Folha de S. Paulo


Hillary falhou em proteger americanos em Benghazi, diz relatório da Câmara

Após consumir 26 meses de trabalho e US$ 7 milhões de orçamento, um comitê na Câmara americana divulgou nesta terça (28) seu relatório final sobre os ataques que mataram quatro americanos em Benghazi (Líbia), em 11 de setembro de 2012, entre eles o embaixador Christopher Stevens.

O documento pode servir de munição contra Hillary Clinton, a virtual candidata democrata à Casa Branca, à época responsável pela diplomacia dos EUA no governo Barack Obama.

O painel elenca "novas revelações" sobre o caso, após bateria de entrevistas com mais de cem oficiais do governo. Elas, contudo, não trazem novidades sobre a atuação de Hillary como chanceler.

Controlado por deputados republicanos, o comitê concluiu que o Departamento de Estado, então sob chefia de Hillary, falhou em proteger os conterrâneos.

A democrata afirmou que "é hora de olhar para a frente". Em outubro de 2015, já em campanha para se tornar a candidata de sua legenda, ela depôs no Congresso.

"Como disse no meu testemunho de 11 horas, ninguém pensou mais sobre isso ou perdeu tanto sono sobre as vidas perdidas, de quatro americanos, o que é devastador", afirmou após a liberação do documento.

Sua campanha divulgou nota em que acusa o chefe do comitê de "politizar" o episódio para atingir a administração de Obama e a candidatura de Hillary.

Em comunicado, o Departamento de Estado minimiza as descobertas do comitê. "Todos os fatos essenciais sobre os ataques de 2012 em Benghazi já são conhecidos faz tempo."

O relatório questiona a reação do governo, considerada lenta e ineficaz.

Apesar de ordens do presidente e do secretário de Defesa no momento, Leon Panetta, nenhum ativo militar estava a caminho de Benghazi "quando os dois últimos americanos foram mortos, quase oito horas após o início dos ataques", diz o arquivo.

Enquanto o embaixador Stevens já havia desaparecido, a Casa Branca convocou uma reunião que durou cerca de duas horas. Nela, oficiais teriam pautado suas ações a partir de um vídeo no YouTube mostrando uma turba inflamada, como se as mortes fossem decorrência de uma revolta popular (o que se provou incorreto).

Um oficial de alta patente, "que tipicamente teria participado do encontro", não o fez "porque foi para casa para ser anfitrião num jantar para autoridades estrangeiras", ressalta o texto.

Jason Reed/Reuters
A então secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton durante depoimento sobre Benghazi, em 2013
A então secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton durante depoimento sobre Benghazi, em 2013

PARTIDARISMO

O comitê foi liderado pelo deputado Trey Gowdy, um republicano da Carolina do Sul.

Em comunicado, ele fez um apelo para que os americanos tirassem suas próprias conclusões sobre o calhamaço de 800 páginas, que poderia seria lido "num tempo menor do que nossos cidadãos [aguentaram] sob fogo, lutando por suas vidas em telhados e ruas de Benghazi".

Os democratas acusam seus rivais partidários de usar o caso contra Hillary. Seu provável adversário republicano em novembro, Donald Trump, já explorou o episódio várias vezes para atacá-la.

Na semana passada, lançou o site LyingCrookedHillary (Hillary trapaceira e mentirosa). Um dos textos a acusa de ter mentido para as famílias das vítimas americanas quando já estava ciente de que o episódio foi um atentado terrorista.

Esam Omran Al-Fetori/Reuters
Manifestante em frente ao consulado dos EUA em Benghazi, em chamas, no dia do atentado
Manifestante em frente ao consulado dos EUA em Benghazi, em chamas, no dia do atentado

"Ela ficou na frente dos caixões cobertos com a bandeira de quatro americanos que morreram servindo seu país e vendeu a mentira de que a culpa era do vídeo [no YouTube, com motim popular]."

Trump repetiu em vários discursos que a então chanceler americana dormia, "e assim permaneceu", quando telefonaram às 3h para avisar do ataque letal na Líbia, deixando o embaixador "indefeso para morrer".

TOM MODERADO

O relatório do comitê parlamentar, contudo, ficou um tom político abaixo.

Apesar de criticar a falta de preparo e a demora do governo em reagir, não contesta, por exemplo, o fato de que forças americanas na Europa não teriam tempo hábil para alcançar a Líbia e resgatar os americanos. Isso era uma peça central em argumentações prévias.

Segundo a minoria democrata do comitê, testemunhas afirmaram que o foco da reunião na Casa Branca –que reuniu do Pentagono à CIA, em teleconferência– foi garantir a segurança dos americanos em Benghazi.

O almirante Kurt Tidd, um dos participantes, disse ao Congresso que eles saíram daquela reunião com a seguinte conclusão: "Mandem todas [as forças disponíveis]". Elas, contudo, "nunca saíram do chão", afirma o comitê.

A gestão Obama é acusada de dificultar a investigação, retendo testemunhas e evidências.

ATAQUE

Deputados mais à direita na Casa, insatisfeitos com o relatório final, escreveram um adendo de 48 páginas em que elevaram o tom crítico contra a Presidência.

O documento lembra que a corrida presidencial de 2012, na qual Obama conquistou seu segundo mandato, aconteceria 56 dias depois daquele 11 de setembro.

Hillary já sabia que as mortes em Benghazi foram um ataque terrorista, e mesmo assim dissimulou, segundo os republicanos Jim Jordan (Ohio) e Mark Pompeo (Kansas).

"Em vez de contar a verdade para o povo americano e aumentar a chance de perder a eleição, a administração contou uma história em privado e, publicamente, outra diferente."


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