Folha de S. Paulo


Clima não é a única questão, diz especialista

Steve Cohen, 62, não acredita que a Conferência do Clima em Paris, que termina dia 11, vá obter um acordo para evitar que o aquecimento global ultrapasse 2ºC —e não está preocupado com isso. Como ele é o diretor-executivo do maior centro de pesquisa da Universidade Columbia (EUA), o Instituto da Terra, é bom ouvi-lo.

A estrela do Earth Institute, como ficou mais conhecido, é o economista Jeffrey Sachs. Mas quem comanda os 800 funcionários —entre eles 37 professores e pesquisadores— e o orçamento de US$ 140 milhões é Cohen, administrador especializado em temas ambientais.

"Jeff é um cara muito criativo, mas é um administrador terrível", afirma, com um sorriso. "E uma das minhas maldições é que sou um administrador muito bom. Formamos um bom time."

Cohen veio a São Paulo para falar no Encontro de Líderes Comunitas, no último dia 27. Além de apresentar o instituto, ele discutiu com prefeitos e administradores o tema da sustentabilidade, no evento que teve também Fernando Henrique Cardoso, Marina Silva, José Serra e Gilberto Kassab.

"A mudança do clima é uma questão importante, mas não é a única", diz Cohen sobre a missão do EI. O leque de temas de pesquisa inclui também água, alimentos, pobreza, urbanização, resolução de conflitos, e assim por diante. "Se tivermos uma guerra nuclear, nada mais terá importância."

As questões ambientais agora têm de se tornar uma parcela rotineira da tomada de decisões, como contabilidade, marketing ou planejamento estratégico, diz Cohen.

"A BP [British Petroleum] certamente gostaria de ter prestado mais atenção a isso e a questões de engenharia [ambiental] antes de gastar US$ 70 bilhões para limpar o golfo do México. A Vale também", afirma, referindo-se ao derramamento em Mariana (MG).

O Earth Institute foi precedido em Columbia pelo Laboratório Lamont-Doherty, uma instituição pioneira em ciências da Terra. Foi a primeira a mostrar o papel dos oceanos na regulação do clima planetário, a fazer previsões certeiras sobre a ocorrência de El Niños e a distinguir terremotos de testes nucleares subterrâneos com base em dados sísmicos.

Essa capacidade se mostrou fundamental para monitorar acordos internacionais para bani-los e para o Congresso dos EUA aceitarem-nos. "Isso foi no tempo em que o Congresso ainda dava ouvidos à ciência."

ADAPTAÇÃO AO CLIMA

Para o diretor-executivo do instituto, a adaptação ao clima ganha destaque crescente porque a mudança climática já está entre nós. Para isso, será preciso acertar as políticas públicas capazes de induzir a transição inevitável dos combustíveis fósseis —maior fonte de gases do efeito estufa no mundo— para as energias renováveis.

"Precisamos acelerar isso. Para que aconteça, governos e o setor privado necessitam descobrir como trabalhar juntos", recomenda Cohen. Ele, no entanto, não acredita em progresso em Paris suficiente para observar o limite de 2ºC dado como menos arriscado pelos climatologistas.

"Provavelmente vamos errar esse alvo, mas possivelmente não muito", tranquiliza o diretor do Earth Institute. "É muito difícil predizer a difusão de novas tecnologias pela economia. Veja o exemplo dos smartphones. Vinte anos atrás ninguém sabia como eles se tornariam importantes."

As tecnologias substituem outras quando têm características superiores, ensina o administrador. Um dos maiores problemas ambientais de Nova York no início do século 20 era o esterco de cavalos, mas bastaram 15 anos para substituí-los após a invenção do motor a combustão interna.

Os combustíveis fósseis têm várias desvantagens do ponto de vista social, admite. Tirá-los do chão ou do fundo do mar causa muita poluição. Queimados, produzem material particulado, que é danoso à saúde, e dióxido de carbono (CO‚), que agrava o efeito estufa.

"Há muitas razões para não usá-los, mas não vamos nos livrar deles, a não ser que surja algo que seja muito melhor. Tudo que fazemos usa energia. A energia permeia toda nossa economia."

Qualquer política que proíba seu uso, assim, está fadada ao fracasso. Primeiro há que encontrar meios mais eficientes de usar energia, como redes de distribuição inteligentes e iluminação mais econômica. Um terço da eletricidade gerada se perde na transmissão, afirma Cohen.

Quanto às energias renováveis, diz, o que está disponível é "bom o suficiente, mas não ótimo o bastante".

Outro exemplo vem à baila: Cohen tira do bolso o celular e diz que o aparelho tem mais capacidade de processamento que o primeiro computador usado por ele, do tamanho de uma sala.

A miniaturização foi possível, conta, porque era preciso ter melhores sistemas de navegação embarcados em mísseis balísticos. A tecnologia do GPS e a internet também foram desenvolvidas pelo Departamento de Defesa dos EUA.

"Imagine agora um painel solar para energizar sua casa que seja do tamanho de uma janela, de modo que não precise ser dono de uma casa para utilizá-lo [no telhado] e possa instalá-lo num apartamento. E se as baterias [para armazenar energia dos painéis] forem do tamanho de um laptop?"

A tecnologias virão, confia o diretor do EI. "A questão é saber com que rapidez."


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