Há algo em comum entre o Estado Islâmico e a região histórica de Lerna, no Peloponeso: a ideia de um monstro que, combatido, multiplica-se e torna-se mais forte.
Lerna era lar, na mitologia grega, da hidra enfrentada por Hércules. Cada uma de suas sete cabeças se transformava em duas quando cortada. A analogia parece válida para a facção terrorista instalada entre a Síria e o Iraque.
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Membros do Estado Islâmico ocupam ruas de Sirte, na Líbia, um dos países onde há células da milícia |
Os EUA bombardeiam militantes do Estado Islâmico desde agosto de 2014. Recentemente, o governo americano disse que mais de 10 mil militantes foram mortos.
Mas analistas têm apontado que, no melhor dos cenários, esse número é equivalente ao de novos recrutas unindo-se à organização.
Já são mais de 20 mil estrangeiros e não há, por ora, falta de guerreiros nas fileiras do Estado Islâmico –que comemora o aniversário de califado nesta segunda (29).
Seus militantes obtiveram, na verdade, uma série de vitórias estratégicas nos últimos meses, como a conquista da cidade histórica de Palmira, no deserto sírio, e a tomada de Ramadi, no Iraque.
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"O EI está se beneficiando de vitórias simbólicas, e isso vai certamente atrair mais guerreiros", diz à Folha Barah Mikail, analista do centro de estudos europeu Fride.
A necessidade de uma contranarrativa que frustre o recrutamento leva pesquisadores a debater por qual razão forasteiros se unem a milícias. Relatos incluem promessas de heroísmo, aventura e fama, mas também da chance de viver em um território regido pela lei islâmica.
Não há informações de brasileiros lutando no Estado Islâmico. Mas o brasileiro Kaíke Guimarães está detido na Espanha, acusado de tentar fazê-lo. O belga Brian de Mulder, filho de brasileira, viajou por sua vez à Síria em 2013 e tornou-se Abu Qassem Brazili, apesar de não ter a nacionalidade brasileira.
Em ambos os casos, as famílias contam que os jovens não se integravam e se radicalizaram em mesquitas.
"A principal resposta é que a maior parte dessas pessoas busca alternativas e perspectivas que permitam que elas sintam que são parte de um grande feito", diz Mikail.
No caso de recrutas dentro do território sírio, outra explicação é a de que milícias moderadas se frustraram com a falta de apoio na guerra contra o ditador Bashar al-Assad.
"Precisavam de um substituto. O Estado Islâmico tem os recursos", afirma Hozan Ibrahim, diretor do grupo Cidadãos pela Síria.
Mas analistas têm sugerido um número bastante mais amplo de explicações para o sucesso do EI em atrair jovens a suas fileiras.
Um documentário britânico defende, por exemplo, a tese de que a frustração sexual é um dos fatores-chave do processo. Em janeiro deste ano, Boris Johnson, prefeito de Londres, chamou os recrutas de "punheteiros".
Já foi sugerido, também, o papel de uma cultura machista para convencer mulheres a se casarem com militantes. O processo foi descrito por uma jornalista que fingiu ser Mélodie, jovem muçulmana interessada em ir ao califado.
Ela escreveu a história no livro "Na Pele de uma Jihadista". "Não tenho certeza de que quero ir à Síria", escreveu a jornalista a seu recrutador. "Se concordar em se casar comigo, vou tratá-la como uma rainha", respondeu o militante.