Folha de S. Paulo


Obama apresenta ao Congresso plano para fechar Guantánamo

O presidente dos EUA, Barack Obama, enviou ao Congresso um plano para fechar a prisão de Guantánamo, num derradeiro esforço para cumprir uma de suas maiores promessas de campanha em seu último ano no cargo.

Controlado pela oposição republicana, o Legislativo bloqueou tentativas anteriores do presidente para desativar a controversa prisão americana em Cuba, e dificilmente isso mudará em um ano eleitoral como 2016.

Carlos Barria/Reuters
Presidente dos EUA, Barack Obama, faz pronunciamento sobre Guantánamo
Presidente dos EUA, Barack Obama, faz pronunciamento sobre Guantánamo

Dos 91 presos remanescentes, o plano prevê a transferência de 35 para outros países. O restante iria para penitenciárias dentro dos EUA.

Em pronunciamento na Casa Branca nesta terça (23), Obama disse que a prisão de Guantánamo contraria os valores e interesses dos EUA, "uma mancha em nosso amplo histórico de respeito aos mais altos padrões do Estado de Direito".

A controvérsia teve início em janeiro de 2002, quando a prisão na base militar de Guantánamo foi convertida em centro de detenção para suspeitos capturados na luta contra o terrorismo deflagrada pelo então presidente, George W. Bush, em resposta aos atentados de 11 de setembro de 2001.

O fechamento da prisão foi um das primeiras ordens emitidas por Obama após tomar posse, em 2009, mas o presidente jamais conseguiu superar as divergências políticas para que a proposta pudesse sair do papel.

"Apesar da política, nós fizemos progresso", afirmou Obama, observando que mais de 85% dos cerca de 800 detentos que estiveram em Guantánamo foram transferidos para outros países. Mais de 500 dessas transferências ocorreram ainda na era Bush, e 147 sob o governo atual.

Plano de fechamento - O que está previsto no texto que será apresentado ao Congresso para a transferência de presos de Guantánamo aos EUA - Diferença nos custos anuais de operação, em US$ milhões

BUSH A FAVOR
No discurso, Obama lamentou a divisão política criada em torno do assunto e lembrou que tanto George W. Bush quanto seu rival republicano na eleição presidencial de 2008, o senador John McCain, eram favoráveis ao fechamento de Guantánamo.

"Está claro há muitos anos que a prisão na baía de Guantánamo não ajuda a nossa segurança nacional, mas a prejudica", afirmou o presidente. Além disso, afirmou, tem um alto custo financeiro: US$ 450 milhões foram gastos apenas no ano passado para manter a prisão operando.

Guantánamo hoje - 91 prisioneiros ainda estão na prisão

O presidente não entrou em detalhes sobre um dos pontos mais polêmicos do plano, o destino dos presos a serem mantidos no cárcere em solo americano.

Mas criticou o uso de comissões militares pare decidir seu destino, enfatizando que, no futuro, esses tribunais deveriam se restringir a réus capturados no campo de batalha.

A proposta de Obama foi mal recebida pelos republicanos e criticada até pelo senador John McCain, um dos poucos no partido favoráveis à ideia. Para ele, faltou clareza sobre os presos que ficarão nos EUA e o futuro.

"O que recebemos hoje é um vago cardápio de opções, não uma política coerente para lidar com futuros detentos terroristas", disse McCain, que foi mantido prisioneiro por seis anos na Guerra do do Vietnã. "Em vez de dar respostas para questões difíceis, o presidente passou a responsabilidade para o Congresso."

A proposta também desagradou a grupos de direitos humanos. "A infâmia de Guantánamo jamais foi sua localização, mas seu regime imoral e ilegal de detenção por tempo indeterminado", disse o Centro de Direitos Constitucionais, cujos advogados defenderam detentos.

OUTROS PAÍSES

No caso dos 35 que já podem ser transferidos para outro país, há vários fatores que estariam travando o processo.

Enquanto o governo americano alega que é preciso convencer outros governos a receber ex-prisioneiros, organizações que trabalham na defesa dos detentos dizem que há países interessados, mas que a burocracia do Pentágono emperra a transferência.

Por razões de segurança, o governo americano não manda prisioneiros para países instáveis ou em conflito, como Síria e Iêmen, mesmo que sejam os países de origem dos detentos.

Por isso há um grande número de iemenitas e sírios em busca de países que os aceitem, já que não podem voltar para casa.

Ante a proximidade do fim do mandato de Obama, em janeiro de 2017, o processo de transferência para outros países, contudo, foi acelerado. Só em janeiro, foram 16 transferências.

A Folha revelou que o governo brasileiro chegou a ser sondado pelo Departamento de Estado dos EUA em 2014 para acolher prisioneiros iemenitas e sírios de Guantánamo, mas declinou da oferta diante da exigência de que o grupo fosse monitorado no Brasil e as informações, compartilhadas com a inteligência americana.

O clima político na época também não teria ajudado —Brasil e EUA ainda estavam com as relações estremecidas por conta do escândalo de espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA, na sigla em inglês) sobre autoridades brasileiras, em 2013.

Na América do Sul, o Uruguai foi o único país que recebeu ex-prisioneiros de Guantánamo, em dezembro de 2014.

Como o Brasil tem uma comunidade árabe e muçulmana bem mais expressiva que o vizinho, ativistas pelo fechamento da prisão defendem o país como um bom destino para ex-detentos.

População carcerária ano a ano - Quando Obama assume, em 20.jan.2009, a prisão tem 242 detentos


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