Folha de S. Paulo


Para pesquisadores, impeachment passa a punir crimes antes ignorados

O argumento de que as pedaladas fiscais, usadas como justificativa para a abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, já haviam sido usadas por governos anteriores não diminui a necessidade de punir o governo pela infração. A avaliação é de dois analistas estrangeiros que estão acompanhando a crise política brasileira, e que rejeitam a ideia de que o impedimento da presidente seja uma ameaça à democracia.

Danilo Verpa-17.abr.16/Folhapress
Movimentos pró-governo se concentram para acompanhar a votação do impeachment contra a presidente Dilma Rousseff
Movimentos pró-governo se concentram para acompanhar a votação do impeachment

"Se o impeachment for feito de forma metódica e legal, é parte do sistema e não vai afetar a democracia brasileira", disse Shannon K O'Neil, pesquisadora sênior de estudos latino-americanos do Council of Foreign Relations, nos Estados Unidos.

Segundo ela, o impedimento pode parecer uma punição radical demais, uma vez que o mecanismo das pedaladas já havia sido cometidos por governos anteriores, mas, o que Dilma fez é ilegal, e o impeachment pode ser justificado.

"Claro que pode ser difícil convencer a opinião pública, mas o que importa é que a lei precisa ser seguida, mesmo que outros tenham feito o mesmo no passado", disse.

A decisão por seguir a lei, independente do que ocorreu no passado, também é correta para Michael Shifter, presidente da Inter-American Dialogue, think tank norte-americano com foco em estudos relacionados à América Latina. Segundo o pesquisador, a justificativa de que as pedaladas já haviam sido usadas por outros presidentes antes de Dilma não se sustenta.

"É verdade que a acusação contra Dilma não é forte. Ela está sendo acusada por algo que era comum em governos anteriores do Brasil e no resto da América Latina. Mas o momento atual é diferente. Os tempos estão mudando. O que era ignorado no passado pode ser considerado hoje como um crime", explicou.

Shifter avalia que não há dúvidas de que o processo de impeachment é controverso, e dividiu o país, mas não há base para chamá-lo de golpe.

"O processo aderiu a normas constitucionais e está sendo monitorado pelo Judiciário, que interveio quando foi preciso", disse.

JULGAMENTO POLÍTICO

O'Neil e Shifter comentaram ainda as críticas ao caráter político do julgamento do impeachment. Segundo eles, entretanto, isso faz parte de toda decisão de impedimento de líderes em democracias presidencialistas.

"O impeachment é um julgamento legal e político em todos os lugares. Todos os casos têm motivação política", disse O'Neil, citando o processo de impeachment contra o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, em 1998.

"Quando os EUA discutiram o impeachment de Clinton, aquilo não foi exatamente por ele ter mentido por ter tido uma amante. Foi um julgamento político", disse.

A avaliação de Shifter é semelhante. "O impeachment não é apenas um processo jurídico. Ele é tanto jurídico quanto político", disse Shifter.


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