Folha de S. Paulo


A um mês do referendo, britânicos estão divididos sobre ficar na UE

Aberystwyth é uma tranquila cidade universitária à beira-mar, no extremo oeste do Reino Unido. Romford faz parte da grande Londres e é o centro comercial de uma área suburbana, localizada bem mais ao leste.

A maioria dos moradores das duas cidades também diz estar em lados opostos, ao menos quando o assunto é o "Brexit", a saída dos britânicos da União Europeia.

Tão dividido quanto as duas cidades está o Reino Unido, que vai decidir, por meio de um referendo marcado para 23 de junho, se permanece no bloco ou o abandona.

Fernanda Odilla/Folhapress
O estudante James Clegg, 21, faz campanha pela permanência na UE em Aberystwyth
O estudante James Clegg, 21, faz campanha pela permanência na UE em Aberystwyth

Aberystwyth é a principal cidade de Ceredigion, área com o maior número de pessoas em todo Reino Unido que afirma querer ficar no bloco europeu, segundo apontou uma pesquisa feita com mais de 80 mil pessoas pelo instituto YouGov.

A região, que fica no País de Gales, já recebeu £1,3 bilhão (cerca de R$ 7 bilhões) da União Europeia (UE) em quatro anos. Também atrai muitos estudantes, entre eles europeus, que frequentam a universidade em Aberystwyth. São jovens que nasceram e cresceram participando do mercado comum e do livre trânsito de cidadãos nos países do bloco, hoje com 28 países-membros.

"Gales sabe que está mais bem representado como parte da União Europeia do que se depender apenas de Londres. Sem o bloco, os problemas dessa região, que é uma das mais pobres do Reino Unido, serão ainda maiores ", afirma o estudante franco-britânico Jean François-Poncet, 21. Ele lançou a própria campanha contra o "Brexit" e organizou um debate na universidade de Aberystwyth.

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Futuro do Reino Unido na UE

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Romford, por sua vez, é o centro administrativo e comercial do condado inglês de Havering, que se destaca entre as áreas onde mais se defende sair da UE, conforme a mesma pesquisa.

Os moradores de Romford, em sua maioria de perfil mais conservador, dizem se preocupar com a demora em conseguir uma casa do governo, o aumento no número de mendigos nas ruas e a falta de emprego. Todos esses problemas, na maioria das vezes, são associados à presença de imigrantes europeus, que já somam 3 milhões no país de 64,6 milhões de habitantes.

"Por que esta região quer sair? Já olhou quantos mendigos e desempregados há nesta região? Não sou contra imigrantes, mas, como está, é ruim para nós e para eles", diz o aposentado Alan Goodwing, 67, enquanto descansa em uma praça em Romford.

CAMPANHA

As pesquisas de opinião indicam empate técnico entre os favoráveis e os contrários ao "Brexit".

Ainda assim, as preferências declaradas dos britânicos podem não indicar com precisão o resultado final.

A participação no referendo não é obrigatória e, além dos britânicos, podem votar irlandeses e cidadãos do Commonwealth (a comunidade de 53 nações independentes associadas à Coroa Britânica) que vivem no país.

Fernanda Odilla/Folhapress
Eleitores pró-'Brexit' fazem campanha nas ruas de Aberystwyth
Eleitores pró-'Brexit' fazem campanha nas ruas de Aberystwyth

Temendo que a fama pró-UE de Aberystwyth afaste os eleitores das cédulas, o estudante James Clegg, 21, vestiu a camisa do "fica" e passa todas as manhãs de sábados nas ruas. Ele informa os indecisos e ressalta a importância de votar aos que querem continuar no bloco.

"Não queremos que as pessoas votem por intuição, mas não basta ter uma opinião. Tem que ir lá e expressá-la", diz o estudante.

A maior parte dos voluntários que se juntaram a Clegg tem, assim como ele, dupla cidadania ou passou uma temporada em outro país da Europa.

Eles montaram uma mesa cheia de panfletos sob a bandeira estrelada do bloco europeu no centro de Aberystwyth em março.

Editoria de arte/Folhapress

Foi uma reação à iniciativa dos estudantes Andrew Wilnot, 21, e Cameron Roberts, 20, que aderiam oficialmente à campanha "Deixe à UE" e foram para a rua um mês antes dos adversários.

"Estamos aqui porque as pessoas ainda não foram expostas a informações sobre os impactos negativos de permanecer na UE", explica Wilnot, enquanto organiza os folhetos que dizem que fazendeiros vão ficar melhor se deixarem o bloco e que pedem para as pessoas ajudarem a "proteger" o hospital local.

Assim, numa movimentada esquina do centro comercial da cidade, os dois grupos fazem campanha a menos de dez metros um do outro. Não há insulto, agressão nem provocação. Não raro moradores param nas duas mesas e passam um longo tempo fazendo perguntas, debatendo ou simplesmente opinando.

Do outro lado da ilha, em Romford, não há campanha nem cartaz nas ruas. Mas os moradores estão acompanhando o debate.

O comerciante Denis Smith reclama que é difícil conseguir informação confiável sobre os reais impactos para a economia, os serviços públicos e a segurança do Reino Unido nos dois cenários.

"Não acredito nos políticos. Parece o bug do milênio: estão prevendo cenários terríveis, mas tudo não passa de aposta", diz Smith, que há 30 tem uma loja de equipamento fotográfico em Romford.

Ele diz acreditar que o Reino Unido pode tentar ser "um Canadá", negociando melhores tarifas e abrindo mercados, se votar pela saída.


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