosta de bater" no magnata, diz Manley. O estrategista não tem dúvida de que Obama "achará um jeito de dar nos nervos de Trump" sem ferir o decoro presidencial.

Antes do anúncio oficial de que apoia Hillary, o presidente já ensaiava alguns golpes em Trump, alternando deboche com advertências sobre o perigo da retórica isolacionista do bilionário.

Na última quarta (29), pediu a palavra numa entrevista no Canadá e falou seis minutos sobre o erro em chamar o discurso do rival de populista, sem precisar mencionar o nome de Trump. "Isso é nativismo, xenofobia, ou pior. Ou é simplesmente cinismo."

Alguns preveem uma reedição de embates mais antigos. No primeiro mandato de Obama, Trump alimentou os rumores de que o democrata teria nascido no exterior, e que portanto não poderia ser presidente.

A campanha forçou o governo a exibir a certidão de nascimento no Havaí. Obama deu o troco com humor, no tradicional número de "stand-up comedy" do jantar anual dos jornalistas da Casa Branca.

"Ninguém está mais interessado em deixar essa história da certidão para trás do que o Donald", disse Obama, com o magnata presente. "Agora ele pode se ocupar de coisas importantes, como a fraude da viagem à Lua".

Com aprovação acima de 50% pela primeira vez desde 2013, Obama tem terreno para ser cabo eleitoral e destoar dos últimos presidentes, que tiveram participação discreta na campanha pela sucessão.

George W. Bush, seu antecessor, deixava de herança duas guerras e uma crise financeira global. Não tinha capital político para compartilhar. Em 2000, o vice Al Gore se distanciou de Bill Clinton na campanha à Casa Branca temendo respingos do escândalo Monica Lewinsky.

Gore perdeu para Bush e muitos consideram ter sido um grande erro a ausência de Clinton, que saiu da Casa Branca com taxa de aprovação acima de 60%, uma das mais altas da história.

DE RIVAIS A AMIGOS

No ritmo da campanha, Obama e Hillary agora se apresentam como velhos amigos, mas nem sempre foi assim. Os dois foram rivais na primária democrata de 2008 vencida por Obama e depois passaram a jogar no mesmo time, quando o presidente a nomeou chanceler (2009-2013).

"Obama a pôs no gelo. Como secretária de Estado ela não podia desafiá-lo", diz Jon-Christopher Bua, analista do Talk Media News e Euronews para a Casa Branca.

Apesar da relação "complicada" entre os dois, há uma conjunção de interesses que tornam a parceria natural, afirma. "Eles estão em acordo sobre a maioria dos temas domésticos e internacionais."

Uma das funções táticas de Obama será ajudar Hillary a vencer nos Estados pêndulo, nos quais nenhum dos partidos tem a preferência garantida do eleitorado.

Não à toa, a primeira aparição de Obama no palanque de Hillary será num deles, a Carolina do Norte, na terça (5). Em 2008 Obama venceu John McCain ali. Quatro anos depois, porém, perdeu no Estado para Mitt Romney.


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