Folha de S. Paulo


Com 2 milhões de sírios, Turquia teme que número de refugiados dobre

Se a situação na Síria não melhorar, o número de refugiados sírios na Turquia pode dobrar, chegando a 4 milhões, afirmaram autoridades do governo turco nesta segunda-feira (14).

A Turquia é o país que mais recebeu refugiados —2 milhões— desde o início da guerra civil síria, em 2011. Os sírios estão fugindo das forças da ditadura de Bashar al-Assad e dos milicianos radicais do Estado Islâmico (EI) que dominam o país.

Ulas Yunus Tosun - 18 out. 2014/Efe
Síria que fugiu da região de Kobani cozinha em campo de refugiados de Sanliurfa, na Turquia
Síria que fugiu da região de Kobani cozinha em campo de refugiados de Sanliurfa, na Turquia

O Líbano recebeu 1,1 milhão, e a Jordânia, 630 mil refugiados sírios. Até agora, estima-se que a UE (União Europeia) tenha recebido cerca de 380 mil, sendo cerca de 100 mil na Alemanha.

"O número de refugiados pode dobrar, e nós não temos como lidar com isso", disse Ceylan Özen Erisen, chefe da Diretoria-Geral de Planejamento do Ministério das Relações Exteriores da Turquia.

"Na União Europeia, alguns países não querem aceitar refugiados muçulmanos; a UE age como se fosse uma agência de recursos humanos escolhendo que tipo de refugiado quer", acrescentou.

Os governos de Eslováquia, Polônia e Bulgária indicaram que darão preferência a refugiados sírios cristãos, porque seria mais fácil integrá-los na sociedade. Além disso, Alemanha, Áustria, Eslováquia e Holanda adotaram controles nas fronteiras.

Refugiados sírios em países da região

O governo turco afirma ter gasto US$ 6 bilhões com os refugiados desde o início da guerra civil e diz ter recebido apenas US$ 350 mil em ajuda externa. Entre os 2 milhões de sírios hoje na Turquia, 400 mil estão em campos de refugiados superlotados.

As autoridades turcas, no entanto, não criticaram países como Arábia Saudita, Kuait e Qatar, que não estão acolhendo números significativos de refugiados.

INSTABILIDADE

Mehmet Özkan, diretor- executivo do Centro Internacional de Combate ao Terrorismo da Academia Nacional da Polícia Turca, estima que o número de refugiados possa chegar a 3,5 milhões.

"Se a área controlada pela ditadura de Assad, apenas um terço do país, for tomada pelo Estado Islâmico ou pela oposição síria, facilmente chegaremos a 3,5 milhões de refugiados na Turquia", avalia o diretor-executivo.

"E nós não conseguimos abrigar mais de 2 milhões de refugiados. Isso vai causar instabilidade política."

A Turquia pressiona pela criação de uma zona livre na fronteira com a Síria, que funcionaria como um "amortecedor" entre o país em guerra civil e o território turco.

A ideia do governo é despachar para essa zona livre todos os refugiados, que ficariam então fora da Turquia.

Os curdos da Síria, que detêm o governo de fato no norte do país (conhecido como Rojava), afirmam que essa é uma tentativa da Turquia de impedir que eles ganhem mais autonomia –a zona livre cortaria o território controlado pelos curdos.

Recentemente, houve uma escalada dos choques entre o governo turco e o partido curdo PKK, considerado uma organização terrorista por Ancara, pelos EUA e pela União Europeia. O PKK busca autonomia curda na Turquia.

"A não ser que resolvamos o conflito na Síria e Iraque, não vamos deter o fluxo de refugiados. Essas pessoas estão fugindo de bombas, não têm para onde ir", afirma Mehmet Özkan.

Como alguns outros analistas, ele acredita que o Iraque e a Síria serão fragmentados em razão dos conflitos e não voltarão a ser países.

REFÚGIO NO BRASIL

Segundo informações do Ministério das Relações Exteriores, o consulado brasileiro em Istambul recebe cerca de 30 pedidos de visto para sírios por semana, e o de Ancara, 30 por mês.

Diante da crise migratória, o Conare (Comitê Nacional para os Refugiados, órgão vinculado ao Ministério da Justiça brasileiro) deve prorrogar uma resolução de 2013 que facilita a concessão de vistos para sírios.

Eles podem tirar visto de turista sem cumprir a maioria das exigências, como apresentar conta em banco e demonstrar capacidade de financiar a viagem. Entram no Brasil com visto de turista e pedem refúgio ao chegar.

A jornalista PATRÍCIA CAMPOS MELLO viajou a convite do Ministério das Relações Exteriores da Turquia.


Endereço da página:

Links no texto: