Folha de S. Paulo


Governo do México quer ouvir Sean Penn por reunião com 'El Chapo'

O governo mexicano quer ouvir o ator americano Sean Penn e a atriz mexicana Kate del Castillo pela entrevista que realizou com o narcotraficante Joaquín "El Chapo" Guzmán antes de sua recaptura na sexta-feira (8), afirmou um funcionário do governo, que pediu anonimato, à agência de notícias France Presse.

"A informação é correta, claro, é para estabelecer responsabilidades", disse o funcionário. Neste sábado (9, horário local, madrugada de domingo no Brasil), a revista "Rolling Stone" publicou em seu site a entrevista concedida ao ator por "El Chapo" em outubro do ano passado, graças à ajuda da atriz mexicana.

Uma segunda fonte do governo federal disse que não está claro se os atores teriam cometido um crime. Um repórter pode entrevistar um suposto narcotraficante, mas "eles não são jornalistas", afirmou.

A procuradora-geral mexicana Arely Gómez afirmou que o traficante teve reuniões com atrizes e produtores, dos quais não revelou os nomes, com a intenção de produzir um filme sobre sua vida, o que ajudou em parte a investigação de seu paradeiro.

"Estes encontro constituem uma nova linha de investigação", disse Gómez.

Mike Vigil, ex-diretor de operações internacionais da agência de combate às drogas americana DEA, descartou a possibilidade de Penn ser acusado.

"Duvido seriamente que sejam apresentadas acusações contra eles, apesar de Sean Penn ter adotado medidas extraordinárias para que seu telefone não fosse rastreado", disse Vigil.

Neste domingo (10), o chefe de gabinete da Casa Branca, Denis McDonough, afirmou que durante a entrevista com Penn, "El Chapo" Guzmán se gabou "das grandes quantidades de heroína que distribuiu por todo o planeta, incluindo os Estados Unidos", o que "irritou" a presidência americana.

"Isso provoca muitas perguntas interessantes sobre ele e outros envolvidos nesta suposta entrevista. Vamos ver o que acontece", disse McDonough.

O ENCONTRO

Sean Penn e "El Chapo" se encontraram em 2 de outubro do ano passado, em uma região de selva do México, com direito a uma fotografia de 2 de outubro que mostra Penn apertando a mão do líder do cartel de Sinaloa.

Na reunião também estava a atriz Kate del Castillo, conhecida por seu papel na telenovela "La Reina del Sur", sobre uma poderosa chefe do tráfico. Em 2012 a mexicana afirmou em uma carta que confiava mais em "El Chapo" do que nos governos de seu país, "que escondiam verdades".

Embora tivessem marcado para que depois dessa primeira conversa seguisse uma entrevista formal oito dias depois, o segundo encontro nunca aconteceu. "El Chapo", no entanto, enviou a Penn uma gravação em vídeo com as respostas às perguntas que lhe tinha mandado.

A revista dá a seguinte manchete "El Chapo speaks" (El Chapo fala) e relata "a visita secreta ao homem mais procurado no mundo".

Resume as negociações que fez para se encontrar com o traficante, usando entre outras pessoas contatos da atriz mexicana, e conta detalhes sobre a vida do chefe do cartel de Sinaloa.

O encontro tinha como propósito fazer só a entrevista para a "Rolling Stone", mas Sean Penn falou que "El Chapo" tinha expressado interesse em que se fizesse um filme sobre sua vida.

Penn escreveu que o traficante deu um grande abraço quando eles se conheceram em um ponto de uma região de selva. Também afirma que obteve sete horas de entrevistas na presença de "El Chapo" e por telefone sobre suas atividades criminosas.

"Eu forneço mais heroína, metanfetaminas, cocaína e maconha que qualquer um no mundo", afirmou, entre doses de tequila, a Penn em uma surpreendente admissão sobre o tamanho de seus negócios ilegais.

A "Rolling Stone" também divulgou um vídeo que mostra Guzmán sem bigode e no qual ele afirma que trafica drogas desde antes dos 15 anos porque em sua cidade natal, La Tuna, "não havia oportunidades de trabalho".

Vários dias depois a região foi alvo de uma intensa busca por parte das autoridades mexicanas, o que, segundo o ator, impediu um segundo encontro formal e, de fato, esfriou os contatos com os intermediários.

Em mensagens de texto que trocaram depois do encontro, Guzmán comentou com Penn uma operação militar no dia 6 de outubro que quase provocou sua recaptura.

"El Chapo" minimizou as lesões que sofreu no rosto e em uma perna ao fugir da operação. "Não é como eles dizem, sinto apenas um pouco de dor na perna", escreveu Guzmán.

As autoridades informaram que os militares não atiraram contra o narcotraficante porque ele estava acompanhado de duas mulheres e uma criança. Ele teria se ferido sozinho em uma queda.

FUGA

Guzmán fugiu da prisão de segurança máxima Altiplano, na cidade de Almoloya de Juárez (90 quilômetros da capital), na noite de 11 de julho de 2015, saindo de sua cela por um túnel subterrâneo de 1,5 quilômetro de extensão. Um vídeo registrou o momento da fuga.

O episódio expôs o governo Peña Nieto, que havia promovido a prisão de Chapo, em 2014, como símbolo de sucesso na guerra do governo contra os cartéis.

Para chegar ao túnel, Chapo saiu por um buraco de 50 cm por 50 cm na área do chuveiro de sua cela —que não era vigiada por câmeras. Ele desceu por um duto vertical de cerca de 10 m de profundidade, com a ajuda de uma escada, até a passagem.

O túnel, que contava com ventilação e iluminação, tinha 1,70 m de altura e sua largura variava entre 60 cm e 80 cm.

Em outubro, o governo do México anunciou a prisão de seis pessoas que estariam envolvidas na fuga de Chapo.


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