Folha de S. Paulo


Ataque na Califórnia faz agentes defenderem volta de espionagem

À meia-noite de 29 de novembro foi encerrado oficialmente o polêmico programa de coleta em massa de dados telefônicos da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA).

Três dias depois, um casal matou 14 pessoas a tiros em um centro comunitário de San Bernardino, na Califórnia, considerado o pior atentado em solo americano desde o 11 de Setembro.

O ataque reacendeu o debate sobre os instrumentos de monitoramento do governo e tem sido citado por profissionais de segurança como exemplo de que é um erro reduzir a vigilância em tempos de ameaça aos EUA inspirada pela milícia terrorista Estado Islâmico.

Em conversas privadas relatadas por alguns de seus interlocutores à Folha, é manifestada abertamente entre os analistas da NSA e de outras agências de segurança americanas a esperança de que o atentado em San Bernadino sirva de alerta e reforce o lobby no Congresso para que a capacidade de obter dados, mesmo sem uma suspeita concreta, seja ampliada.

A coleta em massa de comunicações é como "passar o aspirador de pó em um tapete sujo. Tende a pegar tudo, mesmo o que não deveria", compara, em e-mail à Folha, o coronel Cedric Leighton, ex-oficial de inteligência da aeronáutica. O problema, diz ele, é que atualmente não há outro tipo de tecnologia que permita às autoridades detectar comunicações terroristas.

Opiniões semelhantes também têm sido ouvidas de especialistas em computação. Em artigo publicado na revista "Newsweek", o fim do programa de metadados é classificado como "desnecessário" pelo renomado cientista da computação Eric Siegel.

REPUBLICANOS

Inflamado pelos atentados terroristas em Paris e na Califórnia, o debate em torno dos programas de vigilância endureceu a retórica de pré-candidatos republicanos à Casa Branca. Um dos mais críticos é o senador Marco Rubio, que acusou o presidente Barack Obama de "desarmar" os EUA contra o terror.

Em depoimento ao Congresso na semana passada, porém, o diretor do FBI (polícia federal), James Comey, afirmou que ainda é cedo para determinar se a mudança no programa prejudicará os esforços para identificar conspirações terroristas.

Falando nos aplicativos que permitem criptografar mensagens, Comey pediu a empresas de tecnologia que repensem o seu "modelo de negócios". Foi uma referência às mensagens criptografadas usadas por criminosos em atos violentos recentes, como o casal que cometeu o atentado na Califórnia.

Para Eric Siegel, porém, não há como proibir tais aplicativos. "Assim como seria excessivo para a Justiça proibir alguém de sussurrar no ouvido de alguém, o público deve poder proteger o conteúdo de suas mensagens como bem desejar", disse à Folha.

DIREITOS CIVIS

Para os defensores de direitos civis, o fim do programa foi uma enorme vitória na luta contra os abusos da NSA, revelados há mais de dois anos pelo ex-colaborador da agência Edward Snowden.

Pela Lei de Liberdade, aprovada em junho e que entrou em vigor no mês passado, fica proibida a coleta dos dados telefônicos em massa praticada desde os atentados de 11 de setembro de 2001. Com a mudança, o governo precisa de autorização judicial para ter acesso a eles.

Para Elizabeth Goitein, co-diretora do Programa de Liberdade e Segurança Nacional do Centro de Justiça Brennan, nada indica que o fim do programa torna o país mais vulnerável. "Nenhum ataque foi evitado com a coleta em massa nos quase 15 anos do programa", afirmou.


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