Folha de S. Paulo


Brasil decide sair de missão que iria observar eleições na Venezuela

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cancelou nesta terça (20) sua participação na missão de observação da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) na eleição parlamentar da Venezuela de 6 de dezembro próximo.

A decisão veio em resposta a um aparente veto de Caracas ao nome do ex-ministro Nelson Jobim como chefe dos observadores e às limitações que o governo venezuelano quer impor à missão, revelada pela Folha em seu site na segunda (19).

O incidente ocorre em meio à crescente preocupação da oposição venezuelana e de outros países quanto à lisura da eleição na qual o governo de Nicolás Maduro chega com baixa popularidade.

Em nota, o TSE disse ter buscado contribuir para que a missão fizesse "um trabalho de observação objetivo, imparcial e abrangente" e que, por isso, sugeriu à presidente Dilma Rousseff o nome do magistrado Jobim, ex-ministro da Defesa e do STF.

Eduardo Knapp/Folhapress
O ex-ministro Nelson Jobim durante evento na Associação dos Advogados de São Paulo
O ex-ministro Nelson Jobim durante evento na Associação dos Advogados de São Paulo

"Embora o candidato brasileiro tenha angariado amplo apoio entre os Estados-Membros, foi preterido [...] por suposto veto das autoridades venezuelanas", diz a nota, que, num tom ríspido incomum para esse tipo de comunicação, acusa Caracas de "[inviabilizar] uma observação adequada".

À Folha Jobim relatou que os atritos começaram há algumas semanas, quando a Unasul e a autoridade eleitoral venezuelana, o CNE, começaram a redigir sob coordenação da atual Presidência uruguaia do bloco o convênio para a missão observadora.

Segundo o ex-ministro, o CNE rejeitou uma primeira versão e propôs, em seu lugar, um texto que "transformaria os observadores em meros espectadores."

Jobim afirma que o texto do órgão venezuelano queria impedir o contato da missão com opositores e restringir a capacidade de os observadores darem declarações e circularem livremente.

Ainda de acordo com o magistrado, o CNE também queria privar representantes da Unasul da devida imunidade diplomática –que evita, por exemplo, que sejam detidos.

Jobim e o presidente do TSE, ministro José Antonio Dias Toffoli, teriam então encaminhado ao CNE outra proposta, sem resposta até hoje.

PALATÁVEL

Jobim diz ter sido informado, na última sexta (16), de supostas resistências venezuelanas à sua nomeação para o comando da missão que, segundo ele, havia sido respaldada pela Presidência uruguaia da Unasul.

Segundo o governo brasileiro, a Venezuela não aceitou Jobim, pois queria um candidato "mais aceitável" –o ex-chanceler argentino Jorge Taiana, que circula bem entre os líderes bolivarianos e cujo nome foi sugerido pelo secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper.

Segundo a Folha apurou com o governo brasileiro, o governo Maduro não concordou "com o mínimo necessário" para se firmar o convênio que definiria a missão.

Um funcionário no governo brasileiro diz que a Venezuela tem sido "muito rígida" em relação ao acompanhamento eleitoral e que Caracas não aceitou nenhuma exigência, criando uma saia justa.

O mesmo interlocutor afirma que o Brasil buscou mostrar para a Unasul que a missão precisava ter "muita credibilidade". Mas, afirma, o governo venezuelano tem demonstrado uma "sensibilidade histérica", com a visão de que "está sendo sitiado".

Na avaliação desse funcionário, a atitude venezuelana sairá como "tiro pela culatra", descredibilizando a missão de acompanhamento e, por conseguinte, as eleições do país.

VERSÃO DA UNASUL

Até a conclusão desta edição, não havia sido possível confirmar a versão com fontes uruguaias, e o CNE não respondeu à reportagem.

Um funcionário da Unasul afirma que o nome de Jobim não foi formalmente apresentado –em seu comunicado, o TSE afirma que o nome foi aprovado pela presidente Dilma Rousseff e encaminhado à presidência da Unasul.

"Ninguém vetou ninguém, até porque ainda estamos finalizando o convênio e nem chegamos à fase de escolha das autoridades", afirmou o funcionário ligado ao bloco.

A versão final do convênio deve ser apresentada nesta quarta (21), mas seria adiada em caso de divergências entre os 12 países-membros.

O mesmo interlocutor diz que a missão poderá circular livremente e ouvir a oposição.


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