Folha de S. Paulo


Moradores e lojas de Pequim tentam se adaptar a lei contra o cigarro

Desde o início de junho, Pequim tenta banir o fumo do interior de bares, restaurantes e ambientes de trabalho. A lei antitabagista mais dura já instituída em uma cidade chinesa também proíbe fumar nas áreas externas de escolas, pontos histórico-culturais e alguns hospitais.

Livrar os ambientes da fumaça se torna mais complicado num país com 300 milhões de fumantes –28,1% dos adultos, segundo estimativa de 2010– e onde mais da metade dos homens fuma (no Brasil, estima-se que 10,8% da população fume).

Editoria de Arte/Folhapress

Com a lei em vigor há quatro semanas, Pequim já distribuiu notificações por infração e multas. Os principais bares e restaurantes parecem ter aderido, mas ainda é possível encontrar pessoas fumando em locais proibidos.

"Até o momento, tudo vai bem", avalia Angela Pratt, que cuida do controle do tabaco no escritório da Organização Mundial da Saúde de Pequim. "Haverá desafios, mas Pequim começou bem."

Quem mora na cidade tem dúvidas sobre a longevidade do veto, considerando tentativas frustradas, no passado, de controlar os 4,2 milhões de fumantes da capital. E há quem questione a aplicabilidade da regra ao final da temporada de calor, que favorece o uso de mesas ao ar livre.

"Ninguém acha que vai durar", diz Seyyare Tashbaywa, 27, fumante que apoia a lei. Sem ter visto fiscalização na rua, ela mesma pediu que um homem parasse de fumar.

Atitudes como a de Seyyare são fundamentais para o sucesso da lei, cuja implementação é um "complicado projeto social", defende a Associação Chinesa de Controle do Tabaco. "O ponto central é que os fumantes cumpram a regra voluntariamente, e os fumantes passivos possam dizer 'não' para se protegerem", diz a entidade.

Segundo o grupo, há quase 740 milhões de não fumantes expostos à fumaça alheia, sendo 180 milhões crianças.

Indelicadeza

Dizer "não", no entanto, é considerado indelicado na cortesia chinesa. Em busca de uma solução elegante, três sugestões de gestos foram lançadas em uma rede social: uma palma estendida, a mão cobrindo o nariz e um "T" feito com as duas mãos.

Até agora, porém, bastou informar aos clientes sobre a proibição, afirma Shang Hong Yu, 24, funcionária de um bar de Sanlintun, uma área nobre da cidade. Mesmo sendo fumante, ela diz já ter sentido diferença na qualidade do ar que respira no bar.

E há quem veja quase um milagre na nova regra. "O controle do tabaco fez até o céu ficar azul", brinca o fumante Liu Cheng, 27, em referência à qualidade do ar nas primeiras semanas da lei, com menor nível de poluição.

O sucesso dos ambientes livres de fumo em Pequim pode ser o impulso necessário para a adoção de uma lei nacional, diz Pratt, da OMS.

Uma proposta sobre o tema está em discussão pelo governo chinês, mas não há previsão para sair do papel. Cerca de uma dezena de cidades tem leis semelhantes à de Pequim, mas não tão rígidas.

A China é o maior produtor e consumidor de tabaco do mundo (estima-se que um terço do total de fumantes viva no país), e o negócio é dominado por uma estatal.

No fim de 2013, porém, os antitabagistas ganharam um aceno do governo, que proibiu servidores de fumarem em ambientes coletivos.


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