Folha de S. Paulo


'Queremos novo impulso à relação com o Brasil', diz presidente do México

O presidente Enrique Peña Nieto diz que espera a assinatura de "vários acordos" comerciais entre México e Brasil durante o encontro com a brasileira Dilma Rousseff, na Cidade do México, a partir desta terça-feira (26).

Em entrevista feita por e-mail, Peña Nieto afirmou que o Estado deve interferir menos na economia e lembrou que o México sempre foi a favor de uma maior integração de Cuba ao continente.

Em seu terceiro ano no cargo, o presidente enfrenta uma crise causada pela má repercussão internacional da violência resultante de sua política de combate ao narcotráfico. No México, desde 2006, a guerra às drogas deixou mais de 60 mil mortos.

Pesquisas recentes indicam uma queda em sua popularidade (atualmente em 39%), e dificuldades para que a sigla de Peña Nieto (o PRI, Partido Revolucionário Institucional) recupere a base de apoio no Congresso nas eleições do próximo dia 7 de junho.

Por meio de sua assessoria, Peña Nieto alegou "falta de tempo" para não responder perguntas relacionadas a violência, narcotráfico e liberdade de expressão, enviadas pela Folha. Leia os principais trechos da entrevista.

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Folha - O México tem uma projeção de crescimento para este ano (cerca de 3%) muito melhor do que as de outras duas grandes economias da região (Argentina e Brasil). Como vê esse contexto?

Enrique Peña Nieto - A situação econômica mundial apresenta desafios para todos os países, incluindo os da América Latina. O México decidiu enfrentá-los mediante uma série de reformas estruturais em setores-chave da economia [como o de energia, no qual parte da exploração de petróleo foi privatizada].

Nosso objetivo é incrementar a produtividade e a competitividade do país e, assim, nos inserirmos melhor na dinâmica da economia global.

Creio que essa inserção começa em nosso hemisfério.

O México está consolidando uma relação forte e uma integração econômica profunda com a América Latina. Estamos convencidos de que o livre-comércio, a livre mobilidade de pessoas e capitais, assim como a integração produtiva são essenciais para um maior crescimento de toda a região.

A Aliança do Pacífico, que estabelecemos com Chile, Colômbia e Peru, e o tratado de livre-comércio com o Panamá são exemplos concretos do crescente papel do México na região.

*Seu país tem atraindo empresas automobilísticas e investido no crescimento desse setor. É a prioridade da economia mexicana hoje?"
É uma indústria que emprega mais de 700 mil mexicanos e na qual anunciamos recentemente investimentos de mais de US$ 23 bilhões.

O setor automotivo é um importante motor da economia mexicana. Em 2014, a produção deste setor teve crescimento de 10,2% no México. Ou seja, quatro vezes o aumento da produção global de automóveis. Isto nos deixa como sétimo produtor e quarto exportador no mundo.

Analistas estimam que o México se torne o quinto produtor mundial de veículos em 2020, produzindo 5 milhões de unidades por ano. Isso teria impacto favorável nos acordos com a América Latina, incluindo a relação comercial preferencial que temos com o Brasil no setor automotivo desde 2003.

O Acordo de Complementação Econômica nº 55 tem fortalecido os intercâmbios de veículos rápidos e autopeças entre ambos os países.

O setor automotivo representa quase metade (46%) dos fluxos comerciais bilaterais entre Brasil e México.

Com a recente renegociação deste instrumento, seguiremos dando impulso a nossa complementaridade e, com ela, ao melhor desempenho de ambas as economias.

Na última cúpula empresarial das Américas, no Panamá, o sr. disse que a região vive uma mudança de paradigma do papel que o Estado tinha como gerador de empregos e riqueza. Poderia explicar melhor?

Não apenas na América Latina, mas em grande parte do mundo, há três décadas, o Estado intervinha amplamente na economia. Por exemplo, no começo dos anos 80, o México tinha 1.155 entidades e empresas
paraestatais [no país, as "paraestatais" trabalham para o governo sem fazer parte da administração pública].

Isso tem mudado radicalmente. Hoje, o setor público mexicano emprega somente 4,6% dos que trabalham. O setor privado é o principal responsável pela geração de empregos e pela produção.

A responsabilidade do governo é facilitar e articular oportunidades, criando entornos e sinergias para ajudar investimentos privados geradores de emprego e de bem-estar para a população.

O Estado como regulador tem a obrigação de cuidar da livre e saudável competição entre as empresas, assegurar a estabilidade macroeconômica, dar impulso à inovação e ao acesso ao crédito e elevar a qualidade da educação. Para isso, fizemos grandes reformas estruturais nos últimos dois anos.

Como o México pretende participar da reintegração econômica de Cuba à região?

Foi uma decisão histórica e corajosa de Raúl Castro e Barack Obama. Aos dois mandatários, tenho expressado a satisfação que o México tem com esse novo momento da relação dos dois países.

Gostaria de lembrar que o México foi o único país das Américas que se manifestou contra a exclusão de Cuba da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Desde o início do meu governo, tomei a decisão de relançar a relação do México com Havana. Fiz uma visita de Estado a Cuba em janeiro de 2014, para restaurar o diálogo político de alto nível entre os dois países.

Também assinamos diversos instrumentos de cooperação em temas como comércio, educação e turismo.

Quais são os principais temas do encontro com a presidente Dilma Rousseff?

Em nosso encontro no Panamá, em abril, falamos da necessidade de fortalecer nossos laços econômicos e de cooperação, assim como de continuar fomentando o turismo e os intercâmbios culturais e acadêmicos. Queremos dar novo impulso à nossa relação.

Estou seguro de que esse ânimo se verá refletido na assinatura de vários acordos durante a visita da presidente Dilma Rousseff ao México, nesta semana.

Trataremos da promoção de investimentos e assuntos relacionados a agricultura, turismo e serviços aéreos. Também buscaremos aprofundar nossos intercâmbios comerciais e investimentos bilaterais.


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