Folha de S. Paulo


Violência agrava divisão de Jerusalém entre israelenses e palestinos

"Jerusalém, completa e unificada, é a capital de Israel". A frase, parte da Lei Básica de Jerusalém, aprovada pelo Knesset (o Parlamento) em 1980, é quase um mantra para muitos israelenses.

A cidade milenar, sagrada para judeus, muçulmanos e cristãos, seria "eternamente indivisível", não retornaria à situação de antes da Guerra dos Seis Dias (1967), quando muros e cercas de arame farpado passavam no meio dela, dividindo-a entre a parte judaica, controlada por Israel, e a árabe, pela Jordânia.

Há duas semanas, no entanto, a polícia israelense começou a cercar bairros de Jerusalém, espalhando blocos de concreto nos acessos.

Policiais foram deslocados para postos de controle improvisados, na tentativa de estancar uma onda de ataques, especialmente a facadas, de moradores desses bairros contra israelenses.

Desde meados de setembro, 11 israelenses morreram em ataques palestinos, que se intensificaram em outubro. Cerca de 50 palestinos também foram mortos –metade deles enquanto cometiam atentados, e os outros alvejados por soldados israelenses em protestos na Cisjordânia e na faixa de Gaza.

Neste sábado (31), forças de segurança de Israel mataram a tiros um palestino que correu em sua direção com uma faca na Cisjordânia.

Editoria de Arte/Folhapress

"HUMILHANTE"

"É humilhante", diz sobre as barreiras o palestino Muhammad Abu Hummus, que agora precisa esperar em filas demoradas para entrar e sair do bairro, além de passar por revistas às vezes corporais.

Ele afirma que, ao anoitecer, há patrulhas do Exército que, por vezes, borrifam gás lacrimejante ou com cheiro de esgoto nas ruas para inibir a circulação de jovens.

Mas muitos se perguntam se essas medidas não esboçam, na verdade, uma fronteira "de facto" quase meio século depois, separando a parte judaica (Ocidental) e a árabe (Oriental) da cidade.

"A medida não tem significado político. É só um aspecto de nossas medidas de segurança", diz o porta-voz do ministério do Exterior de Israel, Emmanuel Nachshon.

Mas o próprio premiê, Binyamin Netanyahu, parece ter se dado conta do significado das muretas e ordenou que elas fossem retiradas. O cerco com blocos de cimento e os postos policiais eventuais, no entanto, continuam.

A "unificação" de Jerusalém (para os palestinos, "ocupação") visou anexar a Cidade Velha, 1 km² onde ficam os principais locais santos para cristãos, muçulmanos e judeus. Até 1967, os jordanianos proibiam judeus de visitar o Muro das Lamentações, seu sítio mais venerado.

Mas, além da Cidade Velha, Israel anexou 28 aldeias palestinas (70 km²), triplicando a área municipal. Aos 310 mil moradores palestinos foi oferecida cidadania, e a maioria só aceitou ser "residente fixo".

Aos poucos, Israel construiu novos bairros judaicos na parte oriental, considerados assentamentos pela comunidade internacional.

Segundo pesquisa feita pelo Knesset, 50% dos israelenses estariam dispostos a ver Jerusalém menor, sem os bairros palestinos. Para Sima Kadmon, do jornal "Yedioth Ahronoth", é preciso "admitir que Jerusalém nunca foi e nunca será unificada".

Apesar de israelenses e palestinos conviverem em shoppings, praças e outros locais públicos em Jerusalém, os povos quase não se misturam.

Antes da atual crise, havia um clima de coexistência em alguns bairros. Liron Deri, subprefeito de Jerusalém, diz que os jovens conviviam pacificamente. "Centros comunitários dos dois lados promoviam encontros conjuntos semanais. Ninguém quer cercas ou muros em Jerusalém."

Neste sábado, cerca de 50 mil israelenses participaram da homenagem ao ex-premiê Yitzhak Rabin em Tel Aviv. Ele foi assassinado há 20 anos por um radical judeu contrário à solução dos dois Estados do acordo de Oslo, motivo pelo qual Rabin recebeu o Prêmio Nobel da Paz.


Endereço da página:

Links no texto: