Folha de S. Paulo


De criação secular, prefeito Bill de Blasio alia-se a religiosos em NY

Quando era criança, o prefeito de Nova York, Bill de Blasio, era o único garoto de seu quarteirão que não ia à missa aos domingos.

"Todo mundo ia para a igreja, menos eu", contou. "Alguns dos outros meninos me invejavam."

Sua mãe, católica não praticante, não se interessava pela religião organizada, e De Blasio herdou esse ceticismo.

Ele não é membro de nenhuma igreja, não vai à missa e prefere se descrever como uma pessoa "espiritualizada".

Todd Heisler/The New York Times
O prefeito Bill de Blasio e o arcebispo de NY Timothy Dolan visitam jardim de infância na cidade
O prefeito Bill de Blasio e o arcebispo de NY Timothy Dolan visitam jardim de infância na cidade

No entanto, como líder de uma cidade secular, De Blasio está emergindo como defensor da religião. Em sua Nova York, os jardins de infância públicos dentro em breve vão poder incluir um recesso ao meio-dia para que os alunos religiosos possam orar, e as escolas de toda a cidade ficarão fechadas dois dias por ano em dias santos muçulmanos.

Além disso, De Blasio se prepara para suavizar os regulamentos de saúde que regem um ritual de circuncisão controverso praticado por alguns judeus ultraortodoxos.

Ele também disse que está decidido a encontrar uma maneira para que grupos de igrejas possam continuar a promover missas e cultos em escolas públicas nos fins de semana, apesar de um tribunal ter decidido que a cidade tem o direito de proibir a prática.

Suas iniciativas o colocaram em rota de colisão com alguns de seus aliados habituais, como os defensores das liberdades civis, cada vez mais inquietos com o que consideram ser uma mudança agressiva na definição da separação entre o secular e o religioso.

Muitas das iniciativas de De Blasio começaram como promessas de campanha, feitas quando ele cortejou evangélicos, muçulmanos, judeus ortodoxos e outros grupos religiosos. Esses grupos com frequência se sentiam frustrados com a administração de Michael R. Bloomberg, político independente que fazia questão de promover uma rígida separação entre igreja e Estado.

"A comunidade política progressista, da qual De Blasio se considera parte, tende a ter uma visão de mundo mais secular, e você não nos descreveria como uma comunidade progressista", disse o rabino David Zwiebel, da Agudath Israel da América, organização que abrange entidades judaicas ultraortodoxas. "Mas, quando se vai ao nível da governança real, aos esforços para tentar respeitar as sensibilidades e as tradições religiosas da comunidade, minha opinião é que temos um amigo na prefeitura."

De Blasio, que é democrata, disse que a aproximação com as comunidades religiosas é inseparável de seu trabalho para criar uma Nova York mais inclusiva e igualitária. "Para compreender a comunidade e a cidade, é preciso entender que as pessoas são profundamente religiosas e entender o papel da fé na vida delas."

O prefeito criou um forte vínculo com o cardeal Timothy M. Dolan, líder da arquidiocese católica de Nova York. Autoridades católicas comentam o "tom diferente" da administração De Blasio, em comparação ao seu predecessor.

De Blasio disse que procura maneiras pragmáticas de trabalhar com grupos religiosos, para assegurar que seus programas sociais cheguem ao maior número possível de nova-iorquinos.

Por exemplo, quando a prefeitura, no ano passado, iniciou a ampliação do jardim de infância público gratuito para cobrir o período integral, a equipe do prefeito procurou escolas religiosas para comandar alguns dos programas, mesmo sabendo que estes seriam financiados com dinheiro do contribuinte e teriam que ser abertos também a alunos não religiosos.

Alguns grupos judaicos ortodoxos concordaram, mas fizeram algumas reivindicações, incluindo a opção de incluir o recreio ao meio-dia para que alunos religiosos pudessem orar. Descrita pelo prefeito como uma "solução engenhosa", essa iniciativa é uma das que resultaram em questionamentos constitucionais.

"Os esforços da prefeitura em agradar religiosos se converteu na promoção da religião, e isso infringe a separação prevista na Constituição", disse Donna Lieberman, da União de Nova York pelas Liberdades Civis.

David Bloomfield, ex-advogado do Conselho de Educação da Cidade de Nova York, disse que a iniciativa do prefeito de acrescentar dois feriados muçulmanos ao calendário letivo equivale ao endosso anticonstitucional de uma religião, em detrimento de outra, visando ganhos políticos. "Bill de Blasio vê as comunidades religiosas como qualquer outra base eleitoral", comentou. "O problema é que a Constituição não as enxerga sob essa ótica."


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