Folha de S. Paulo


Maduro dá mais poder a militares na comercialização de alimentos

Em meio a uma espiral de caos e desabastecimento na Venezuela, o presidente Nicolás Maduro ordenou ampliar o poder dos militares no sistema de distribuição de alimentos e produtos básicos.

A decisão é parte de um controverso decreto de estado de exceção e emergência econômica, publicado nesta segunda-feira (16), no Diário Oficial do país, sob a justifica de que a Venezuela enfrenta "ameaças externas".

Xinhua
Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, cumprimenta apoiadores em comício no centro de Caracas
Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, cumprimenta apoiadores em comício no centro de Caracas

O decreto foi anunciado por Maduro na sexta (13), mas o seu teor era desconhecido.

A medida já está em vigor, por um período de 60 dias, mas o Executivo, conforme estipulado na lei, a submeteu à Assembleia Nacional, que tem oito dias para avaliá-la.

Como a rejeição da medida pelo Legislativo é dada como certa, diante da ampla maioria opositora no Parlamento, Maduro busca amparo do Tribunal Supremo de Justiça (a corte suprema), alinhado ao chavismo, que deverá, sem surpresa, validá-la.

O texto oficializa algo que já é realidade: o crescente controle dos militares sobre o comércio de alimentos subsidiados, que movimenta grandes somas de dinheiro e é elemento central dos programas sociais chavistas.

O decreto determina que a Força Armada Nacional Bolivariana e outros órgãos de segurança sejam incumbidos de "garantir a correta distribuição e comercialização de alimentos e produtos de primeira necessidade". Segundo publicado no Diário Oficial, a "vigilância" do acesso a bens e serviços estará a cargo das Forças Armadas.

EM BUSCA DA LEALDADE

Críticos consideram que este tipo de aceno aos militares é uma tentativa de garantir sua lealdade num momento potencialmente explosivo.

A população do país dá crescentes sinais de impaciência diante das condições de vida (como inflação mais alta do mundo, escassez de alimentos e remédios, racionamento de água e apagões).

Em outra medida polêmica, o decreto também concede poderes policiais a organizações de bairro como os Conselhos Comunais e os recém criados Comitês Locais de Abastecimento e Distribuição (CLAP), grupos de cidadãos envolvidos na entrega dos alimentos subsidiados.

Essas organizações terão função de vigilância, junto com as Forças Armadas e a polícia, para "manter a ordem pública e garantir a segurança e a soberania do país."

O formato ecoa o dos coletivos armados, grupos parapoliciais criados pelo ex-presidente Hugo Chávez (1999-2013) para executar tarefas repressoras a serviço do Estado.

A estratégia de armar civis foi criticada pelo ativista de direitos humanos Marino Alvarado. "Isso promove a violência, porque estes grupos estão autorizados a reprimir a crescente irritação social".

O decreto também amplia a margem de manobra de Maduro para movimentar recursos sem autorização da Assembleia e reforça medidas de controle do setor privado.

O decreto ainda impede que autoridades envolvidas na emergência econômica sejam retiradas. Embora o texto não cite restrições de liberdades individuais ou políticas, a oposição teme que seja usado para acabar com a tentativa de organizar o referendo para destituir Maduro, cujo mandato acaba em 2019.

A oposição já formalizou o início dos trâmites para o referendo, mas o governo vem usando sua influência no órgão eleitoral para atrasar o andamento da iniciativa.


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