Folha de S. Paulo


análise

Resultado de eleição no Reino Unido surpreende pesquisas

Com a notável exceção da Escócia e da vitória esmagadora do Partido Nacional Escocês (SNP), os institutos de pesquisa erraram sobre a eleição britânica de 2015, e o mesmo vale para a maioria dos especialistas.

Os conservadores executaram de maneira implacável o plano do estrategista de campanha australiano Lynton Crosby: foco em algumas dezenas de distritos onde a disputa era acirrada, apertar sem dó os liberais democratas e destruir a credibilidade de Ed Miliband como alternativa para a chefia do governo.

A derrota trabalhista é uma dolorosa rejeição da estratégia de Miliband de abandonar a posição centrista de Tony Blair e inclinar o partido à esquerda. Ele se comportou com dignidade diante de ataques pessoais repulsivos, mas dignidade não vence eleições.

Os eleitores simplesmente não consideram que os trabalhistas sejam competentes para gerir a economia. Também estavam desesperadamente preocupados quanto ao que na prática seria uma aliança entre os trabalhistas e o SNP.

Prepare-se para uma nova geração de políticos trabalhistas assumindo o poder na oposição —e não estou falando de David Miliband, o príncipe exilado, cujo momento pode bem ter ficado para trás.

Os liberais democratas, sob o comando de Nick Clegg, foram exterminados, castigados por desempenharem um papel responsável em um governo de coalizão cujo compromisso era restaurar as finanças públicas. Clegg certamente renunciará à liderança.

Hoje, os conservadores certamente têm bons motivos para comemorar. A despeito da ausência de qualquer coisa que inspirasse o eleitorado, eles certamente se beneficiaram de uma economia que criou mais de dois milhões de empregos durante a coalizão e mostra o mais forte crescimento na Europa Ocidental.

A outra forma de encarar a eleição —especialmente diante do forte desempenho do Partido pela Independência do Reino Unido (Ukip), que não se traduziu na conquista de assentos no Parlamento— é como vitória do nacionalismo. A Inglaterra na prática votou contra o SNP —e os conservadores foram os principais beneficiários.

No sábado (9) e nas próximas semanas, David Cameron enfrentará dois desafios constitucionais prementes: o futuro da união britânica e o futuro relacionamento do Reino Unido com a Europa.

Um novo pacto que conceda autonomia ampliada à Escócia é inevitável, e será mais generoso do que qualquer coisa que pudesse ter sido imaginada um ano atrás. O quase monopólio do SNP sobre o poder, ao norte do rio Tweed, não significa a dissolução do Reino Unido —e tampouco a perspectiva de um novo referendo sobre a independência da Escócia. Mas os termos do novo acordo de ampliação da autonomia regional serão demoniacamente difíceis de definir.

Quanto à Europa, Cameron sabe que suas demandas por um novo acordo terão de respeitar limites necessários, impostos principalmente por Berlim. Mas o primeiro-ministro prometeu um referendo sobre as mudanças no tratado da União Europeia, e sua inquieta base parlamentar não espera nada menos.

A clareza da vitória conservadora é enganosa, portanto. O Reino Unido está ingressando em um período de considerável incerteza política. Será que veremos uma repetição do que aconteceu com John Major em 1992?

- Tradução de PAULO MIGLIACCI


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