Folha de S. Paulo


E-mails mostram que EUA discutiram o cancelamento de eleição no Haiti em 2010

E-mails divulgados pelo Departamento de Estado dos EUA na última quarta (30) mostram que o governo americano discutiu o cancelamento do contestado primeiro turno das eleições presidenciais do Haiti em 2010.

A sugestão fora enviada, em 22 de janeiro de 2011, por Gabriel Verret, principal assessor econômico do presidente haitiano na época, René Préval, a Cheryl Mills, chefe de gabinete da então secretaria de Estado, Hillary Clinton.

Logo após o primeiro turno, em 28 novembro de 2010, a Embaixada dos EUA no Haiti divulgou um comunicado em que questionava os resultados, sugerindo que eles não seriam consistentes com "o desejo do povo haitiano".

Segundo autoridades eleitorais, o governista Jude Célestin teria ficado em segundo lugar e disputaria o segundo turno com a ex-primeira-dama Mirlande Manigat.

No entanto, dez dias antes da troca de e-mails, um relatório da Organização dos Estados Americanos (OEA) disse que o segundo lugar era do cantor Michel Martelly, e não do candidato do governo.

Mike Segar/Reuters
O presidente do Haiti, Michel Martelly, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York
O presidente do Haiti, Michel Martelly, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York

Na mensagem enviada à assessora de Hillary, Verret fala sobre o plano de cancelar o primeiro turno como parte de um processo que culminaria "com um presidente e um parlamento legitimamente eleitos antes do meio de maio".

Ele cita uma pessoa cujo nome é censurado pelo Departamento de Estado. "Ele me pediu expressamente que entrasse em contato com você nesta tarde para discutir isso", diz Verret a Cheryl.

A chefe de gabinete de Hillary convida para o conversa o então embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, o coordenador do Departamento de Estado para o Haiti, Thomas Adams, e o embaixador no Haiti, Kenneth Merten.

A troca de e-mails mostra que Shannon respondeu com a "posição do Brasil" sobre as eleições, mas o conteúdo também foi censurado. Hillary estava copiada nas mensagens.

O plano visivelmente falhou e, três dias depois, Célestin anunciaria sua saída da disputa. Após vários adiamentos do segundo turno, Martelly venceu Manigat em março.

RETIRADA

Outra mensagens, de agosto e setembro de 2011, mostram uma aparente preocupação dos americanos com a intenção do Brasil de iniciar a retirada gradual dos militares da ONU do Haiti.

Hector Retamal - 28.nov.2010/AFP
Ficha dos candidatos à Presidência do Haiti, no primeiro turno das eleições, em 2010
Ficha dos candidatos à Presidência do Haiti, no primeiro turno das eleições, em 2010

"Respondemos que qualquer redução teria que estar ligada a uma melhoria da capacidade das autoridades haitianas de prover segurança", disse o então conselheiro da Embaixada em Brasília Ricardo Zuniga no relatório sobre a visita de Adams ao Brasil.

Em e-mail de 6 agosto, Cheryl havia destacado a Hillary declarações do então ministro da Defesa, Celso Amorim, sobre a necessidade de retirada.

"Celestin Amorim (...) foi nomeado ministro da Defesa. Em sua primeira entrevista, ele sugeriu a necessidade de o Brasil retirar seus militares do Haiti", disse Adams, no relatório, confundindo o nome de Amorim.


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