Folha de S. Paulo


Establishment republicano mostra surpreendente fraqueza

Todos sabíamos que, provavelmente, esta fase da disputa republicana seria volátil, mas isso não ajuda a entender a volatilidade.

Debates como o desta quarta-feira (28) e a atenção dos meios de comunicação -mais do que os fatores que tendem a decidir a nomeação- estão influenciando os números das pesquisas e podem obscurecer mais do que revelar. Essa penumbra pré-primárias, quando até mesmo os observadores mais experientes podem se enganar, é um período em que havia "alarme" sobre a campanha de Obama, em que as pessoas estavam escrevendo sobre o colapso de John McCain em 2008 e em que Herman Cain foi proclamado o principal candidato republicano em 2012.

Houve um grande acontecimento para o Partido Republicano ao longo dos últimos seis meses: Scott Walker deixou a disputa, e agora há uma grande chance para Marco Rubio, mesmo que seja muito cedo para dizer se ele vai tirar proveito disso.

Além disso, estamos em clima de "esperar para ver". Não há nenhuma maneira de saber como a corrida vai ficar ou se as mais recentes mudanças -como as conquistas de Ben Carson em Iowa- vão durar os três meses necessários até que os eleitores comecem a votar.

Mas há alguns aspectos gerais a ter em mente, segundo especialistas e jornalistas que dão suas opiniões sobre quem está no auge, quem está por baixo, quem vai ganhar ou quem vai cair fora.

A fraqueza do partido é real

Os outsiders da competição republicana na verdade não são tão fortes como às vezes parecem. Apesar do fato de que a fraqueza do establishment e dos seus candidatos provavelmente não está recebendo atenção suficiente.

Para começar, o partido ainda não se decidiu. Houve menor número de apoios por parte de autoridades republicanas a esta altura dos acontecimentos do que em qualquer primária anterior.

Isso não acontece por causa de uma abundância de recursos; é porque os candidatos que poderiam ser aceitáveis de forma plausível para as elites republicanas têm grandes falhas e fizeram pouco para ganhar o apoio do partido ou dos eleitores.

Todos estão se saindo mal nas pesquisas. Jeb Bush, Rubio e John Kasich nem sequer ultrapassaram 10% em nível nacional ou em qualquer um dos primeiros Estados.

Eles têm outros pontos fracos também. Rubio pode ser aceitável em termos amplos, mas suas cifras de captação de recursos e seu esforço geral de campanha foram surpreendentemente limitados.

Kasich pode ser inaceitável para muitos da ala conservadora do partido, e sua captação de recursos também não é impressionante. Bush tem registros de captação de recursos mais saudáveis –embora aparentemente não saudáveis o suficiente para evitar grandes cortes em sua operação de campanha–, mas índices de favoritismo muito fracos.

Houve corridas eleitorais um pouco parecidas com essa antes. Os democratas não tinham candidatos muito fortes a esta altura em 1988, 1992 ou 2004. Como é o caso do campo republicano neste ano, não havia nenhum candidato óbvio que era o "próximo da fila", que entrou na corrida com apoio significativo de eleitores ou das elites do partido.

No final, todas essas disputas funcionaram bem para o establishment democrata, no sentido de que os líderes partidários acabaram com um candidato aceitável para eles. Mas em nenhuma dessas disputas o partido enfrentou candidatos outsiders tão fortes como os da corrida republicana deste ano, seja em termos de pesquisas ou de captação de recursos.

Talvez a analogia mais próxima seja Howard Dean na disputa de 2004, mas as elites partidárias estavam abertas a ele. Al Gore chegou a apoiá-lo.

Em termos gerais, um "aparelho" partidário na era moderna não havia se encontrado nessa posição de fraqueza, nesta fase, em uma disputa. Seja em termos de medição nas pesquisas, de captação de fundos ou em qualquer métrica, os candidatos do establishment do partido estão lutando para se manter no nível dos candidatos aos quais o establishment quase com certeza vai se opor.

Falta muito tempo

O establishment ainda pode não ter chegado a um acordo e seus candidatos também não, mas ainda há muito tempo. Faltam mais de três meses para os caucus de Iowa, em 1º de fevereiro, o que é muito tempo para um candidato como Rubio, Bush ou mesmo Kasich atingir uma posição mais forte nas pesquisas ou entre líderes partidários.

Ainda há tempo de sobra para que Donald Trump ou Carson tropecem, ou mesmo para que sejam substituídos por outro candidato, como Ted Cruz.

Não é tão simples medir a "precisão" das pesquisas até aqui, mas vamos olhar para as pesquisas nas últimas três disputas da forma como a maioria dos analistas estão olhando para elas agora: quem liderou em Iowa, em New Hampshire e nas pesquisas nacionais.

No final de outubro, em 2007 e 2011, as pesquisas teriam acertado em duas de nove vezes (não houve disputa democrata em 2011, quando o presidente Barack Obama concorreu à reeleição). Se você incluir 2004, elas tiveram um índice de dois em 12. As duas disputas que as primeiras sondagens acertaram foram Hillary Clinton em New Hampshire em 2008 e Mitt Romney no mesmo Estado quatro anos depois.

Elas teriam errado muito mais:

- Rick Santorum venceu Iowa em 2012, mas as pesquisas nessa fase mostravam Herman Cain à frente. Santorum tinha apenas 3% ou 4% dos votos.

- Mike Huckabee venceu Iowa em 2008, mas as pesquisas mostravam Romney à frente. Huckabee tinha cerca de 15% dos votos nesse momento; ele ganharia com 35%.

- Obama ganhou Iowa em 2008, mas as pesquisas mostravam Clinton à frente.

- John McCain ganhou New Hampshire em 2008, mas as pesquisas mostravam Romney na liderança por uma ampla margem de vantagem. McCain tinha cerca de 17% dos votos; terminou com 35%.

- Pesquisas nacionais mostravam Rudy Giuliani à frente em 2007. Ele tinha 30% dos votos, mas não ganharia em nenhum Estado. McCain venceu a nomeação em 2008.

- Pesquisas nacionais em 2011 mostravam Cain na frente com cerca de 30% dos votos, mas ele também não venceria nenhum Estado. Romney ganhou a nomeação em 2012.

- Pesquisas nacionais em 2007 mostravam Clinton na liderança por uma margem de quase 2 a 1. Barack Obama venceu a nomeação em 2008.

E se o partido não fizer sua escolha?

Quando o partido não tem um favorito claro, os eleitores dos primeiros Estados desempenham um papel importante de diminuir as opções para a legenda –ou até mesmo de decidirem por si mesmos. Isso não incomodou os partidos no passado, em parte porque os eleitores tenderam a escolher um candidato que a agremiação poderia aceitar.

A primária democrata de 2004 foi um cenário exemplar para um partido que não faz sua escolha. John Kerry ganhou Iowa, e o partido disse algo do tipo: "OK, tudo bem".

Nesse sentido, não está claro se foi o partido que "decidiu" a disputa. Afinal, se Iowa tivesse escolhido John Edwards, Edwards provavelmente teria sido o candidato.

Por outro lado, Jonathan Bernstein, da Bloomberg, interpreta isso como uma vitória para o partido, em parte porque as elites democratas teriam dito: "Ah, não", se os eleitores de Iowa tivessem escolhido Dennis Kucinich.

Foi mais ou menos o que aconteceu em 2008, quando Huckabee venceu Iowa, mas não cresceu para a nomeação, como aconteceu com Kerry. O partido não iria se contentar com um candidato pertencente a uma facção da direita religiosa, e os eleitores de New Hampshire rapidamente ofereceriam uma alternativa.

Neste ano, não está claro que haverá uma alternativa se os eleitores escolherem candidatos aos quais o aparelho republicano se opõe. Em disputas recentes, a elite republicana encontrou um aliado bem-vindo nos republicanos bem-educados, laicos, de Estados predominantemente democratas –particularmente aqueles em New Hampshire–, que reviraram os olhos para o candidato preferido dos caucuses de Iowa.

Mas, neste ano, nenhum candidato agradável ao establishment está se saindo bem em New Hampshire, onde Romney e Jon Huntsman se uniram para ganhar 55% dos eleitores em 2012. Agora, o partido estaria em uma posição muito melhor se um candidato aceitável estivesse ganhando meramente os 17% de Huntsman.

No final, um candidato "aceitável" provavelmente irá bem o suficiente em New Hampshire ou mesmo em Iowa. Essa pessoa provavelmente não precisará nem ganhar: só uma presença forte já posicionaria um candidato para consolidar o apoio do partido e, por fim, vencer a nomeação. Esse candidato pode nem mesmo começar a vencer de forma decisiva até as primárias em 15 de março.


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